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sexta-feira, 6 de dezembro de 2019

QUE PAÍS É ESTE?



No apagar das luzes do ano legislativo, a Câmara aprovou por esmagadora maioria o pacote de medidas anticrime e anticorrupção, menina dos olhos do ex-juiz da Lava-Jato e hoje ministro da Justiça e Segurança Pública. Lamentavelmente, foram retiradas do texto a Legitima defesa — que propunha a alteração do Código Penal para permitir “reduzir a pena até a metade ou deixar de aplicá-la” se o excesso em ações de autoridades públicas decorresse “de escusável medo, surpresa ou violenta emoção” —, a prisão após segunda instância — que dispensa explicações — e o plea bargain — confissão dos suspeitos de terem praticado crimes em troca de uma pena menor, sem necessidade de julgamento.

Como se vê, os efeitos detergentes promovidos pelo eleitorado no ano passado foram insuficientes. Prova disso é que o todo poderoso presidente da Câmara, Rodrigo Maia, citado como Botafogo nas planilhas do departamento de propinas da Odebrecht, que raramente vota, passou a presidência da sessão de ontem da Câmara ao deputado Marcos Pereira para votar a favor de um destaque que institui o juiz de garantias ao processo penal — que, em tese, “fiscaliza” a legalidade da investigação.

O fato é que, desde sempre, vimos dando a Herodes acesso à chave do berçário. Veja, por exemplo, a institucionalização do mensalão pelos punguistas do parlamento, sempre prontos a bater a carteira dos "contribuintes". A despeito de faltar dinheiro para tudo, do papel higiênico nas repartições ao giz nas escolas, passando pela saúde e segurança públicas, os nobilíssimos congressistas aprovaram o relatório preliminar que aumenta para R$ 3,8 bilhões o fundo eleitoral em 2020.

Para inflar os recursos das campanhas municipais, o Congresso prevê cortes em saúde, educação e infraestrutura. O Executivo desejava destinar R$ 2 bilhões para custear as disputas locais, mas presidentes e líderes de partidos que representam a maioria dos deputados e senadores articularam a elevação do valor do fundo em R$ 1,8 bilhão. O novo montante irá ainda à votação do relatório final na Comissão Mista do Orçamento, após o que o plenário do Congresso analisará a proposta em sessão prevista para o dia 17 de dezembro. Se mantido esse valor, o fundo será mais que o dobro em relação a 2018, quando foram distribuídos R$ 1,7 bilhão aos candidatos. O dinheiro sai do caixa da União (ou seja, do nosso bolso, pois o governo não gera recursos, apenas os administra).


"Nas democracias, as eleições precisam ser financiadas, e o financiamento privado está vedado. É preciso construir no financiamento público, mas tem de se verificar o valor e de onde virá o recurso para que a sociedade compreenda com o mínimo de desgaste possível para o Congresso", disse Botafogo. Se o Congresso não recuar, Jair Bolsonaro dificilmente vetará esse trecho do projeto, pois ele foi escrito (marotamente) de tal forma que seria preciso barrar todos os recursos para o financiamento das campanhas em vez de um veto parcial. E viva o povo brasileiro!

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Do jeito que as coisas vão, ainda vamos acabar com um problemão. É o que acontece quando a ciência dos “especialistas” diz uma coisa, e a vida real diz outra — no caso, como se ouve há onze meses, “o extremismo neoliberal” do governo em geral e do ministro Paulo Guedes em especial está “destruindo os sonhos” da população e arruinando a economia brasileira, provavelmente para sempre.

Só que está dando o contrário a cada vez que um dado oficial do desempenho da atividade econômica é divulgado: o que tinha de ser ruim, quando a gente vai ver, é bom. Acabou de acontecer com o resultado do PIB, que cresceu 0,6% no terceiro trimestre deste ano, o maior avanço desde o primeiro trimestre do ano passado. Para piorar, o desemprego também está caindo.

A solução para os “especialistas” é dizer que os números foram “uma surpresa”, ou “atípicos”, ou alguma bobagem desse tipo. Ou seja: nós estávamos certos, mas a realidade está errada. Outra saída é dizer que os níveis e crescimento “tendem a não se sustentar”. É muito usado também, no caso da queda do desemprego, dizer que está aumentando o “trabalho informal”, como se ganhar a vida por conta própria não fosse trabalhar.

Em relação às vendas de Natal, que estão com cara de bombar, a desculpa é que o “Natal é temporário”. Enfim, todo e qualquer avanço é condenado como “lento demais” — sem que ninguém consiga dizer em que outro lugar do mundo o ritmo de crescimento está na velocidade desejada pelos analistas.

Quer perder o seu tempo? Continue lendo e ouvindo quem lhe diz que essa “situação aí” está muito difícil.

Alguém precisa avisar a uma parte dos nossos comunicadores sociais que houve uma eleição para presidente da República um ano atrás, que um dos lados presentes no turno final ganhou, e que, em consequência desse fato, adquiriu o direito de fazer nomeações para cargos da administração federal que não exijam aprovação dos demais poderes, passagem por concurso público e outras exigências legais.

Ministros, por exemplo, mandarins do segundo escalão e mais uma infinidade de cargos da máquina estatal, podem ser escolhidos pelos vencedores das eleições segundo os critérios que acharem mais acertados — mesmo porque é isso, justamente, que os eleitores esperam que seja feito pelo candidato em que votaram. Nenhum desses fatos, porém, parece estar claro até agora para uma porção de gente boa nesse país.

