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sábado, 31 de agosto de 2019

AMIGOS, AMIGOS, REELEIÇÃO À PARTE



Países não têm amigos, têm interesses. Mutatis mutandis, o mesmo vale para Bolsonaro — menos em relação a filhos, parentes e afins, naturalmente —, como se pode inferir da troca de farpas entre o capitão e seu ministro da Justiça, que, juntamente com o Posto Ipiranga que comanda a pasta da Economia, representa o alicerce do atual governo.

Quer outro exemplo? Então vamos lá. Durante a campanha, Bolsonaro e João Doria pareciam cantar no mesmo coral. Passados 11 meses das eleições, a impressão que se tem é de que ambos estão em plena disputa presidencial.

Pelo Facebook, o presidente acusou o governador de São Paulo de “mamar nas tetas” dos governos petistas ao comprar um jatinho financiado a juros subsidiados pelo BNDES. Dória, que já havia criticado o Bolsonaro dias atrás, por conta de suas posições em relação às queimadas na floresta Amazônica, deu o troco no mesmo dia: “Quero Lula e Dilma distantes, se possível do Brasil, até. Que fiquem onde estão, Lula na prisão e Dilma no ostracismo.”

Alexandre Frota, que recentemente trocou o PSL pelo PSDB, tomou as dores do padrinho: “É mais honesto e coerente empresários buscarem financiamento no BNDES do que [Bolsonaro] buscar dinheiro no Queiroz Investimento”, disse, referindo-se a Fabrício Queiroz, ex-assessor de zero um e amigo do presidente desde os tempos de antanho. O deputado também acusou o presidente de brigar sozinho, “como já brigou com o Rodrigo Maia, com o Davi Alcolumbre e comigo”. “Se tem alguém que está errado é quem trabalha para mudar a direção da Polícia Federal e da Receita Federal, quem mudou o Coaf, para segurar as investigações sobre o Flávio Bolsonaro.” E cá entre nós, não dá para discordar, talkey?

Nas últimas semanas, muito se falou que Bolsonaro estaria fritando seu ministro da Justiça — houve até quem atribuísse a essa fritura a fumaça que escureceu os céus de Sampa na segunda-feira 19. Para os palpiteiros de plantão, o presidente quer a demissão de Moro, mas este não quer sair. Ainda.

Observação: O problema tem a ver com a popularidade do ex-juiz da Lava-Jato; político nenhum que se preze deixa brotar no terreno do vizinho uma arvorezinha com potencial de fazer sombra no seu próprio quintal.

Doria acompanha atento o desenrolar dos acontecimentos. Segundo aliados, a vice-presidência numa chapa encabeçada pelo governador em 2022 pode ser a isca para fisgar Moro à sua equipe, quebrar um alicerce do bolsonarismo e formar o que os mais empolgados chamam de "dupla matadora". Ainda não houve convite formal ao ministro, mas diversos recados vêm sendo dados por interlocutores comuns dos dois. Na última terça-feira, ao ser questionado se gostaria de Moro em sua equipe, o governador respondeu com outra pergunta: "Quem não gostaria?". E completou: "Foi um grande juiz, é um grande ministro. Não há convite, há admiração".

Os ânimos entre o presidente e o ministro serenaram, mas o armistício pode ter data de validade. Moro manteve Maurício Valeixo como diretor-geral da PF; Bolsonaro defenestrou Ricardo Saadi da superintendência do órgão no Rio — onde zero um está em apuros —, e vem articulando a nomeação de um delegado, digamos, mais maleável. Se sua vontade prevalecer — e ele já deixou claro que está aí para interferir, ou seria um presidente-banana —, Valeixo não terá como continuar comandando a PF.

Sabe Deus até quando Sérgio Moro fabricará saídas honrosas em meio a essa torrente de desonras. Se Bolsonaro sancionar sem vetos a lei de abuso de autoridade, ignorando as recomendações do ministro, este terá de avaliar com quantos batráquios se faz a indigestão de um "patrimônio nacional", como o chefe se referiu a ele na última quinta-feira.

sexta-feira, 12 de abril de 2019

OS 100 DIAS DE BOLSONARO, BURACOS NEGROS E OUTROS ASSUNTOS


As duas imagens acima são de buracos negros. Escolha a que você acha que combina melhor com a definição desse fenômeno.

OBSERVAÇÃO: Devido à ausência do ministro Marcelo Ribeiro Dantas na sessão de ontem no STJ, o julgamento do REsp de Lula pela 5ª Turma ficou para depois da Páscoa (provavelmente para o dia 23). Veja mais detalhes sobre essa interminável novela na postagem anterior.

O atual governo completou 100 dias anteontem. O presidente comemorou e até pediu desculpas pelas “caneladas”. Disse que não nasceu para ser presidente, e sim militar (?!), mas não descartou a possibilidade de disputar a reeleição. É a prova provada de que o poder vicia, corrompe e é como um camaleão às avessas: todos tomam a sua cor: Num instante em que ostenta a pior avaliação já atribuída a um presidente em início de mandato desde a redemocratização, Bolsonaro já não defende o fim da reeleição, alegando que não cabe a ele, mas ao Congresso promover uma reforma que a elimine do ordenamento jurídico.

Em condições normais, seria apenas constrangedor assistir a um governante que acabou de se eleger com a promessa de ser o coveiro de velhos hábitos políticos comprometendo seu governo com uma disputa pelo Poder que, além de prematura, pode ser paralisante. Quando isso ocorre no aniversário de 100 dias de uma Presidência decepcionante, porém, o constrangimento descamba para a aberração. Como bem salientou Josias de Souza, político que não ambiciona o Poder vira alvo, mas político que só ambiciona o Poder erra o alvo. A única ambição que Bolsonaro deveria ter no momento é a ambição de trabalhar.

O ex-governador de São Paulo e eterno picolé de chuchu, Geraldo Alckmin, disse que o governo de Bolsonaro é improvisado, heterogêneo, com uma pauta equivocada, uma agenda antiquíssima. “Nós estamos discutindo se o nazismo é de esquerda ou de direita, se o golpe foi golpe ou não foi golpe. Uma agenda velhíssima. Não temos nova e velha política, temos boa política e má política. A boa política não envelhece”, afirmou o tucano, do alto da autoridade que lhe conferem os míseros cinco milhões de votos (4,79% do total) que obteve ao disputar a presidência no ano passado (1,3 milhão de votos a menos do que recebeu João Dória, que disputou — e ganhou — o governo de São Paulo). Alckmin também reiterou que o PSDB não fará parte da base do governo, e que o partido irá “votar os projetos que forem importantes ao país”. Segundo O Antagonista, sua vanguarda é o programa de Ronnie Von.

Pausa para o contraponto: O Ibope classificou os 100 primeiros dias do governo Bolsonaro como os piores primeiros 100 dias de todos os governos desde a redemocratização. Mas esse mesmo Ibope também sentenciou que, se chegasse ao segundo turno, o deputado-capitão seria fragorosamente derrotado, independentemente de quem fosse seu oponente. Demais disso, se todos os presidentes eleitos pelo voto popular desde 1989 se saíram melhor que o atual, é preciso não perder de vista que Collor e Dilma foram penabundados do cargo e que Lula está preso (e FHC está senil e, cá entre nós, não tem moral para criticar Bolsonaro, mas isso é outra conversa).

Mudando de pato para ganso: De sua cela VIP em Curitiba, Lula mandou avisara à tigrada que “Gleisi Hoffmann é sua candidata à reeleição para a presidência nacional do partido” (a informação é praticamente oficial, já que vem da colunista social da Folha de S. Paulo). Aproveitando o embalo, presidiário ordenou também “que a oposição interna a ela baixe a bola” (Lula não admite discordâncias; o partido, afinal, é dele). 

