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domingo, 22 de dezembro de 2019

BOLSONARO — FALTA DE COMPOSTURA QUE BEIRA A INSANIDADE


Jair Bolsonaro vem numa escalada de falta de compostura que beira a insanidade. O episódio da última sexta-feira, em que ele destratou jornalistas, demonstrando falta de educação e preconceitos, é próprio de quem se sente acuado, e de fato o presidente está acuado, tanto pela queda de sua popularidade quanto pelas limitações que as instituições democráticas lhe impõem, sem mencionar as denúncias contra seu primogênito, que envolvem toda uma família ampliada que, pelas acusações do MP-RJ, vivia às custas do Erário público.

Bolsonaro anda também cercado de fantasmas, desde as alucinações de que querem vê-lo morto para tomarem-lhe a presidência, até o impeachment político. O delírio persecutório que revela assiduamente pode fazer parte de uma personalidade paranoica, agravado pelo atentado contra sua vida, bastante real.

Mas o impeachment já está colocado e, como é um instrumento sobretudo político, será acionado, ou não, quando as forças políticas no Congresso desejarem. Motivos, o capitão já deu de sobra, e a falta de decoro é apenas mais um — e não será o último. A despeito de todos os aspectos negativos, talvez não fosse uma má ideia restabelecer a hierarquia nesta Banânia: sai o capitão, entra o general.

A investigação contra Zero Dois certamente está abalando a já desequilibrada personalidade do presidente, embora a punição dificilmente venha a acontecer em razão direta das denúncias do Ministério Público. Mas podem atingir Bolsonaro no correr das investigações.

O próprio Bolsonaro, demonstrando o quanto o assunto o incomoda, já disse que surgirão diálogos que sugerirão que ele tem ligações com milicianos do Rio de Janeiro. O ex-ministro Bebianno, acusado indiretamente de desejar ser seu vice para substituí-lo em caso de morte, disse claramente que as ligações do presidente com milicianos serão demonstradas nas investigações.

A punição ao senador Flávio Bolsonaro, se houver, não virá através do Congresso. David Alcolumbre já disse que nenhuma denúncia poderá ser analisada no Conselho de Ética porque, se algo aconteceu, foi quando Flávio era deputado estadual.

Uma possível condenação vai depender de denúncia do Ministério Público, com argumentos fortes o bastante para convencer o Senado a permitir a punição, mas acho que essa autorização não será dada. No entanto, politicamente a situação é muito ruim para a família Bolsonaro, e essa investigação ainda vai bater em situações delicadas, apesar de, concretamente, ser difícil condenar o senador — a não ser que a coisa evolua de tal maneira que se chegue a uma situação de impeachment.

Rodrigo Maia, disse que Bolsonaro não tem motivos para se preocupar com um processo de impeachment, mas sobre outro assunto. O presidente passou dias sugerindo que vetará a proposta de fundo eleitoral de R$ 2 bilhões aprovado pelo Congresso para a campanha municipal do próximo ano. Fez até uma enquete populista com apoiadores, na porta do Alvorada, perguntando, como se fosse um animador de auditório, quem achava que devia vetar o projeto. Foi aplaudido quando disse que não aprovaria dinheiro para fazerem campanha eleitoral. 

Bolsonaro jogou o Congresso contra a opinião pública dizendo que, numa comparação absurda, com uma verba dessas o ministro da Infraestrutura faria várias obras necessárias para o país. Em uma live nas redes sociais, afirmou ainda que aguardava parecer jurídico para saber se poderia vetar o Fundão Eleitoral, com receio de sofrer um impeachment como retaliação política. Mais uma tentativa de jogar seus seguidores contra o Congresso. Sua relação com os parlamentares, que havia entrado em módulo de pacificação, voltou a ficar conturbada. A simples ameaça de vetar o Fundo Eleitoral acirrou os ânimos no Congresso, que promete derrubar o veto — inclusive porque a proposta de R$ 2 bilhões veio no Orçamento enviado pelo Palácio do Planalto.

Os problemas da família Bolsonaro com a Justiça, porém, servirão certamente de instrumento para tentativas de constranger o Palácio do Planalto. E isso não é paranoia do presidente, é apenas a baixa política, que sempre foi o terreno das manobras de Bolsonaro.

Com Merval Pereira

quinta-feira, 19 de dezembro de 2019

VIVA EU, VIVA TU, VIVA O RABO DO TATU!


Lula, o grande responsável pela nefanda polarização político-ideológica, cuspiu na cara dos brasileiros ao se autopromover de migrante nordestino a presidente da República e, ato contínuo, tornar-se um punguista categorizado. Já a banda podre da nossa mais alta corte, capitaneada por seu atual presidente e pela Maritaca de Diamantino, fez o mesmo ao reverter o entendimento que autorizava a prisão após decisão em segunda instância e ao tirar da cartola uma regra absurda, sobre a ordem de apresentação de memoriais nos processos em que há réus delatores e delatados, que vem anulando condenações da Lava-Jato a torto e a direito (como Ademir Bendine e Paulo Preto, para citar os casos mais emblemáticos). 