Temos assim, a cada vez que alguém é nomeado para alguma função no bonde da União, um coro escandalizado de protestos – fulano de tal, escolhido para o cargo tal, “é de direita”. Ah, não diga — e daí? Esperavam o que? Que fosse de esquerda? Um não serve porque é contra as drogas e não gosta de rock. Outro, porque acha que a proclamação da República foi um golpe militar, ou é contra o aborto, o feriado da “Consciência Negra", o aumento das reservas indígenas, ou acha que a agricultura precisa de fertilizantes e defensivos químicos para produzir alguma coisa.

Mas são pessoas assim, e não o seu contrário, que a maioria dos eleitores quer ver no governo. Essa maioria pensa como elas. Imagina que estão corretas. Acha que deveriam ter sido nomeadas exatamente pelas razões que seus críticos invocam para dizer que não deveriam. Ou é isso, ou então vai ser preciso chamar aquela menina sueca para o Ministério do Ambiente.

Com J.R. Guzzo.

domingo, 22 de setembro de 2019

PENSE UM POUCO



Tenho cá minhas ressalvas em relação ao governo Bolsonaro, mas, no geral, concordo com o autor do texto que transcrevo abaixo:

Previsões sobre o que vai acontecer amanhã sempre ficam melhores quando são feitas depois de amanhã. O que temos na vida real é o hoje, só isso — e o grande problema é chegar a alguma conclusão coerente sobre o que está realmente acontecendo hoje. Há uma sugestão honesta para resolver isso; infelizmente, ela dá trabalho, exige esforço mental e não pode ser encontrada no Google. Como não há o mais remoto acordo sobre o dia de hoje — as coisas estão melhores que ontem, ou nunca estiveram tão horríveis? —, a única ferramenta disponível para ter alguma ideia decente das coisas é pensar. E pensar, como se sabe, é uma das atividades humanas mais odiadas neste país, sobretudo por aqueles que imaginam saber o que estão falando.

No caso, pensar significa olhar com um pouco mais de atenção para onde o Brasil está indo. No fundo, é isso o que importa. O país vai estar melhor daqui a três anos? Depende das decisões que estão sendo tomadas agora. Se você está construindo a cada dia 1 quilômetro de estrada, por exemplo, daqui a 100 dias terá 100 quilômetros de estrada construídos. Não pode ser de outro jeito. Há uma única coisa que importa nisso: se aquele 1 quilômetro por dia está sendo construído mesmo. Se estiver, a realidade do país estará sendo mudada para melhor. Se não estiver, a realidade continuará a mesma. O resto é conversa inútil de sociólogo-politólogo-­intelectuólogo. E então: para onde estamos indo, com base nos fatos que se podem verificar hoje?

É certo, para começar, que há oito meses não se rouba por atacado no governo federal, coisa que jamais ocorreu, na memória de qualquer brasileiro vivo. Não há a mais remota denúncia de nada de errado por aí, apesar da vontade imensa dos adversários do governo de denunciar tudo. Pode haver daqui a meia hora — mas por enquanto não houve. É bobagem ignorar isso, ou achar que não faz diferença — é claro que faz uma tremenda diferença. Também não há dúvida sobre uma realidade raramente mencionada: o ministro da Economia é Paulo Guedes, e Paulo Guedes é o primeiro capitalista de verdade a chefiar a economia brasileira desde Roberto Campos, há mais de cinquenta anos. Guedes é artigo genuíno: não tem compromisso nenhum com a “economia de Estado” e a sua burocracia estúpida, sabe que não pode haver progresso duradouro no Brasil sem o máximo de liberdade econômica e está convencido de que a única função útil de um governo neste mundo é tornar mais cômoda a vida das pessoas. É igualmente óbvio que isso vai mudar o país nos próximos três anos.

É um fato que haverá uma reforma tributária — e, qualquer que ela seja, as coisas não vão ficar como estão, nem a situação atual dos impostos no Brasil vai piorar, pois isso é praticamente uma impossibilidade científica. Não há nenhum motivo concreto para alguém acreditar que o Brasil passará os próximos anos sem fazer privatizações, como passou os treze anos da era Lula-Dilma. Também é uma realidade concreta que não falta capital para ser investido no processo brasileiro de privatização já em andamento: estima-se que existam no exterior, neste momento, entre 15 trilhões e 17 trilhões de dólares aplicados a juros negativos. É possível que nenhum centavo venha para cá? Possível é — mas aí seria preciso demonstrar qual a lógica de uma coisa dessas. Também não há falta do que privatizar. O governo brasileiro é o maior proprietário de imóveis do mundo; boa parte do que tem pode ir para o mercado. O Brasil tem 72000 torres de telefonia; a China tem 1 milhão. A razão sugere que há alguma coisa a fazer nessa área ou em saneamento, já que 100 milhões de brasileiros não dispõem hoje de esgotos, por falta de investimento.

A Petrobras tem 12000 funcionários a menos do que no fim do governo Dilma; mais 10000 serão dispensados no futuro próximo, e a empresa estará enfim preparada para a privatização depois de já ter vendido, sem barulho algum, sua distribuidora BR e suas operações de gás, e posto à venda oito de suas refinarias. Um dos resultados disso, pela lógica, será a redução geral dos custos da energia no país. Por causa do monopólio estatal, o preço do metro cúbico de gás no Brasil é de 12 dólares, em comparação com 7,70 na Europa e 2,80 nos Estados Unidos. Sem Petrobras, sem monopólio e com concorrência, por que essa aberração iria continuar? Houve uma queda superior a 20% no número de homicídios neste primeiro semestre, segundo o site G1. A inflação está perto de zero. Os juros são os mais baixos dos últimos trinta anos. A construção cresce.