Pensando bem, ninguém melhor que a “amante” para chefiar a ORCRIM: a loirinha apoia incondicionalmente a ditadura genocida de Maduro, lambe as botas dos mandatários cubanos e silencia diante da misoginia, da homofobia, da perseguição às minorias étnicas e religiosas (inclusive aos cristãos) perpetradas por seus aliados islamofascistas do Irã, do Hamas, etc. E ainda diz que "Jesus Cristo sempre foi a referência dos petistas", e que se for preciso abandonar Lula para fazer alianças, o PT não fará alianças. 

A questão é que ninguém mais — nem na esquerda — quer fazer aliança com o PT.

quinta-feira, 11 de abril de 2019

LULA, AS MENINAS DO JÔ E A AVALIAÇÃO LAPIDAR DE CID GOMES, QUE CONTINUA VALENDO ATÉ PROVA EM CONTRÁRIO



Dias atrás, uma repórter da GloboNews e ex-integrante das “Meninas do Jô” me fez lembrar do próprio , que costumava responder ele mesmo as perguntas que dirigia aos entrevistados. A questão levantada por essa ex-menina (não só porque o “Programa do Jô” deixou de ir ao ar em dezembro de 2016, mas também porque a dita-cuja já colheu 61 primaveras nos jardins da existência) foi sobre como seria o cenário eleitoral em 2022. E sua resposta (dela, não do entrevistado) foi que Bolsonaro é candidatíssimo à reeleição, que João Dória e Luciano Huck provavelmente concorrerão, e que, pela esquerda, tudo depende do “presidente Lula”. Confesso que me senti tentado a ligar para 4002-2884 e deixar o mesmo recado (lapidar, diga-se) que o senador Cid Gomes deu a uma súcia de petistas, em outubro do ano passado: Lula está preso, babaca. (relembre no vídeo a seguir).


Especular sobre a sucessão presidencial quando a gestão atual começou há pouco mais de 3 meses (se começou mal ou não, isso é outra conversa) me parece um exercício de futurologia sem o menor sentido. Demais disso, Bolsonaro afirmou mais de uma vez ser contrário à reeleição — e que pretende propor sua extinção numa possível reforma política. Semana passada, em entrevista ao jornalista Augusto Nunes no programa “Pingos nos Is” da Jovem Pan, ele voltou a dizer que a reeleição é ruim para o Brasil porque “o prefeito, o governador, até o próprio presidente se endivida, faz barbaridades, dá cambalhotas, faz acordo com quem não interessa, para conseguir apoio político...". Na mesma oportunidade, porém, ele disse: “a pressão está muito forte para que, se eu tiver bem [em 2022], obviamente, me candidatar".

A contradição não chega a surpreender, não quando vem de alguém a quem falta coerência e sobram ideias abiloladas, mas isso também é outra conversa. O detalhe é que Bolsonaro disse isso logo após o Datafolha e o Ibope indicarem que ele é o presidente em primeiro mandato menos bem avaliado desde 1985. Pressão de quem, então, cara pálida?

Tenho comigo que Geraldo Alckmin prestou um desserviço ao país ao insistir em disputar a Presidência quando João Dória tinha chances reais de passar para o segundo turno — e, por que não dizer, de vencer a eleição. Doria não terá esse egun mal despachado a assombrá-lo em 2022, o que é um ponto a seu favor. Quanto a Luciano Huck, acho que o apresentador perdeu o bonde e a vez. É certo que teríamos votado no próprio capeta para impedir a vitória do boneco de ventríloquo comandado pelo presidiário de Curitiba (o que explica a vitória do capitão), mas isso se deu num cenário bastante peculiar, que dificilmente se repetirá em 2022.

O ex-presidente Lula (e não “presidente Lula”, como disse a infante sexagenária) foi condenado a 12 anos e 1 mês de prisão em segunda instância (no processo do tríplex no Guarujá) e começou a cumprir a pena no dia 7 de abril de 2018 (há um ano, portanto). Nesse entretempo, foi  sentenciado a mais 12 anos 11 meses de prisão pela juíza substituta Gabriela Hardt (no caso do sítio em Atibaia). Além disso, os autos do processo sobre o terreno do Instituto Lula e a cobertura em São Bernardo do Campo estão conclusos para sentença — o julgamento pode se dar a qualquer momento, a critério do juiz federal Antonio Bonat, que substitui Sérgio Moro no comando da 13ª Vara Federal do Paraná. Aliás, Bonat já negou um pedido de suspeição da defesa do ex-presidente contra o delegado federal Filipe Hille Pace, que investiga Lula no âmbito da Lava-Jato do Paraná. Para além desses processos, o petralha é réu em outros seis, sem mencionar que foi indiciado no início do mês passado, juntamente com o pimpolho Luiz Cláudio, pelos crimes de lavagem de dinheiro e tráfico de influência (clique aqui para mais informações sobre a capivara do eterno presidente de honra do PT),

Se ninguém botar jabuti em árvore, o REsp de Lula — que dentre outros absurdos pleiteia a anulação do processo do tríplex e o envio do caso à Justiça Eleitoral — será rejeitado pela 5ª Turma do STJ, como já o foi por uma decisão monocrática do ministro Félix Fisher, no final do ano passado. E agora que o presidente do Supremo despautou e adiou sine die o julgamento das ADCs que questionam a constitucionalidade da prisão após condenação por um juízo colegiado, não há por que o STJ continuar empurrando o julgamento barriga. Se o que faltava a Fisher para levar o caso em mesa era a manifestação do MPF sobre o pedido de remessa do processo à Justiça Eleitoral, agora não falta mais: o parecer (contrário ao pedido) foi encaminhado na última terça-feira

Voltando à resposta que a repórter da GloboNews deu a si mesma, segue um texto de Josias de Souza (os grifos são meus):

Lula tornou-se para o PT um personagem paradoxal. Preso há um ano, ele continua sendo a única liderança nacional do partido. Mas seu pesadelo criminal transformou-o num líder sem futuro. Hoje, Lula está inelegível até 2038, quando completará 92 anos. Ou seja, do ponto de vista estritamente eleitoral, é um passado que não passa para o partido que fundou. Para que Lula voltasse a ser candidato, como gostaria, seria necessário que a sentença que o condenou a 12 anos e um mês de cadeia fosse anulada nos tribunais superiores. Mas nem os mais fanáticos adeptos do bordão 'Lula Livre' acreditam nessa possibilidade

O petismo agarra-se a uma tênue esperança dos advogados de que a sentença seja pelo menos reduzida no julgamento de recurso no STJ — uma eventual redução da pena permitiria à defesa reivindicar uma progressão de regime prisional. Com sorte, Lula ganharia uma transferência do regime fechado para o semiaberto. Com muita sorte, iria para a prisão domiciliar. Seria um alívio para o preso, não para o PT. No momento, o grande desafio do petismo é o de se reinventar na oposição. 

Por ora, o partido repete o modelo de oposição agressiva que adotava no passado. Com uma diferença: o PT já não se encaixa no papel de virgem no bordel. Os adversários agora sabem o que os petistas fizeram nos verões passados, quando manusearam a chave do cofre. De resto, ser do contra sem dizer o que colocaria no lugar de projetos como a reforma da Previdência não estimula o eleitor a recolocar o PT na fila de alternativas caso Bolsonaro mantenha o país no caminho do brejo. 

O bordão 'Lula Livre' logo será um assunto chato até para o PT, se é que já não é. Ainda que se materializasse, o sonho de liberdade seria seguido de novos pesadelos. Há mais uma condenação de primeira instância. Há também meia dúzia de processos por julgar. Adepto da teoria da palmeira única, Lula jamais permitiu que brotassem outras lideranças no gramado do PT. Seu egocentrismo condenou o partido a administrar a decomposição do seu único líder rendido aos interesses dele.”