Salta aos olhos de quem os tem que o propósito dessas barbaridades sempre foram beneficiar o ex-presidente decarréu, já condenado em dois processos — no do tríplex, ele foi considerado culpado por corrupção e lavagem de dinheiro por 9 magistrados em 3 instâncias; no do sítio, a decisão condenatória da 13ª Vara Federal do Paraná grau foi confirmada pelo TRF-4.

O mais curioso em toda essa história é que a autodeclarada alma viva mais honesta da galáxia já havia conquistado o direito à progressão de pena — excrescência prevista numa legislação escrita por corruptos para favorecer criminosos —, mas, mesmo assim, seus esbirros no STF resolveram pecar por ação, permitindo que o demiurgo pernambucano e cerca de outros 4.000 condenados que, como ele, aguardavam na cadeia o julgamento de seus recursos pelos tribunais superiores, permanecessem em liberdade até o julgado da decisão condenatória (o que no Brasil equivale a dizer "no dia de São Nunca").

Foi também graças a essa maldita polarização, combinada com a absoluta desinformação de boa parte do eleitorado, que foram limadas, juntamente com um arrepiante elenco de circo de horrores, as poucas opções que poderíamos ter experimentado. Assim, diante da perspectiva de ver a marionete do presidiário se aboletar no Palácio do Planalto, só nos restou apoiar um deputado do baixo-clero populista, boquirroto e despreparado. Felizmente, o Brasil tende a avançar apesar de seus governantes Mas isso não muda o fato de que uma usina de crises no comando da Nau dos Insensatos está longe de ser o melhor dos cenários.  

Depois de chamar de "pirralha" a ativista-mirim escandinava Greta Thunberg — que se tornou conhecida mundialmente, da noite para o dia, pela defesa ao meio ambiente —, Jair Bolsonaro chamou de "energúmeno" o educador e filósofo Paulo Freire, morto em 1997.

Na visão do presidente, a antiga programação da TV Escola era "totalmente de esquerda" e promovia a ideologia de gênero, razão pela qual o contrato com a associação responsável por geri-lo desde 1995 não foi renovado. “Você conhece a programação da TV Escola? Deseduca”. Queriam que assinasse agora um contrato de R$ 350 milhões? Quem assiste a TV Escola? Ninguém assiste. Dinheiro jogado fora”, disse o capitão durante uma de suas tradicionais conversa com apoiadores defronte ao Palácio da Alvorada. “Olha a prova do Pisa. Estamos em último lugar no mundo, se eu não me engano, matemática, ciências e português. Acho que em um ou dois itens somos os últimos da América do Sul. Vamos esperar o que desse Brasil com esse tipo de educação?”, completou o presidente.

Observação: Paulo Freire foi declarado patrono da educação brasileira em 2012. O educador desenvolveu uma estratégia de ensino baseada nas experiências de vida das pessoas, em especial na alfabetização de adultos. Uma de suas obras, "Pedagogia do Oprimido", é o único livro brasileiro a aparecer na lista dos 100 títulos mais pedidos pelas universidades de língua inglesa consideradas pelo projeto Open Syllabus.

Quanto à semideusa escandinava que a imprensa tem na conta de envida por Odin, pelo pai de todos os deuses nórdicos, para salvar o mundo do aquecimento global, faço minhas as palavras de Adrilles Jorge: Greta Thunberg é uma fedelha que espalha catastrofismo ecológico falso, e a mídia e os próprios pais da garota autista exploram sordidamente seu fanatismo na defesa de uma causa ideopata. Greta é uma pirralha inocente dos monstros que a manipulam.

Mudando de pato para ganso, ou melhor, de Jair Bolsonaro para Dias Toffoli (repare que ambos têm em comum a total inadequação para o cargo que exercem), o togado disse em recente entrevista ao Estado que a Lava-Jato destruiu empresas, que o MP é pouco transparente e que isso jamais aconteceria nos Estados Unidos.

Não se trata de uma ideia nova ou original, mas de uma ladainha que vem sido cantada em prosa e verso por proprietários e executivos de diversas companhias privadas, envolvidas ou não em processos abertos a partir das investigações empreendidas pela Lava-Jato, e por um sem-número de parlamentares de esquerda temerosos de amanhecer com uma equipe de agentes federais na sua porta — como é caso de Gleisi Hoffmann, atual presidente nacional do PT, e seu ídolo e mentor corrupto e lavador de dinheiro, que não se casa de repeti-la sem parar.