São fatos. Pense neles, para pensar no amanhã.

Texto de J.R. Guzzo.

terça-feira, 17 de setembro de 2019

BRASILHA DA FANTASIA? PERGUNTA ALI NO POSTO IPIRANGA


Publicar fatos de interesse público é a função precípua do jornalista; divulgar fatos de interesse do público é coisa de fofoqueiro. Mesmo assim, precedo meu artigo de hoje da informação sobre a alta médica do presidente Bolsonaro, que deixou o hospital na tarde de ontem. Nosso indômito capitão ficou de molho durante oito dias no Hospital Vila Nova Star, onde foi submetido a mais uma cirurgia no abdome, desta feita para resolver problemas de aderência e corrigir uma hérnia incisional. Diferentemente das outras vezes, ele não se internou no Hospital Albert Einstein, pois o cirurgião Antonio Luiz Macedo, que o acompanha desde sua transferência da Santa Casa de Juiz de Fora para São Paulo, trocou o nosocômio israelita, onde trabalhou durante 4 décadas, pelo hospital da Rede D'Or. Fala-se que seu passe vale ouro e que seu salário é de sete dígitos. Enfim, preparemo-nos para a mais recente versão da franquia O Retorno da Múmia. Dito isso, vamos adiante:

O Tesouro secou. Não há dinheiro nem para fazer frente às despesas mais comezinhas. Bolsonaro não só cogita flexibilizar a lei do teto dos gastos, "para não ter de cortar a luz dos quartéis", como sugere espaçar as idas ao banheiro, para economizar papel higiênico. Isso e outras bobagens que nem vale a pena repetir.   

É nesse contexto que os deputados, depois de aprovarem a toque de caixa e em votação simbólica e secreta a lei de abuso de autoridade egressa do Senado — da lavra de Renan Calheiros, que coloca barreiras legais, ou reforça as já existentes, às investigações da Lava-Jato —, preparam mais uma emboscada à carteira dos contribuintes: um projeto que modifica as regras eleitorais e partidárias — já aprovado na Câmara e prestes a ser referendado pelo Senado — prevê, dentre outras barbaridades, o aumento fundo eleitoral de R$ 1,8 bilhão para R$ 3,7 bilhões.  

Trata-se de mais uma evidência cabal de que o interesse público se encontra indefeso no Congresso, que quer a compreensão de todos para restaurar velhas práticas. Como bem lembrou Josias de Souza em seu Blog, os partidos sempre foram financiados pelo déficit público, mas agora o dinheiro já não faz escala na caixa registradora de empreiteiras e de empresas fornecedoras do governo. A grana que financia a fuzarca escorre agora diretamente do Tesouro Nacional para as arcas das legendas. Mal comparando, é como se os políticos se colocassem na posição do personagem da anedota em que o sujeito mata pai e mãe e, no dia do julgamento, pede ao tribunal de júri que tenha misericórdia com um pobre órfão. A diferença entre os parlamentares e o órfão assassino é que deputados e senadores matam a paciência alheia sem pedir perdão.

Resta saber de onde virão os recursos para bancar essa farra do boi, se já não há dinheiro para comprar giz para as escolas nem esparadrapo para os hospitais. O Plano A, que era recriar a CPMF sob o argumento de que o gambá retirado da cartola viraria um lindo coelhinho quando fosse apresentado como alternativa à desoneração da folha salarial, foi descartado, levando de embrulho o secretário da Recita Federal, penabundado um dia depois da divulgação, pelo secretário-adjunto da Receita, de um imposto nos moldes da execrável "contribuição sobre movimentações financeiras". Já o Plano B… Não havia um Plano B.

Deputado, o hoje presidente Bolsonaro esculhambou a CPMF. "Uma desgraça", dizia. Coisa de "cara de pau", enfatizava. Candidato, jurou que jamais admitiria a volta da encrenca caso fosse eleito. Ainda assim, Paulo Guedes e os frentistas do Posto Ipiranga não tinham pensado na possibilidade de o Plano A não dar certo.

Demitido da chefia da Receita, Marcos Cintra, o apologista da CPMF, reforça a ausência de um plano de contingência. Segundo ele, a volta do nefando "imposto do cheque" seria a única alternativa viável de fazer a desoneração da folha. Aposta que Guedes e seu staff terão de ressuscitar o defunto, ainda que "de maneira modificada, atenuada e mais gradativa".

O superministro encomendou estudos novos aos sobreviventes da equipe. Improvisa-se uma alternativa em cima do joelho. Quem dá ouvidos a Marcos Cintra fica tentado a concluir que o Plano B de Guedes é a versão atenuada do Plano A. Consiste em oferecer ao brasileiro um sacrifício à vista — a mordida do imposto seminovo — e um benefício a prazo — a hipotética criação de empregos que resultaria da desoneração da folha.

Antes de ser deposta e de virar cuidadora de netos, a folclórica gerentona de araque  tentou executar o pedaço final da mágica. Mas o gambá da época (renúncia fiscal, sem novo imposto para compensar) não virou coelho e a fila do desemprego continuou crescendo.

Parece incrível que ninguém, na pasta da Economia, tenha previsto que Bolsonaro poderia, em algum momento, interditar a recriação de um tributo que sempre abominou. Faltou no quadro de funcionários do Posto Ipiranga uma criança de cinco anos para prever o que poderia acontecer. A mesma criança constataria que, em matéria tributária, o governo está desnorteado.