ATUALIZAÇÃO: Como eu disse linhas atrás, existe a possibilidade de a 5ª Turma do STJ julgar o recurso de Lula nesta quinta-feira (ou no próximo dia 23, já que Judiciário, trabalho e Semana Santa não se misturam). Em tese, o relator, ministro Felix Fisher, ainda não levou o assunto em mesa porque aguardava a manifestação do MPF — que foi encaminhada na última terça e é contrária ao pedido da defesa de levar o caso do tríplex do Guarujá para a Justiça Eleitoral. O colegiado, conhecido por manter as decisões das instâncias inferiores nos processos da Lava-Jato, é formado por cinco ministros, um dos quais (Joel Ilan Paciornik) se deu por impedido de participar desse julgamento. Fisher já havia negado o apelo monocraticamente, mas a defesa do petralha argumenta é que o recurso expõe dezoito teses jurídicas compatíveis com a jurisprudência do STJ que deveriam ser enfrentadas por todos os ministros da turma. Possíveis resultados são:

1) O apelo ser negado e a condenação ser mantida (caso em que Lula seguirá cumprindo a pena em regime fechado);

2) O reconhecimento de que as decisões inferiores desrespeitaram alguma lei federal — como o Código Penal ou o Código de Processo Penal —, o que levaria à declaração de nulidade do processo, que voltaria à instância em que a falha foi detectada (a defesa alega que a ação não poderia ter sido julgada pelo juiz Sergio Moro; que o magistrado foi parcial; que foi negada a produção de provas periciais, e por aí afora);

3) O reconhecimento da competência da Justiça Eleitoral para analisar ação, o que também levaria à anulação de todos os atos processuais na esfera da Justiça Federal — inclusive da ordem de prisão;

4) A redução da pena (que a defesa considera exagerada) ou a absolvição do réu quanto ao crime de lavagem de dinheiro — em qualquer dos casos, a redução da pena abriria espaço para que o condenado a cumprisse em regime semiaberto ou em prisão domiciliar;

Façam suas apostas (e cruzem os dedos).

sexta-feira, 26 de outubro de 2018

ELEIÇÕES 2018 — FALTANDO DOIS DIAS PARA O SEGUNDO TURNO



Termina nesta sexta-feria a abjeta propaganda eleitoral obrigatória e depois de amanhã, a aborrecente novela eleitoral edição 2018 — a mais polarizada desde a redemocratização e com o nível da campanha em patamares abissais. 

Na disputa pelo Palácio dos Bandeirantes, as pesquisas apontam empate técnico entre João Doria e Márcio França, enquanto ambos disputam a tapa a preferência dos indecisos — o primeiro, com um retumbante discurso antipetista e o segundo, tentando assobiar e chupar cana, acenando para a esquerda e, ao mesmo tempo, afagando os que não querem ver o PT nem pintado.

No pleito presidencial, o Capitão Caverna — que lidera as pesquisas com 57% dos votos válidos — “joga parado” e tenta manter na coleira seus ferozes pitbulls, embora nem sempre consiga controlar a própria língua.

Atualização: Segundo pesquisa Datafolha divulgada no início da noite de ontem, Bolsonaro tem 56% das intenções de voto e Haddad, 44%. Não se sabe se essa mudança de humor do eleitorado é uma tendência ou se tem a ver com as últimas acusações contra o capitão — os entrevistados podem ter sido influenciados pelas fake news que não se confirmaram, como a acusação de que o vice do capitão seria um torturador, além do caso WhatsApp e o vídeo de Eduardo Bolsonaro falando no “fechamento do STF”. Os números do Datafolha sugerem que a diferença, que no levantamento anterior era de 18 pontos percentuais, caiu para 12, mas na prática ela era de 9 e caiu para 6, pois cada ponto que um candidato ganha, o outro perde em disputas polarizadas. Isso significa cerca de 5 milhões de votos por dia para serem revertidos, e esse feito não foi conseguido nos últimos dias.

Na última quarta-feira, os advogados do capitão pediram o arquivamento da ação aberta pelo TSE para apurar as acusações de que empresas compraram pacotes de disparos em larga escala de mensagens contra o PT e a campanha de Haddad

A alegação é que a denúncia publicada pela Folha é vazia, sem fundamento nem evidências de conduta ilegal, e que a coligação rival, por estar muito atrás nas pesquisas, tenta criar um “fato político inverídico e a partir daí produzir celeuma midiática” (segundo o Ibope/Estado/Globo, 73% dos entrevistados disseram não ter recebido críticas ou ataques a candidatos via WhatsApp na semana que antecedeu o primeiro turno).

Do outro canto do ringue, o fantoche do presidiário insiste num debate ao vivo e em cores, sem o qual, ressalta ele, esta será a primeira vez que uma eleição presidencial chega ao final sem que pelo menos um debate entre os postulantes ao Planalto seja realizado e transmitido ao vivo pela TV. 

Bolsonaro compareceu a dois debates antes do primeiro turno, mas foi alvo de um atentado e ficou hospitalizado por semanas a fio. Agora, a despeito de os médicos terem deixado a decisão a seu critério, ele se recusa estrategicamente a participar, dizendo, inclusive, que “quem conversa com poste é bêbado”. 

Salvo melhor juízo, debates são importantes quando envolvem ideias e projetos. No entanto, a julgar pelo que se viu nos embates entre os postulantes ao governo de estado, a coisa provavelmente se resumiria a uma abjeta troca de acusações e ofensas de parte a parte que não ajuda em nada o eleitor indeciso a definir seu voto. Haddad pleiteou no TSE que o debate marcado para esta sexta-feira, na Globo, fosse convertido em entrevista, mas o pedido foi negado pelo ministro Sérgio Banhos.

Fernão Lara Mesquita, em recente artigo publicado no Estadão e reproduzido no blog Vespeiro, faz uma análise lúcida da situação atual. Confira o excerto a seguir:

Sobre a semana de “Desespero” que passou, nada mais a dizer. Sobre “ameaças à democracia” no país que caminha para os finalmentes de uma lição exemplar sobre a real proporção da viagem na maionese de quem quer que acredite que pode tornar-se dono dele e ditar-lhe regras, não há mais qualquer preocupação. Arrancamo-nos do século 20 e, dele, ninguém nos pega mais. Podemos voltar a dar-nos o luxo de pensar o futuro. Mas a verdade nos libertará?

Sem dúvida, somente a verdade nos poderá libertar. Mas se será desta vez ou não que a “conheceremos”, essa é a dúvida que, resolvida a eleição, ainda remanesce. Há uma promessa de olhar para o quadrante onde os problemas de fato estão na economia e em outras vertentes não totalmente desprovidas de importância no espaço aberto entre a história real e a narrativa do drama brasileiro. Não é pouco, considerado o ineditismo e a distância que tomamos da realidade, mas é só o que há.

Atacar questões como as da Previdência e do resto do sistema de privilégios e colonização do Estado [...] é um imperativo de sobrevivência. Os 0,5% da população empregados pelo Estado, que os outros 99,5% sustentam, consomem integralmente os 40% do PIB que o Estado toma à Nação e mais o que contrata de dívida por ano nas costas dela sem nenhuma contrapartida de merecimento. [...] Os 63 mil assassinados por ano são a forma final que essa fatura assume depois de vir espalhando miséria no corpo e na alma do Brasil pelo caminho afora. Isso vai ter de parar. Vai ter de voltar para trás. Não há mais escolha.

Mas tudo isso ainda são efeitos. A causa de tudo ainda é a política. Tudo o mais que nos atropela é decorrência direta da inexistência de um sistema real de representação do País real no País oficial e da inexpugnável blindagem dos mecanismos de decisão contra qualquer interferência da massa dos excluídos, da plebe, da ralé também dita “eleitorado”. Os países são feitos para quem tem a última palavra no seu processo de tomada de decisões. E muito pouca coisa para além dessa verdade é verdade no blablablá com que nos engambelam desde Tiradentes. Existe democracia se e quando há uma ligação aferível dos representados de cada representante eleito e estes dispõem de instrumentos efetivos para impor a sua lei àqueles. É simples assim. Tem o poder quem tem o poder de demitir. É isso que decide se o país será construído pelos representantes eleitos para eles próprios e para “os seus” ou para o povo, para os eleitores.

Hoje a dúvida sobre para quem é feito o Brasil é zero. É dado à plebe, à ralé, ao eleitorado ir às urnas a cada quatro anos, como irá mais uma vez domingo, mas daí por diante e até a próxima eleição, em mais quatro anos, ele estará totalmente excluído da discussão do seu próprio destino. [...] E, no entanto, passa batida, como a expressão da mais pura verdade estabelecida, a afirmação, diariamente repetida pela situação e pela oposição e amplificada pelos “contra” e pelos “a favor”, de que tocar em qualquer desses privilégios seria “altamente impopular”. É um resumo eloquente da extensão da imunodeficiência nacional à mentira.

A mera exposição honesta e didática das parcelas que compõem a miséria do Brasil conduzirá à libertação do nó cego de mentiras que mantêm atadas as contas públicas. [...] Mas até aí estaremos falando apenas de manter viva a galinha dos ovos de ouro. E de assegurar a disputa pelo “direito” de ser o primeiro a colhê-los. O lugar de honra do panteão dos heróis da História continuará vago até que chegue quem seja honesto o bastante para fazer a reforma política que tornará impossível que, “como regra, a mentira esteja acima de tudo no nosso meio político”, seja quem for o eleito da vez para fazer o seu turno “lá”. [...] Voto distrital puro para garantir a fidelidade da representação do País real no País oficial e para tornar operacional mudar com segurança no ritmo da necessidade, direito de retomada de mandatos e referendo das leis dos Legislativos a qualquer momento para lembrar sempre quem é que manda, eleições de retenção de juízes para prevenir marchas à ré. Eis a verdade que nos libertaria.

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quinta-feira, 25 de outubro de 2018

FALTANDO 3 DIAS PARA O SEGUNDO TURNO



Na mais recente pesquisa do Ibope, Bolsonaro aparece com 57% das intenções de votos válidos, o que representa uma vantagem de 14% em relação a Haddad

A redução em comparação com os números da pesquisa anterior, que está dentro da tal “margem de erro”, pode ter a ver com declarações, vídeos e “revelações polêmicas” que inundaram a mídia e as redes sociais nos últimos dias, mas também pode ser uma “acomodação de camadas”, e não o terremoto que alguns vêm alardeando. Prova disso é que os mercados financeiros têm demonstrado confiança na vitória de Bolsonaro e na expectativa de continuidade da agenda de reformas — o que levou o IBOVESPA a se firmar acima dos 85 mil pontos, além de reduzir significativamente a desvalorização do real em relação do dólar.

Na avaliação de Merval Pereira, a vantagem Bolsonaro a três dias da eleição mostra como os votos cristalizados dos dois candidatos praticamente inviabilizam uma reviravolta na reta final, a não ser que algo inacreditável aconteça. Em vez de uma bala de prata, o PT gastou várias, mas nenhuma acertou o alvo. Mesmo assim, o número de pessoas que não votariam no capitão aumentou, superando o dos que votarão com certeza. Paralelamente, a rejeição a Haddad diminuiu, ainda que a diferença esteja dentro da tal margem de erro.

O suposto escândalo das mensagens inverídicas de WhatsApp, baseado numa denúncia jornalística inepta, acabou sendo soterrado pelo próprio Haddad, que se precipitou em avalizar a denúncia de que o general Mourão, vice de Bolsonaro, teria torturado o cantor e compositor Geraldo Azevedo em 1969 — até porque, na época, Mourão tinha apenas 16 anos (aliás, o próprio Azevedo voltou atrás em sua declaração). Mas o problema causado pela denúncia da Folha não justifica os arroubos retóricos do capitão em mensagem enviada aos manifestantes na Avenida Paulista, pois revelam uma preocupante visão autoritária da relação entre a imprensa e o mandatário de um país. Aliás, o mesmo destempero acomete o presidente Trump, dos Estados Unidos, e o ex-presidente Lula, que também se valeram de sua popularidade para incitar militantes e apoiadores contra os órgãos de imprensa que os vigiam.

Os esquerdistas assumiram postura autoritária ao exigir, em discursos inflamados, não apenas a anulação da eleição, mas também a censura ao WhatsApp até o final do segundo turno. É inacreditável que o PT pleiteie medidas drásticas com  base apenas numa denúncia de jornal, sem que as autoridades abram investigações. Quando mais não seja, porque os petistas sempre desacreditaram denúncias de jornal contra os seus — principalmente contra Lula — e criticaram o que qualificaram de rito sumário das decisões da Justiça na Operação Lava-Jato. Anular uma eleição é decisão gravíssima, e que, como destacou a ministra Rosa Weber, atual presidente do TSE, não pode ser tomada fora do tempo da Justiça “que não é o tempo da política”.

Resumo da ópera; Dificilmente a diferença que separa Bolsonaro de Haddad poderia ser revertida nos poucos dias que nos separam do segundo turno, mas a redução da distância entre ambos, que pode ser confirmada ainda nesta semana pelo Datafolha, é um alerta ao futuro presidente, que, por mais votos que receba, não terá um cheque em branco da sociedade.    

Para concluir esta postagem (que a síndrome do macaco não me permite espichar demais), relembro que esta vem sendo a eleição presidencial mais polarizada da nossa história e a primeira calcada precipuamente meio virtual, ainda que a anacrônica propagando política obrigatória continue a ser veiculada. E continuará a sê-lo até a próxima sexta-feira, permitindo que os candidatos se digladiem no mar de ofensas e acusações, numa deplorável sucessão de baixarias, como as que se viram nos debates entre os postulantes ao governo do estado de São Paulo — no âmbito do governo federal, Bolsonaro preferiu administrar sua vantagem e “jogar parado” a aceitar os recorrentes desafios do preposto do criminoso de Garanhuns (dizendo até que quem conversa com poste é bêbado).

Nessa terra de ninguém, onde é quase impossível separar o joio do trigo, o Projeto Comprova vem em socorro dos eleitores, com uma equipe de jornalistas que checam a veracidade das mensagens que lhe são repassadas pelo WhatsApp 11 97795-0022, a exemplo de site como Aos Fatos, Agência Lupa e Fato ou Fake, que também buscam desmentir as fake news

Seja como for, desconfie sempre de mensagens de cunho político com linguagem sensacionalista ou abundante em adjetivos, com textos em maiúsculas e/ou que apresentem erros gramaticais excessivos, pontos de exclamação em demasia e outros indicativos de maracutaia — sobretudo quando elas vêm acompanhadas do indefectível pedido de compartilhamento.

Observação: É bom lembrar que fotos não bastam para garantir a veracidade das mensagens, pois muitos disseminadores de boatos se valem de imagens antigas, editadas, ou associam fotos e vídeos verdadeiros a informações falsas. Nesse caso, vale recorrer à ferramenta de busca reversa de imagem do Google para verificar o contexto em que a foto foi publicada. No Google Imagens, por exemplo, basta carregar um arquivo de imagem ou pesquisar pelo link da foto.

Ainda em dúvida? Anote aí alguns telefones úteis:

Estadão Verifica: (11) 99263-7900
Aos Fatos: (21) 99956-5882
Folha Informações: (11) 99490-1649
Boatos.org: (61) 99177-9164
Fato ou Fake: (21) 97305-9827

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quinta-feira, 4 de outubro de 2018

A ELEIÇÃO ESQUECIDA



Você sabia que há uma eleição para governador do Estado de São Paulo sendo disputada neste momento? Pode acreditar que sim, e fique sabendo, mais ainda, que esta eleição já está aí, a menos de uma semana. Quem diria, não? Provavelmente você nunca ouviu falar tanto de política e eleição como hoje — mas quase nada tem a ver com o estado em que você mora, trabalha, e que, no fim das contas, mais importa para a sua vida prática.