Há no Congresso duas propostas de reforma tributária. Nenhuma delas traz as digitais do governo: na Câmara, corre o projeto do deputado Baleia Rossi; no Senado, a proposta elaborada sob a coordenação do ex-deputado Luiz Carlos Hauly. Com oito meses e meio de existência, tudo que o governo conseguiu exibir em termos tributários foi uma crise do Plano B.

Quando Bolsonaro declarou que encontrara um Posto Ipiranga para abastecer sua ignorância econômica, não se imaginou que faltaria combustível tão cedo.

sábado, 1 de junho de 2019

BRASIL — UM PAÍS QUE NÃO PODE DAR CERTO



O Banco Central derrubou a Selic (taxa básica de juros) dos 14,25% ao ano — índice que vigorou de setembro de 2015 a outubro de 2016 —, para 6,5% a.a. em maio do ano passado, e a manteve nesse patamar desde então, mês a após mês. Não pretendo fazer aqui fazer um juízo de valor dessa medida, do ponto de vista econômico, mas apenas salientar que ela provocou uma queda dramática nos rendimentos das aplicações financeiras, afetando, inclusive, as Cadernetas de Poupança, que rendem 70% da Selic mais TR (taxa referencial).

Por outro lado, o spread bancário (diferença entre a remuneração que a instituição financeira paga ao aplicador para captar um recurso e o quanto ela cobra para emprestar o mesmo dinheiro) continua nas alturas. Para se ter uma ideia, as taxas médias cobradas no rotativo dos cartões de crédito e no cheque especial continuam próximas de 300%. No cartão, o juro médio para pessoas físicas caiu de  299,4% para 298,6% ao ano, entre março e abril de 2019, e no cheque especial, no mesmo período, avançou de 322,7% para 323,3% ao ano.

Um país assim não pode mesmo dar certo.

Para encerrar, sobre as manifestações convocadas dias atrás por centrais sindicais, partidos de esquerda e militantes travestidos de professores, com direito a achincalhe a jornalistas que cobriam o protesto e, portanto, estavam fazendo seu trabalho:

sábado, 11 de maio de 2019

GUEDES NA LINHA DE FRENTE



Em quatro meses de governo, apenas contando ao público o que faz durante o seu horário de trabalho, Paulo Guedes já pode ser apontado como o ministro que está dando mais certo na equipe montada para governar o Brasil a partir deste ano. Quem é simpático ao governo, ou mesmo neutro, está gostando. Quem é contra não consegue desgostar de verdade; falam mal, mas têm outros alvos que detestam muito mais, como o ministro Sergio Moro, ou o tipo genérico resumido pela ministra Damares e, mais do que tudo, o próprio presidente Jair Bolsonaro. O resultado é que o ministro da Economia, a cada dia que passa, tem sido ouvido com atenção quando fala. E a conclusão de boa parte do público, cada vez mais, é a seguinte: “Esse homem fala coisa com coisa”. Já é um colosso, na neurastenia geral que comanda a atual vida política brasileira.

Há outros ministros que estão fazendo um bom trabalho fala-se, em geral, das áreas tocadas pelos militares e as suas redondezas. Mas as suas atividades são quase sempre consideradas uma grande chatice pela mídia, e o resultado é que acabam sendo deixados relativamente em sossego. Paulo Guedes, ao contrário, está na linha de frente da infantaria aquela que acaba levando chumbo em primeiro lugar, e chumbo mais grosso que todo o resto da tropa. É natural; ministro da Economia está aí para isso mesmo. Mas embora seja o mais bombardeado de todos, continua inteiro na verdade, está mais inteiro hoje do que quando começou, quatro meses atrás.

Guedes está se dando bem, basicamente, porque não tem medo de políticos, de “influenciadores”, de economistas tidos como “importantes” e, sobretudo, porque não tem medo de perder o emprego. Está lá para fazer o trabalho que, aos 69 anos de idade, acha mais correto para os interesses do Brasil. Só isso. Se der certo, ótimo. Se não der, paciência.

O Brasil, por conta disso, começa a ouvir em voz alta coisas que não costumava ouvir de autoridade nenhuma. Num país campeão em usar as palavras para esconder o que pensa, o ministro tornou-se um especialista em dizer, sim ou não, se é contra ou a favor disso ou daquilo, e explicar por que é contra ou a favor. “O fato é que o Brasil cresceu em média 0,6% ao ano nos últimos dez anos”, disse Guedes há pouco. “O país afundou, simplesmente”. Não adianta, explica ele, ficar enrolando: isso é uma desgraça, que nenhum esforço de propaganda pode ocultar, e é exatamente por isso, só por isso, que o Brasil está hoje de joelhos. A possibilidade de que algo possa ir bem numa economia que tem um número desses é zero. E quem é o responsável direto pela calamidade? Não é o governo da Transilvânia. É o conjunto de decisões tomadas entre 2003 e 2016 pelos presidentes Lula e Dilma Rousseff.