Os paulistas estão esmagados, literalmente, pelo noticiário político nacional, e parece não ter sobrado tempo para mais nada. Quem vai ser o próximo presidente do Brasil? Ninguém tem a menor ideia, e, quanto menos se sabe a respeito, mais se discute o assunto. Teria o deputado Jair Bolsonaro, sim ou não, chegado ao seu “teto” de votos? João Amoedo vai passar dos 5%? E o ex-presidente Lula, então: alguém, mesmo sendo advogado, saberia dizer ao certo quantos recursos, apelos, embargos, agravos etc., etc., ele apresentou ao Supremo Tribunal Federal nos últimos meses, na sua tentativa de sair do xadrez onde está preso por corrupção e lavagem de dinheiro, em Curitiba, e conseguir um indulto? Tivemos também processos de tudo quanto é tipo que ocuparam semanas valiosas de debate no Tribunal Superior Eleitoral, no Superior Tribunal de Justiça, na ONU, no Vaticano, na Associação de Caça e Pesca — diga um lugar qualquer, e é certo que estiveram discutindo ali se Lula seria ou não “candidato”. Quando o ex-governador paulista Geraldo Alckmin vai reagir? Ele vai reagir? E “as pesquisas de intenção de voto”, que se embaralham uma com as outras a cada quinze minutos? É melhor nem falar das pesquisas de intenção de voto.

O fato é que a eleição para governador de São Paulo, um evento-chave na política brasileira, foi empurrada para as sombras. É um equívoco político sério. Nada se faz no Brasil, há muito tempo, sem a participação decisiva de São Paulo — a grande força de equilíbrio, ou de contenção, para um poder central que suga cada vez mais os recursos do Brasil, quer mandar cada vez mais no país todo e dividiu a sociedade brasileira em duas classes opostas. Uma, como a nobreza e o clero antes da Revolução Francesa, é formada pelos que vivem direta e indiretamente às custas do Estado. A outra é formada pelos que trabalham para sustentar a primeira — e é no Estado de São Paulo, mais que em qualquer outro lugar do Brasil, que ela existe. É aqui, com sua energia política, sua força econômica e sua densidade social, que o Brasil do trabalho enfrenta o Brasil dos nobres. É aqui que se concentram as chances do progresso contra o atraso. Mas nada disso parece ter a mais remota conexão com a alucinada discussão política do momento nem com seus personagens. A candidata Marina Silva não sabe onde fica o Viaduto do Chá. Jair Bolsonaro não conseguiria distinguir Jundiaí de Presidente Prudente. Ciro Gomes acha que São Paulo fica na Inglaterra. Está na cara que há algo profundamente errado com isso tudo.

A uma semana da eleição, a mídia ainda não percebeu que São Paulo está no jogo, e a opinião pública parece anestesiada com as polêmicas da campanha presidencial, entre Bolsonaro e o PT, que lhe são servidas todos os dias nos meios de comunicação. Pouco se discutem os candidatos e menos ainda seus projetos. Quem seria capaz de diferenciar um governo João Doria de um governo Paulo Skaf, os dois candidatos que estão à frente? Doria foi prefeito de São Paulo, levado numa onda de entusiasmo, mas não se interessou em cumprir o mandato para o qual tinha sido eleito. Skaf simplesmente não se sabe quem é — vive há anos nesse mundo escuro do empresariado biônico, essa gente das Fiesps, e Ciesps e Sesis e Senais, nebulosas onde entram e de onde saem bilhões de reais em dinheiro público que mantêm vivo o exótico sindicalismo empresarial brasileiro, contraponto ao sindicalismo das CUTs e similares. Os demais candidatos são nulidades sem a menor possibilidade de conseguir alguma coisa — é a turma que só existe por causa das verbas do “fundo partidário”. Um deles, o do PT que pretende governar o Brasil, não conseguiu eleger nem o prefeito da própria cidade, São Bernardo, na última eleição municipal.

Trata-se de um perfeito despropósito para um estado que tem um PIB anual de 2 trilhões de reais — isso mesmo, 2 trilhões de reais —, que coloca São Paulo ali pelos vinte maiores países, acima da Suécia. São Paulo, na América do Sul, não é apenas maior que a Argentina. É maior que a Argentina, o Uruguai, o Paraguai e a Bolívia somados. Com 45 milhões de habitantes, é o lar de um em cada cinco brasileiros — e o terceiro maior país da América do Sul, logo após o Brasil e a Colômbia. São Paulo está entre as dez maiores áreas metropolitanas do mundo; é, de longe, a mais cosmopolita de todas as cidades brasileiras. É daqui que saem 35% de tudo o que o Brasil produz. São Paulo tem o primeiro IDH do país — na tabela oficial fica atrás de Brasília, mas Brasília não existe no mundo das realidades econômicas. O índice de homicídios de São Paulo, de 3,8 por 100 000 habitantes, é equivalente hoje ao do Estado do Kansas, nos Estados Unidos — um progresso absolutamente extraordinário. Trata-se de um quarto da taxa média do Brasil, o que faz de São Paulo, de longe, o lugar mais seguro do país. É aqui que estão a melhor polícia, as melhores autoestradas, as melhores ferrovias, os melhores hospitais e as melhores escolas do Brasil — além da sede da maioria das 500 mais possantes multinacionais do mundo.

Mais importante que tudo, talvez, São Paulo é o mais brasileiro de todos os estados do Brasil — um resumo, melhor do que qualquer outro, de tudo aquilo que este país tem para apresentar. É sintomático. São Paulo é o estado mais odiado pelos políticos das outras unidades da federação, sobretudo as que são mais atrasadas e desiguais do ponto de vista social. É visto como uma “ameaça” — e talvez seja mesmo, porque aqui está a amostra do que poderia ser um Brasil mais moderno, mais progressista e mais justo. Ao mesmo tempo, é o estado mais amado pelos cidadãos comuns, principalmente pelos milhões que ao longo das décadas têm vindo para cá em busca de trabalho, de realização e de projetos de melhoria em sua vida. É o lugar procurado pelos que não se conformam com o Brasil dos coronéis, do atraso e da adoração ao governo — pelos que não querem passar uma vida de dependência da “autoridade” e de sujeição aos que mandam. São Paulo é o estado dos brasileiros que acreditam no mérito individual, na recompensa pelo esforço, trabalho e talento, e na autodeterminação das pessoas. É o contrário do Bolsa Família. É o contrário de Brasília.

É uma pena que nada disso esteja em discussão nestas eleições.

Artigo de J.R. Guzzo publicado na edição impressa de Veja desta semana.

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quarta-feira, 6 de junho de 2018

ELEIÇÕES 2018 ― TEMPOS ESTRANHOS



Vivemos tempos estranhos, disse o ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal. E com efeito: a julgar pelas pesquisas ― nem sempre muito confiáveis, mas impossíveis de ser ignoradas ―, nosso esclarecidíssmo eleitorado está dividido entre um criminoso condenado, populista de carteirinha, e um militar aposentado, estadista de quatro costados.

A polarização da política ― fomentada em grande medida pelo “nós contra eles” do ex-presidente petista ― leva os “petralhas” a escolher um candidato que dificilmente disputará a presidência (e que deve apodrecer na prisão, em havendo justiça nesta terra), e os extremistas de direita a escolher alguém que emula a volta dos militares ao poder.

Pré-candidatos como Henrique Meirelles e João Doria são solenemente ignorados pela esmagadora maioria dos brasileiros incapazes de enxergar que a virtude não está nos extremos, e isso assusta, notadamente quando apenas quatro meses nos separam da eleição presidencial. A propósito, sugiro a leitura do artigo “Coxinhas e petralhas: o fandom político como chave de análise da audiência criativa nas mídias sociais”, publicado na revista Geminis, da Universidade Federal de São Carlos. 

Sobre Lula, não há muito a dizer além do que eu já disse em minhas minhas humildes postagens. Mas Bolsonaro só foi citado meia dúzia de vezes, se tanto, e mesmo assim de passagem. Portanto, resolvi preencher essa lacuna. Acompanhe.

O ex-capitão do exército que hoje vive dias de celebridade aparece com respeitáveis 20% nas pesquisas de intenção de voto ― a título de comparação, Geraldo Alckmin, o eterno picolé de chuchu, não chega a 1/3 disso ― e vive hoje sua terceira e melhor fase na pré-campanha presidencial. Há um ano, ele era considerado o candidato folclórico da disputa, como tantos outros o foram em todas as eleições desde a redemocratização. De alguns meses para cá, porém, surfando na derrocada do PT, começou a crescer nas sondagens e agora parece ter presença garantida no segundo turno.

Aos poucos, Bolsonaro construiu uma narrativa eloquente contra bandeiras tradicionais da esquerda, sem se importar com a pecha de machista, homofóbico e racista que viria junto. Além disso, explorou o fato de não estar envolvido em escândalos de corrupção, especialmente na Lava-Jato para se vender como um político diferente ― a despeito dos sete mandatos como deputado federal e um como vereador no Rio. Mas não é só. O deputado-capitão também atrai o voto de protesto que outrora era comum em eleições legislativas como a de 2014, quando foi eleito o palhaço Tiririca.

Tamanha é a frustração do brasileiro com a política e a economia que Bolsonaro virou uma espécie de refúgio dos indignados. “Ele atende aos descontentes com o Brasil atual, principalmente os descontentes com a corrupção”, diz David Fleischer, professor de ciências políticas da Universidade de Brasília. “A figura que ele encarna é quase ideal. É um personagem de um drama, comédia ou tragédia política”, afirma Roberto Romano, professor aposentado de Ética e Filosofia da Unicamp.

Com o pé no segundo turno, o debate que se impõe é: se eleito, Bolsonaro terá condições de presidir o país? Além disso, qual Bolsonaro seria presidente? O mais radical, com forte discurso contra a política e o sistema, ou o que agora começar a vestir um figurino um pouco mais flexível para atrair um eleitorado que ainda duvida de sua capacidade para conduzir o Brasil em um dos períodos mais conflagrados da história?

Capitão da reserva do Exército, Jair Messias Bolsonaro sempre balizou sua atuação política em assuntos caros a seu eleitorado original ― os militares. Foi erguendo bandeiras de interesse dos colegas de farda que se elegeu pela primeira vez. Era um rebelde nos quartéis, lutando por melhorias nas condições de trabalho de soldados e cabos (o baixo clero da caserna), e, da Câmara de Vereadores do Rio, levou a bandeira para a Câmara Federal, nos anos 1990 ― que atravessou com uma apagada atuação parlamentar, focada no atendimento de demandas corporativas das Forças Armadas.

A chegada de Lula ao poder, em 2003, daria ao deputado Bolsonaro um inimigo de peso para combater — e aparecer. Foi a partir daí que se deu sua primeira guinada política. Na era petista, ele ampliou o foco de sua atuação, passou a falar não apenas para os militares de baixo coturno e adotou bandeiras conservadoras para rebater as políticas públicas propostas pelo PT. Aos poucos, foi se consolidando como um dos mais virulentos críticos do petismo e ganhou protagonismo.

Ainda no governo Lula, Bolsonaro depois de ser abordado agressivamente Maria do Rosário durante um debate sobre redução da maioridade penal, disse que a deputada petralha gaúcha não merecia ser estuprada. No começo do governo Dilma, comprou a briga contra o chamado kit-gay ― uma espécie de cartilha contra a homofobia que o Ministério da Educação queria distribuir às escolas. Ao deputado Jean Willys, homossexual assumido, disse que teria vergonha de ter um filho como ele.

Cada polêmica era bem explorada pela equipe de Bolsonaro nas redes sociais, o que fez com que seu nome passasse a ser admirado país afora (e também odiado por grupos mais simpáticos às bandeiras de esquerda). Os vídeos foram viralizando — e, paulatinamente, ajudando o deputado a fidelizar o eleitorado antipetista. Com o recrudescimento da crise econômica e o avanço da Lava-Jato, seu número de eleitores saltou dos 120 mil, em 2010, para 464 mil, em 2014, quando foi reeleito para o sétimo mandato na Câmara e se tornou o terceiro deputado mais votado do país (só para constar: Tiririca teve 1,3 milhão de votos em 2010 e cerca de 1 milhão em 2014). Foi então que ele começou a cogitar a ideia de concorrer ao Palácio do Planalto. A hipótese foi aventada ainda em 2014, mas o deputado não encontrou apoio no PP ― partido que o abrigava àquela altura. Fez algumas abordagens ao presidente da sigla, o notório senador Ciro Nogueira, que sempre fugia do assunto. 

Bolsonaro abandonou o PP após a reeleição de Dilma, mas o PSC também não garantiu legenda para seu projeto nacional. Em 2017, vendo que teria mais chances de se candidatar a presidente em uma sigla menor, aproximou-se do nanico PEN ― rebatizado de Patriota a pedido do próprio Bolsonaro ― e, mais adiante, ingressou no PSL.

No Datafolha, Bolsonaro começou a aparecer com 4% das intenções de voto em 2015, subiu para 7% em 2016 e para 15% em 2017. A pecha de sectário, contudo, continuava a ser um problema a resolver, juntamente com a crítica frequente de que era leigo em relação a temas importantes para alguém que pretende comandar o país. Foi então que, no final do ano passado, ele passou a modular seu discurso e terceirizar a elaboração de propostas em algumas áreas cruciais. Para tentar uma aproximação com o mercado, ator relevante em eleições presidenciais, escalou o economista Paulo Guedes, fundador e ex-sócio do BTG Pactual e doutor em economia pela Universidade de Chicago. A ideia de convidá-lo para coordenar o programa econômico de sua campanha teve efeitos positivos. Ali, em meio ao deserto de opções que se desenhavam, o pré-candidato foi ganhando a simpatia de empresários e operadores de mercado e passou a participar de sabatinas organizadas por bancos e associações empresariais.

Durante a recente paralisação dos caminhoneiros, Bolsonaro apoiou as reivindicações da categoria e chegou mesmo a prometer que anistiaria as multas aplicadas aos grevistas. Mas ao longo da semana acabou assumindo uma posição mais crítica e condenou os bloqueios nas estradas. “Houve infiltração no movimento”, disse. E completou: “Caso seja presidente, não quero pegar o país pior do que está”.

Some-se à miopia política (para não dizer “ignorância”) de boa parte do eleitorado a absoluta ausência de candidatos ilibados e qualificados para presidir este arremedo de país e fica fácil compreender porque estamos nesta deplorável situação.

Que Deus nos ajude em outubro, nos próximos quatro anos e nos demais que estão por vir.

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terça-feira, 10 de abril de 2018

DORIA DEIXA A PREFEITURA PARA CONCORRER AO GOVERNO DO ESTADO E BRUNO COVAS ASSUME O CARGO. E QUEM DIABOS É BRUNO COVAS?



Na última sexta-feira, em meio à pantomima midiática da prisão do demiurgo de Garanhuns, Geraldo Alckmin e João Dória deixaram seus cargos para concorrer à presidência da República e ao governo do estado, respectivamente. 

Observação: Alckmin, conhecido como picolé de chuchu por sua notória “insipidez”, deixou o Palácio dos Bandeirantes depois de ocupá-lo por 7 anos e 3 meses consecutivos. Não foi a primeira vez. Também de olho na presidência, ele passou o bastão para o vice, Cláudio Lembo em 2006, mas obteve somente 39,17% dos votos válidos no segundo turno e acabou derrotado por Lula, que se reelegeu com 60,83% dos votos.

Mesmo sendo novato na política, Doria enfrentou bravamente a hostilidade da mídia ― que por vezes chegava a ser cômica. Sua vitória foi durante muito tempo dada como impossível pelas “pesquisas eleitorais”, e todo santo dia sua candidatura “entrava em crise”. Mesmo assim, o tucano obteve mais 3 milhões de votos já no primeiro turno ― fato inédito em São Paulo desde a redemocratização do país ―, e deixou no chinelo o “poste” de Lula, devido em grande parte a imagem de gestor que vendeu à população paulistana durante a campanha ― população essa que desejava desesperadamente alguém como ele, ou, pelo menos, parecido com a propaganda que ele fazia de si próprio.