Guedes diz em voz alta o que quase nenhum, ou nenhum, economista laureado deste país tem coragem de dizer: que Lula, Dilma e o PT provaram, através dos seus atos, que são os maiores responsáveis pela criação de pobreza, desigualdades e concentração de renda no Brasil ao longo deste século. “Vocês estão me mostrando um comercial do governo PT”, disse ele ainda outro dia, quando quiseram lhe apertar durante uma entrevista com a exibição de um filme que mostrava filas com milhares de pessoas procurando emprego no Anhangabaú, em São Paulo. Os 13 milhões de desempregados que estão aí, disse o ministro, foram postos na rua pelo PT quem, senão o PT, provocou anos seguidos de recessão? Quem zerou a renda desses coitados? O pior é que essa renda não sumiu; foi transferida para o bolso dos ricos. Também não dá para jogar toda a culpa em cima do PT. Nos últimos 30 anos, lembra Guedes, o crescimento do Brasil chegou ao grande total de 2% isso mesmo, dois miseráveis por cento, durante 30 anos seguidos. Como pode existir alguma coisa certa numa economia assim?

Guedes fala com a simplicidade da tabuada sobre o mais cruel de todos os impostos que existem no Brasil o imposto sobre o trabalho, que é cobrado do trabalhador e de ninguém mais. Para empregar um brasileiro a 1.000 reais por mês, o empregador tem de gastar 2.000”, diz o ministro. O trabalhador não vê um centavo desses 1.000 reais a mais que a empresa paga; são os “direitos trabalhistas”, que somem no buraco negro do governo e beneficiam os bolsos de Deus e todo mundo, menos do pobre diabo em nome de quem eles são pagos. O único efeito prático disso, no fim das contas, é suprimir empregos há cada vez menos gente disposta a pagar o salário de duas pessoas para ter o trabalho de uma. As empresas não contratam; trabalho no Brasil virou algo taxado como artigo de luxo. O preço desse culto aos “direitos” é um horror: entre desempregados e trabalhadores sem carteira, há hoje 50 milhões de brasileiros vivendo no limite do desastre. Guedes lembra que esses 50 milhões não pagam um tostão de contribuição para a previdência social mas terão direito a aposentadoria. Pode dar certo um negócio desses?

O ministro também explica que dá, sim, para fazer o próximo censo; não haverá nenhuma “intervenção no IBGE”. Só que, num país falido como o Brasil de hoje, não se vai fazer 300 perguntas ao cidadão, mas quinze ou vinte, como se faz nos países ricos. A Zona Franca vai acabar? Não, diz Guedes, não vai. Mas não faz sentido deixar de reduzir impostos no resto do Brasil só para não incomodar a indústria de Manaus. Dá para entender? Há, talvez, 1 trilhão de dólares em petróleo embaixo do chão, afirma ele. Mas esse trilhão só existe se o petróleo for tirado de lá; enquanto continuar enterrado será uma beleza para a preservação do “patrimônio da Petrobras”, mas na vida real isso não rende uma lata de sardinha para ninguém. Conclusão: o petróleo tem de sair do chão, e esse trabalho exige investimentos e parcerias mundiais. Há outro jeito?

Paulo Guedes tem, provavelmente, uma das melhores explicações da praça para a dificuldade brasileira de tomar decisões certas a culpa, em grande parte, vem menos da malícia e mais da ignorância. As pessoas querem as coisas, mas não sabem como obtê-las, diz ele. Têm certezas em relação aos seus desejos, mas são inseguras quanto aos meios para chegar a eles, e não gostam de pensar no preço, nem no trabalho, que serão exigidos para conseguir o que desejam. É animador, também, que o ministro pareça ser um homem interessado em realidades. Quanto desafiado, como vive acontecendo, a provar a sua autonomia, diz que prefere resultados em vez de ficar mostrando que manda. É um alívio, também, que não pretenda ganhar o Prêmio Nobel de Economia e nem dê muita bola para a liturgia das entrevistas solenes que às vezes se parecem mais com interrogatórios da Gestapo do que com entrevistas, com a vantagem de não haver tortura física e nem perguntas em alemão.

No fim das contas o sucesso de Paulo Guedes vai depender do crescimento da economia e da queda no desemprego sem isso estará morto, como o resto do governo, por mais coisas certas que tenha feito. A questão é que o único jeito de conseguir mais crescimento e emprego é fazer as coisas certas. É um bom sinal que ele esteja tentando.

Texto de J.R. GUZZO

segunda-feira, 15 de abril de 2019

SOBRE BOLSONARO, PAULO GUEDES, PETROBRÁS E CAMINHONEIROS


Em pouco mais de 3 meses, o governo federal já perdeu dois ministros e caminha para a terceira baixa. A primeira, articulada por zero dois — que é vereador no Rio, mas age como eminência parda no Planalto — foi a exoneração de Gustavo Bebianno da secretaria-geral da Presidência, e a segunda, de Ricardo Vélez do Ministério da Educação. A terceira, pelo frigir dos ovos e o andar da carruagem, deve ser a de Ernesto Araújo do Itamaraty.

A meu ver, nenhum desses atores fará a menor falta ao espetáculo tacanho que a atual gestão nos vem proporcionando. O que me preocupa é a possibilidade de Paulo Guedes abandonar o barco. No último dia 27, numa comissão do Senado, o ministro declarou, sem ser perguntado, que não tem apego ao cargo e que sairá de cena se notar que seu "serviço" não é desejado (volto a esse assunto mais adiante).

Na última sexta-feira, ao suspender o reajuste que a Petrobras havia anunciado para o óleo diesel e infligir à petrolífera uma perda de R$ 3,4 bilhões em valor de mercado, Bolsonaro testou mais uma vez a paciência de Guedes. Apesar do dia positivo no exterior, o Ibovespa caiu a 92.875 pontos — menor nível desde 27 de março, quando a preocupação era a reforma da Previdência —, e isso depois de ter quebrado a barreira dos 100 mil pontos no dia 19 de março passado.