A gestão começou bem ― com o sucesso do Corujão da Saúde, do Empreenda Fácil e do Agenda Fácil, dentre outros projetos ―, mas decaiu depois de poucos meses, quando o Doria já não escondia sua frustração com a burocracia e a deixava evidente que tinha planos mais ambiciosos ― como concorrer à presidência da República, embora Alckmin, seu padrinho político, fosse a escolha natural do PSDB depois que Aécio Neves, delatado por Joesley Batista, só não acabou na cadeia devido ao foro privilegiado, e só não teve o mandato cassado porque o Conselho de Ética do Senado é uma piada.

Observação: Como bem observou J.R. Guzzo, a mídia brasileira, incluindo a paulistana, tem um instinto infalível para ficar do lado errado da opinião pública, sempre parecendo querer exatamente o que a população claramente não quer. Gosta, por exemplo, da “cracolândia”, dos “moradores de rua”, mendigos e afins, quando o paulistano não gosta de nada disso. Tanto é que, nas eleições de 2016, a população estava exasperada com uma prefeitura e um prefeito que insistiam em governar a cidade na contramão do seu entendimento. A gestão do poste número 2 de Lula (se considerarmos Dilma o poste número 1) foi um filme-catástrofe do começo ao fim, com Haddad e sua equipe de “cientistas sociais”, urbanistas alternativos, arquitetos sem obras e militantes de “movimentos sociais” querendo fazer uma revolução socialista queimando pneus nas ruas e recebendo verbas da prefeitura, o que resultou numa tempestade perfeita em matéria de decisões ruins.

Para encurtar a conversa, o prefeito-gestor exerceu por 15 meses o mandato de 4 anos para o qual foi eleito, mas nunca o quis de verdade ― talvez quisesse ser presidente da República, governador do estado, provedor da Santa Casa ou qualquer coisa, menos prefeito de São Paulo. E não poderia mesmo resolver os problemas da maior e mais importante metrópole do país, com um PIB equivalente ao de Portugal, se desde o começo mirou o Palácio Anchieta como trampolim para voos mais ambiciosos.

O que São Paulo precisa é de um mínimo de coerência de seus gestores. Mas como esperar coerência administrativa de um prefeito assume o cargo já pensando em deixá-lo? Como acreditar que pessoas assim se interessam pela cidade, pelo estado ou pelo país que foram eleitos para governar? Se alguém quer construir uma carreira na política, que ao menos respeite o mandato para o qual foi eleito. Aliás, se a legislação eleitoral tornasse inelegível por pelo menos 10 anos quem deixa o mandato precocemente, talvez esses arrivistas, que planejam pular de cargo em cargo para subir na vida, não se sentissem tão à vontade para trair seus eleitores.

Para o mal dos nossos pecados, ninguém sabe quem é o que pensa o vice de Doria. Sabe-se apenas que ele é neto de Mário Covas ― que foi prefeito, senador e governador de São Paulo de janeiro de 1995 a janeiro de 2001, quando se afastou do cargo devido ao câncer que resultou na sua morte em março daquele ano ―, que se formou em Direito pela USP e em economia pela PUC, e que sua estreia na vida pública se deu em 2004, quando disputou (mas não ganhou) o cargo de vice-prefeito de Santos (no litoral paulista). Em 2006, ele se elegeu deputado estadual com 122 mil votos, e em 2104, depois de ter aberto mão de concorrer à prefeitura de Sampa (para dar lugar a José Serra, segundo ele, mas fala-se que o real motivo seria o fato de não ter denunciado uma tentativa de suborno), conseguiu uma cadeira na Câmara Federal.

Promovido a prefeito da maior cidade da América Latina aos 38 anos (completados em 7 de abril, dia da sua posse), Bruno Covas parece entender tanto de São Paulo quanto eu entendo de missa. O que ele representa com perfeição ― e uma vez mais na política tupiniquim ― é a praga do vice (para quem não se lembra, Tancredo nos deu Sarney, Collor nos deu Itamar, Dilma nos deu Temer e agora Doria nos dá Bruno Covas). Em recente entrevista à Vejinha (Veja São Paulo), o atual prefeito, que até o ano passado pesava mais de 100 quilos e agora está com apenas 84 (compatíveis com seu 1,84 m), disse ser fã de rock, acordar antes das 6 da matina para fazer musculação na academia, estar divorciado há quatro anos e curtir baladas. Mas afirmou também que a vida de solteiro é coisa do passado, já que "se casaria com a cidade" no dia 7, quando passaria a ocupar o gabinete mais importante do Palácio Anchieta.

Observação: Sete meses depois da posse como vice, em 2017, Covas viajou de férias com 3 amigos para a Croácia, onde curtiu praias, piscinas e o agito do verão europeu, raspou a cabeça e deixou crescer a barba. Em outubro, durante uma esticada em Paris (desta vez em “missão oficial”, embora tenha participado de apenas dois eventos), depois de se indispor com Doria por conta da demissão de Fábio Lepique, seu adjunto na pasta das regionais, ele foi substituído pelo advogado Cláudio Carvalho e assumiu a recém-criada Casa Civil.

O novo prefeito afirma que sua experiência no legislativo e traquejo político o qualificam para administrar uma cidade como São Paulo. E o que teremos oportunidade de conferir a partir desta semana. Boa sorte a ele, e melhor sorte a nós.     

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sábado, 6 de janeiro de 2018

ELEIÇÕES E CORRUPÇÃO NA POLÍTICA ― A CADA ENXADADA, UMA MINHOCA


Gostemos ou não, as eleições 2018 ainda vão dar muito pano pra manga, até porque são determinantes para o futuro do Brasil. Por enquanto, todavia, o que se tem é um amontoado de incertezas, a começar pela situação de Lula, que é o nome mais lembrado ― e, curiosamente, também o mais rejeitado ― nas pesquisas.

Se houver justiça nesta Banânia, a condenação imposta por Moro ao petralha será mantida. Em assim sendo, a lei da ficha-limpo botará um paradeiro em sua falácia de candidato. Claro que seu time de chicaneiro irá recorrer, mas aí voltamos ao campo das incertezas, pois cabeça de juiz, barriga de criança e pinto de padre... Enfim, só nos resta aguardar. E torcer. E acompanhar este vergonhoso governo lotear ministérios para garantir votos na reforma da Previdência.

Já o pato-manco que morreu e não sabe ― ao menos do ponto de vista moral ― continua movendo mundos e fundos para concluir seu mandato. Diz-se à boca pequena que ele aspira à reeleição, mas eu não acho que seja estúpido o bastante para acreditar que tem chances. Aliás, seu fiel pitbull ― o indigesto Carlos Marun ― já acenou com a possibilidade de o PMDB (ou MDB, como o partido pretende voltar a ser chamado) apoiar a candidatura do tucano Geraldo Alckmin, o picolé de chuchu que nem em São Paulo consegue entusiasmar o eleitorado. Volto amanhã com mais detalhes sobre Michel Temer.

Doria, depois do mal-estar que sua pré-candidatura provocou no ninho dos tucanos, desistiu de concorrer para não bater de frente com seu padrinho político (o tal picolé de chuchu). Fala-se que ele deve disputar o governo do Estado, mas é provável que volte a pleitear a presidência se a candidatura de Alckmin realmente não decolar. Afinal, estamos no Brasil, onde nem o passado é previsível.

Luciano Huck também disse que não vai participar do pleito, mas pode mudar de ideia a qualquer instante. De acordo com a coluna Radar da revista Veja, ele admite em conversas particulares que a decisão vai depender do desempenho de Alckmin; se a candidatura do governador não decolar até abril, Huck pode lançar a própria.