A decisão do presidente foi uma consequência direta da pressão dos caminhoneiros. Relatórios da Abin indicavam uma “preocupação” com uma nova greve, e Bolsonaro foi convencido por assessores palacianos de que a paralisação traria mais problemas políticos do que uma intervenção no preço do diesel. Nesta segunda-feira, haverá uma reunião com ministros e pessoal da área técnica para discutir demandas dos caminhoneiros e propor à Petrobras a ampliação da rede de decisão de aumento de preços de combustíveis — hoje, o gerente executivo de comercialização da estatal tem alçada para definir reajustes de até 7%.

A política de reajustes diários implementada por Michel Temer desencadeou a greve do ano passado. O formato atual leva em consideração a cotação internacional do petróleo, o câmbio, o custo de importação do combustível e a margem de lucro da empresa. Como o preço caiu no último trimestre de 2018, a pressão dos caminhoneiros também amainou, mas voltou a orbitar os US$ 70 neste começo de ano — o mesmo patamar de maio do ano passado, quando eclodiu o protesto. Com isso, rumores de uma nova paralisação recomeçaram e não cessaram nem mesmo após o anúncio de ajustes mais espaçados e de um cartão de abastecimento a preços fixos. E a divulgação de um reajuste maior que a inflação acirrou os ânimos, levando Bolsonaro a interferir, até porque sua popularidade cadente não resistiria aos efeitos deletérios de outra greve daquela magnitude. Por outro lado, ao ceder à chantagem, a vítima assume o risco de novos achaques do chantagista, que aumentará cada vez mais suas exigências. Se às vezes é preciso dar os anéis para não perder os dedos, noutras se deve ser duro e tomar medidas duras para “colocar cada qual no seu quadrado”.  

Durante a campanha, Bolsonaro disse “estar na fase de namoro” com seu "Posto Ipiranga". Mais adiante, declarou-se “apaixonado” por Fernando Gabeira, que, com argumentação moderada, procurava pontes de entendimento. Na viagem a Israel, ao justificar que seu governo só levava um escritório a Jerusalém, disse estar “na fase de namoro”, à qual se sucederiam o noivado e o casamento. Na mesma viagem, falando sobre a ditadura (aquela que agora sabemos nunca ter existido), afirmou que “não foi uma maravilha, regime nenhum é”, e acrescentou: “qual casamento é uma maravilha?”. Na semana retrasada, durante um café da manhã com jornalistas, perguntado sobre a possível exoneração de Ricardo Vélez, respondeu: “Na segunda-feira vamos tirar a aliança da mão direita; ou vai para a esquerda ou vai para a gaveta”.

Segundo Josias de Souza, o "casamento hétero" que Bolsonaro diz manter com Paulo Guedes é o triunfo da esperança sobre a lógica, pois o presidente parece empenhado em reforçar a impressão de que a felicidade conjugal é uma utopia. Sua decisão sobre o aumento do diesel foi a segunda bola quadrada lançada nas costas do superministro em 100 dias de governo — a primeira foi a desavença gratuita que eletrificou as relações do Planalto com o presidente da Câmara, que não serviu senão como estorvo à tramitação da reforma da Previdência. No mais novo desafio à paciência do ministro, o presidente insinua que a felicidade conjugal só é possível a três. O intervencionismo do capitão trai o ultraliberalismo do velho de Chicago numa aventura extramatrimonial com os caminhoneiros: o telefonema ao presidente da Petrobras foi dado justamente quando seu ministro vendia o "novo Brasil" em Nova York.

Observação: Perguntado sobre o assunto, Guedes respondeu que passara o dia inteiro trabalhando e que não tinha informação suficiente. Questionado sobre ter sido consultado, disse simplesmente: “Eu tenho um silêncio ensurdecedor para os senhores”. Mesmo assim, ficou a impressão de "inferência razoável" a suposição de que Bolsonaro não consultou seu ministro antes de intervir na política de preços da petrolífera.

Ao perceber que a economia não aguenta desaforos, Bolsonaro tentou enquadrar seu ato institucional num ambiente de normalidade econômica: "Nossa política é de mercado aberto e de não intervenção na economia." Bolsonaro ensaiou a coreografia de um meia-volta, volver: "O presidente da Petrobras, após nos ouvir, suspendeu temporariamente o reajuste. Convoquei os responsáveis pela política de preços para reunião, junto com os ministros da Economia, Infraestrutura e Minas e Energia." Mesmo assim, o presidente produziu uma inarredável sensação de déjà-vu ao evocar o represamento dos preços de combustíveis e outras tarifas públicas do nada saudoso governo Dilma.

Outra greve de caminhoneiros poderia acelerar ainda mais a queda de popularidade do governo, mas intervenções como a de sexta-feira podem levar a equipe econômica a abandonar o barco. É imperativo, portanto, deixar patente que o episódio foi pontual e que as ingerências não se tornarão recorrentes — aliás, foi a mudança na política de preços para atender aos caminhoneiros que levou Pedro Parente a deixar a presidência da Petrobras, em junho do ano passado. O governo precisa usar de criatividade para reduzir a volatilidade do petróleo, quiçá criando um fundo de estabilização, flexibilizando os impostos, quebrando o monopólio de refino da estatal e/ou chamando a atenção dos governadores para o fato de que as alíquotas de ICMS são absurdas.

A despeito de repetir que não entende de economia — o que é a mais pura exaltação do óbvio —, Bolsonaro afirmou a jornalistas que quer ver detalhes de como é calculado o reajuste dos combustíveis e qual o custo de produção da Petrobras. Como dizia meu finado avô, muito faz quem não atrapalha.

sexta-feira, 18 de maio de 2018

MICHEL TEMER E SEU GOVERNO ZUMBI



Pelo calendário oficial, diz uma matéria publicada em O GLOBO na última quinta-feira, o mandato de Michel Temer termina no dia 31 de dezembro deste ano, mas, na vida real, seu governo morreu na noite de 17 de maio do ano passado, quando o terremoto provocado pelas revelações da delação da JBS abalou as estruturas de uma gestão à qual sempre faltou a legitimidade das urnas. A partir de então, sua excelência deixou de ser um presidente que se pretendia reformista para virar um político que usaria todos os meios junto ao Congresso para não cair.

Cinco dias antes de a bomba explodir, Temer comemorara seu primeiro ano de governo, e apesar da popularidade esquelética (em abril de 2017, o Ibope lhe atribuía míseros 10% de aprovação), articulava um discurso em tom triunfante, exaltando a aprovação da PEC dos gastos públicos, a queda da inflação e a redução da Selic. Naquele cenário, a reforma da Previdência eram favas contadas ― ainda que o texto original fosse relativamente atenuado, ninguém, nem mesmo a oposição, duvidava da força de Temer para fazê-la passar no Congresso.

Mesmo que as ruas não lhe sorrissem, Temer era o senhor do Congresso. No discurso do dia 12 de maio do ano passado, disse estar seguro de que “ao completar nosso segundo ano de governo, teremos um país reestruturado e muito mais feliz”. Mas o presidente que arriscou essa profecia foi o mesmo que meses antes recebera Joesley Batista para a fatídica conversa a dois no Palácio do Jaburu, e quando o diálogo veio a público, passou a viver em função de três objetivos: não cair, não cair e não cair.

Especialista na arte de conhecer os desejos dos parlamentares, Temer negociou tudo o que podia para sepultar as duas denúncias do então procurador-geral Rodrigo Janot. Venceu a parada na Câmara e se manteve no cargo, mas seu governo, desde a noite de 17 de maio de 2017, virou um zumbi. A partir de então, seu capital político, fortalecido pela liderança na articulação para depor sua predecessora, passou a ter outra função: a sobrevivência virou pauta única.

Presidente da Câmara por três vezes, Temer conhece o Legislativo como poucos. Sabia que precisava atuar em dois campos para conseguir evitar que 342 deputados autorizassem o Supremo a processá-lo. O discurso da continuidade era necessário, mas o mais importante era manter a base satisfeita com a moeda típica da coalizão: cargos, emendas e obras nas bases dos parlamentares. Dois ministros chegaram a sondar um cacique do PSDB com a ideia de derrubar o governo, mas, abatidos pelas fortes acusações contra Aécio Neves, os tucanos mais graúdos resistiram e, com o tempo, o partido rachou.

A estratégia da tropa de choque do Planalto foi atuar no varejo e conquistar o coração do baixo clero. Todavia, vendo o governo nas cordas, os parlamentares se aproveitaram para conseguir benesses na véspera do ano eleitoral. Um ministro conta que, entre as demandas, houve quem solicitasse a aprovação de uma obra de R$ 300 milhões

Os ministros políticos pressionavam a área técnica pela liberação de emendas. Em junho e julho foram empenhados R$ 4,2 bilhões, mais de 60% do previsto para o ano. O ritmo caiu em agosto para R$ 200 milhões, depois que, no dia 2 daquele mês, Temer venceu a primeira batalha. Entre setembro e outubro, quando a segunda acusação foi rejeitada, o governo empenhou mais R$ 900 milhões.

Para sepultar as denúncias, Temer empenhou capital político demais para exigir do Congresso a aprovação da impopular reforma da Previdência. Houve até articulações para tentar ressuscitar o tema, mas a intervenção do Rio o sepultou em definitivo. Ainda se fala em suspender a medida por alguns dias para votar a PEC, mas isso é tão improvável quanto a alegada candidatura do peemedebista à reeleição em no pleito de outubro. Na vida real, o governo naufragou. Só as investigações é que não sucumbiram.

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quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

JULGAMENTO DE LULA DERRUBA ÍNDICE BOVESPA



Com a aproximação do julgamento da apelação de Lula, o Ibovespa caiu 1,18% ― a 80.709 pontos ― no final da tarde de ontem, e fechou em queda de 1,22%, a 80.679 pontos. 

Não foi um movimento brusco, mas não deixa de ser uma queda.

O dólar, por sua vez, subiu 0,96% e está cotado a R$ 3,24.

Mesmo com o provável placar de 3 a 0 pela condenação, o mercado entende que ainda caberá chances de recurso por parte do petralha, daí a realização de lucros após sucessivos índices favoráveis.

Pelo visto, até depois de morto esse pulha continuará dando prejuízos ao Brasil.