O PSDB está mais sujo que pau de galinheiro. Seu capital político, representado pelos mais 50 milhões de votos que Aécio Neves obteve em 2014, evaporou quando o mineirinho safado despiu o manto de santarrão-do-pau-oco. 

Generalizações são perigosas, e por isso não devemos dizer que político nenhum presta ― só que não me ocorre nenhum que esteja acima de qualquer suspeita. Mas é impressionante como, nessa seara, cada enxadada produz uma minhoca. Parece caixinha de lenço de papel, de onde se puxa um e sai um monte. Aliás, ouvi ontem a notícia que o “lixão da Estrutural” ― que fica em Brasília e é considerado pela ONU o maior lixão a céu aberto da América Latina ― será desativado até outubro. Pronto, pensei eu, vão demolir o Congresso e terraplenar a Praça dos Três Poderes.

Falando em lixo, não deixe de assistir ao clipe abaixo (se o vídeo não abrir, use este link: https://youtu.be/oemBQQvlTkQ). Eu acrescentaria algumas considerações, mas estou tão enojado de ouvir falar nesse sujeito que vou me abster. 


Bom dia a todos e até a próxima.

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domingo, 22 de outubro de 2017

DORIA, A FARINATA E A IGNORÂNCIA QUE CAMPEIA SOLTA

TODOS TÊM DIREITO A SUAS OPINIÕES, MAS ISSO NÃO TORNA OS IMBECIS MENOS IMBECIS.

Nas campanhas eleitorais, a primeira vítima é o bom senso. Prova disso são os recentes ataques ao prefeito João Dória, por conta de um projeto que visa alimentar a população mais carente com a “farinata” ― farinha produzida a partir de alimentos que seriam incinerados pelos produtores e supermercados por estarem próximos do final de sua validade, e que pode ser adicionada a pães e bolos ou usada para “engrossar” sopas e ser distribuída sem custos por entidades cadastradas (igrejas, templos e sociedade civil) e pela própria prefeitura.

Alegando que “os pobres precisam de alimentos frescos” e outras falácias que tais, detratores do prefeito põe em risco a iniciativa, que, aliás, nem é de Dória, mas sim um antigo projeto da Igreja Católica, que ora corre o risco de ser cancelado por causa de um bando de demagogos. Para D. Odilo Scherer, Arcebispo de São Paulo, “seria uma pena algo que nasceu para ser bom, por equívocos ou manipulação política, seja de qual lado for, venha a ser de alguma forma amputado ou boicotado”.

No Brasil, ter sucesso é crime ― pelo menos, na visão dos invejosos que perderam a esperança de chegar lá. Por ser uma cara nova na política, um empresário bem-sucedido, dono de um patrimônio invejável, Doria é visto como o protótipo do mauricinho milionário, atacado pelos petistas por antagonizar Lula, pelos tucanos, por “ter traído” seu padrinho político Geraldo Alkmin, e por muitos dos que o elegeram, por seu açodamento em transformar o sucesso da eleição local em antecipação ao pleito presidencial ― como fez antes dele José Serra, que usou a prefeitura como trampolim para sua [malograda] candidatura à presidência. Por conta de suas constantes viagens pelo Brasil e mundo afora, circula há alguns dias nas redes sociais uma piadinha segundo a qual Paul McCartney aprecem mais em Sampa do que o prefeito ― em 9 meses de mandato, Doria ficou fora mais de 60 dias; em sua defesa, o tucano afirma que os deslocamentos ocorreram para promover a capital e buscar investimentos; de janeiro a agosto, ele completou 2.943 horas trabalho, quase 1.200 horas a mais do que a jornada prevista na CLT, de 220 horas/mês.

Observação: Administrar uma megalópole como São Paulo é uma missão quase impossível. Com uma população 50% maior que a Nova Iorque e uma frota de veículos três vezes superior à suportada pela malha viária, Sampa seria um desafio até mesmo para Hemiunu ― o administrador da Pirâmide de Gizé, a maior obra do planeta por muitos séculos. Desde que assumiu, Doria contabilizou sucessos e fiascos. A abertura de empresas, por exemplo, que levava mais 3 meses, agora leva menos de 10 dias; a contratação de professores para as escolas municipais dobrou em relação à administração anterior; o Corujão da Saúde foi tão bem-sucedido que originou o Corujão da Cirurgia; a distribuição gratuita de remédios à população carente preencheu as lacunas (82 itens) e agora oferece todos os 187 principais medicamentos; 320 empresas doaram R$ 660 milhões à prefeitura, e por aí segue a procissão. Já os camelôs continuam fazendo a festa na Av. Paulista e nas marginais; faltam médicos na rede pública; a cracolândia não desapareceu, foi pulverizada e vem proliferando em outras regiões; o número de vagas nas creches continua insuficiente para atender à demanda; a pavimentação de ruas e calçadas deixa muito a desejar; o problema dos semáforos, herdado da gestão Haddad, levou 9 meses para ser resolvido e 8 de 9 serviços de zeladoria estão longe do ideal. Se as desestatizações avançaram, as ciclovias, os corredores de ônibus e outros projetos importantes continuam marcando, sobretudo por falta de recursos: ao sair da prefeitura, Haddad disse ter deixado R$ 5,5 bilhões em caixa, dos quis R$ 3 bilhões seriam de saldo líquido, mas a maior parte desse dinheiro estava comprometida com despesas de curto prazo e, ao final da primeira semana de janeiro, sobraram pouco mais de R$ 230 milhões (Haddad recebeu a prefeitura de Kassab com quase R$ 500 milhões de saldo líquido).

Doria baseia seu marketing no “falem mal mas falem de mim”, e essa superexposição o torna vulnerável a críticas nos meios de comunicação, nas redes sociais, e por pseudo-intelectuais ― como os que defenderam Dilma durante o impeachment e almejam ver Lula de novo na presidência. E convenhamos: o alcaide lida mal com críticas ― venham elas de onde vierem ―, cai facilmente em provocações e, quando precisa decidir se dá vazão à raiva ou contemporiza, ele quase sempre escolhe a primeira opção.

Como salienta J.R. Guzzo, com Doria o simples desacordo não é suficiente; ele desperta a ira em estado bruto dos inimigos, os “sentimentos mais primitivos” do ser humano, é detestado simplesmente por ser Doria. Quase ninguém o julga pelo que faz, apenas pelo que pensa ― ou diz que pensa ―, pouco importando se sua gestão é boa ou ruim. O que interessa é falar que ele é do mal e que está sempre errado, mesmo se disser que o Natal cai no dia 25 de dezembro. É o tipo da coisa que só emburrece um debate que já é burro, como acontece com praticamente tudo o mais quando se conversa sobre política, hoje em dia, neste país. O ato de pensar é cada vez mais desprezado; parece algo desnecessário, irritante e ofensivo, sobretudo se alguém diz alguma coisa que não combina com “o que a sociedade está dizendo”.

Nessa desordem mental, a última preocupação é julgar alguém por suas realizações concretas. Não há diferença sensível entre sua gestão e a anterior, do ponto de vista da “zeladoria”. O abandono, a inépcia e a miséria de resultados continuam os mesmos. A prefeitura não consegue cuidar dos sinais de trânsito, do calçamento abominável das ruas, do corte de mato nas áreas verdes, da iluminação pública, do estacionamento abusivo nas ruas, da limpeza dos bueiros, do lixo largado pelas calçadas. Não conseguiu, nem sequer, eliminar uns poucos metros nas faixas de ciclismo mais extravagantes que o prefeito anterior criou, com o propósito de punir “os ricos” e dar lições de ideologia viária à população. Os problemas, na visão da Prefeitura, se dividem em apenas duas categorias: os muito difíceis e os impossíveis de resolver.

O zelador quer ser síndico, mas não consegue cuidar nem do portão da garagem ― não faz, simplesmente, o serviço para o qual foi eleito. Mas quem está interessado nesse tipo de detalhe? Nem pensar. É muito mais fácil dizer que Doria é de direita ― e não se fala mais no assunto.

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