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quinta-feira, 9 de novembro de 2017

SOBRE MICHEL TEMER E O QUADRILHÃO DO PMDB

A despeito do que pensam algumas pessoas de visão monocromática, incapazes de distinguir as nuanças que separam o preto do branco no nosso polarizado cenário político, o fato de eu abominar Lula e o PT não significa que sou partidário dos tucanos, nem que o governo Temer ou ― menos ainda ― que estou propenso a votar em Bolsonaro no ano que vem. Como dizia Mário Quintana, “a burrice é invencível”, de modo que não vale a pena perder tempo com as toupeiras vermelhas. Até porque, na minha avaliação, todos os corruptos, independentemente de suas convicções político-partidárias, deveriam ser despojados dos bens que acumularam ilicitamente e devidamente encarcerados, deportados, exilados, esquartejados e jogados num rio apinhado de piranhas, tanto faz, desde que nunca mais a gente ouvisse falar deles (e delas, porque Dilmanta, Graça Foster, Gleisi Hoffmann, Jandira Feghali, Katia Abreu, Vanessa Grazziotin, dentre outras tantas, também ocupam posições de destaque na minha listinha). Dito isso, sigamos adiante.

Michel Temer, que aspirava a entrar para a história como “o cara que recolocou o Brasil nos eixos”, fá-lo-á pela porta dos fundos, como “o primeiro presidente no exercício do mandato a ser denunciado por crime comum”. Mesmo assim, sob a batuta competente da nauseabunda tropa de choque do Planalto, um coro de 251 marafonas da Câmara entoou a marcha fúnebre enquanto a segunda denúncia contra o peemedebista era sepultada, a despeito da caudalosa torrente de indícios de que ele mijou fora do penico.
 
Na verdade, a denúncia contra Temer e seus ministros não “morreu”; apenas ficará em “animação suspensa” ― como os vampiros durante o dia, quando, dizem, se recolhem a seus caixões nos porões do Jaburu, digo, dos castelos da Transilvânia (que agora se chama Romênia, mas enfim...).

Devido ao deplorável foro privilegiado, TemerMoreira Franco e Eliseu Padilha serão julgados sabe lá Deus quando ― certamente não antes de 2019, a não ser que este governo não dure até o apagar das luzes do ano que vem ― afinal, estamos no Brasil, onde até o passado é imprevisível. Os demais integrantes da tal quadrilha do PMDB Eduardo Cunha, Henrique Alves, Geddel Vieira Lima e Rodrigo Rocha Loures, para citar os mais notórios ―, que não têm prerrogativa de foro, devem responder por seus atos mais cedo, já que o ministro Fachin decidiu remeter ao juiz Sérgio Moro a parte da denúncia por associação criminosa que lhes toca (a parte que versa sobre obstrução à investigação de organização criminosa que envolve Joesley Batista e Ricardo Saud ficará com a Justiça Federal em Brasília).

Gostemos ou não, Temer é presidente que temos e que teremos até o final do ano que vem. E como mais vale acender uma vela do que amaldiçoar a escuridão, melhor torcer para que as manobras imorais da tropa de choque palaciana produzam estabilidade política suficiente para que a equipe econômica continue a fazer seu trabalho. Mesmo que a inflação de 3% a.a. seja conversa pra boi dormi ― como bem sabe quem vive no mundo real, frequenta supermercados, restaurantes, postos de combustíveis, e por aí afora (aliás, de junho até agora o preço do gás de cozinha aumentou mais de 50%) ―, é inegável que a situação do país melhorou muito depois que anta incompetenta foi exorcizada e Temer assumiu o comando da nau dos insensatos. Agora, porém, depois que fez o trato com o diabo e se tornou refém dos parlamentares, a coisa ficou mais complicada.

O lado bom dessa história ― se é que existe algum ― é que não faltam novas emoções, pois fatos novos (e estarrecedores) se reproduzem no lamaçal da política como coelho nas campinas. Como salientou o jornalista Augusto Nunes, errou redondamente quem imaginou, nesta virada de outubro para novembro do ano da graça de 2017, que o feriadão de Finados (com a consequente desativação dos três Poderes) lhe permitiria descansar dos absurdos que inundam diariamente o noticiário jornalístico. A folga foi para o espaço a bordo de maluquices de estarrecer até os napoleões-de-hospício. Confira:

Geddel Vieira Lima, que exerce desde a infância o ofício de delinquente, solicitou ao Supremo Tribunal Federal a identificação do autor da denúncia que levou à descoberta dos mais de R$ 51 milhões guardados num prédio em Salvador e as notas que comprovam a existência de suas impressões digitais na dinheirama (só faltou pedir que lhe devolvessem a bufunfa). A ideia do inventor do apartamento com vista para o mar de dinheiro roubado só serviu para confirmar que no faroeste à brasileira o vilão é que persegue o mocinho.

Sérgio Cabral, recordista mundial de ladroagem em extensão, altura e abrangência, foi previsivelmente salvo por Gilmar Mendes da mudança para um presídio atulhado de criminosos que, perto do saqueador do Rio, parecem coroinhas que só furtam o vinho do padre. Continua hospedado no hotel-presídio que lhe oferece, entre outros mimos cinco estrelas, até os serviços de um mordomo. Alex ― esse e o nome do diligente mucamo ― realiza desde a faxina da cela até um serviço diário de chá da tarde. Tamanha elegância não existe nem nas cadeias de Paris.

Numa discurseira em Belo Horizonte, Lula prometeu trazer de volta ao Brasil a democracia que está por aqui desde 1989, responsabilizou Michel Temer pelo que o orador e sua sucessora fizeram, exigiu um tratamento mais carinhoso para a Petrobras que assaltou e jurou que tanto a alma viva mais pura do país quanto a falecida Marisa Letícia não nasceram para roubar ― verbo que conjugaram incessantemente depois da chegada à vida adulta.

Tom Jobim já dizia que o Brasil não é para amadores, mas agora isto aqui está ficando esquisito até para os mais devotados profissionais.

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