O notório saber jurídico exigido pela Constituição de um ministro do Supremo passa longe do currículo de Toffoli, que só recebeu a toga graças aos "bons serviços" prestados os Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, ao PT, às campanhas de Lula e ao guerrilheiro de araque José Dirceu, de quem foi assessor na Casa Civil durante a primeira gestão petista. A exemplo de Ricardo Lewandowski, que também recebeu a sua das mãos de Lula por sugestão da então primeira dama e indicação da família Demarchi, influente em SBC, o atual presidente da Corte vestiu a toga, mas não despiu a farda de militante petista. E suas recentes decisões e artimanhas urdidas nos bastidores não deixam dúvida quanto a imorredoura gratidão desse ministro àqueles que o conduziram ao cargo mais ambicionado no âmbito da magistratura.

Não é do conhecimento dos seres humanos não submetidos à lavagem de creolina no cérebro que a nossa Carta Magna tenha adotado o desvario de exigir do MPF o dever cívico de salvar da derrocada financeira chefões e quadrilhas do crime organizado, das altas direções de partidos e empresas. Portanto, não é cabível que o ocupante ocasional do mais alto posto do poder judicante invista o total capital de credibilidade da instituição que preside no uso de álcool gel nas mãos sujas dos gestores de empresas que usaram dinheiro público para enriquecimento pessoal. Ou dos agentes públicos que disso se aproveitaram, mesmo que fosse apenas para aumentar o poderio financeiro das organizações partidárias em que militam e que dirigem. Seja qual for a causa, esse disparate infame desqualifica o ocupante do poderoso cargo e exige prontas providências para que não contamine os outros dez membros e a instituição como um todo.

A entrevista de Toffoli traz outras pérolas porcinas menos relevantes, mas reveladoras da escassa inteligência de quem as produziu. No país em que a carência de saneamento básico faz de milhões de miseráveis vítimas das doenças pulmonares dos esgotos a céu aberto das “comunidades” pobres da periferia, uma tosse intrometida o levou a se queixar do caríssimo aparelho de ar-condicionado daquele que hoje no Brasil só seus membros chamam de “excelso pretório”. Ou suas recorrentes reclamações de excesso de trabalho numa instituição que evoca para si mesma deveres de outros Poderes da República como formas de adquirir mais poderio. 

Em seu afã de se transformar em Maquiavel de Marília, o ex-garçom petista da Academia da Pizza já teve a pachorra de misturar delito fiscal (da alçada da Receita Federal) com crime financeiro (fiscalizado pelo Coaf, que voltou a ser Coaf) na decisão monocrática que perdeu por 9 a 2 no plenário do STF. A liminar blindava, ao mesmo tempo, o primogênito do presidente da República, a advogada Roberta Rangel, mulher de Toffoli, a também advogada Guiomar Mendes, esposa da Maritaca de Diamantino, e mais um sem-número de investigados. E se a decisão monocrática do ministro teve início ridículo, atingiu as raias do trágico quando o próprio autor votou contra o próprio relatório, levando o citado cúmplice a fazer o mesmo para manter a relatoria da dita ação.

Voltando agora a Bolsonaro e suas estultices:

segunda-feira, 30 de setembro de 2019

UMA HISTÓRIA DO OUTRO MUNDO



EU VOU CONTAR PRA TODOS/A HISTÓRIA DE UM RAPAZ/QUE TINHA HÁ MUITO TEMPO A FAMA DE SER MAU/SEU NOME ERA TEMIDO, SABIA ATIRAR BEM/SEU GÊNIO VIOLENTO, JAMAIS GOSTOU DE ALGUÉM.

Os versos acima foram pinçados da canção "A HISTÓRIA DE UM HOMEM MAU" (querendo, dê play no vídeo abaixo e ouça a música).

A razão de esse velho sucesso dos anos 1960 me ter vindo à mente e o porquê de eu usá-lo na abertura deste texto ficarão claros ao longo desta postagem.


Há quem acredite na existência de dimensões paralelas, onde clones de nós vivem as vidas que viveríamos se tivéssemos escolhido virar à direita em vez de à esquerda, ou vice-versa, nas diversas encruzilhadas que se nos apresentam ao longo de nossa existência (a quem interessar possa, sugiro a leitura deste artigo).

A ideia de múltiplos universos existindo simultaneamente em dimensões paralelas deu azo a inúmeros livros e filmes — dentre os quais eu recomendo o fantástico (sem trocadilho) seriado Fringe, de J.J. Abrans (de Armageddon e Missão Impossível 3), cujo piloto, tão caro quanto o de Lost, que já era um dos mais caros da história, àquela época, começa com um misterioso caso que, para resolver, a agente Olivia Dunham (Anna Torv) busca a ajuda do cientista excêntrico  Walter Bishop (John Noble), que não à toa foi internado em um manicômio.

Basicamente, a ideia é de que há tanto regiões do universo que foram inflacionadas no passado e criaram matéria e radiação quanto outras que ainda estão inflacionando e devem gerar em algum momento mais matéria e radiação, dando origem a novos universos.

Nesse multiverso, a Terra é apenas um dos planetas que compartilham nosso sistema solar, que é um dos incontáveis sistemas estelares que compõem a Via Láctea, que é uma das inúmeras galáxias que existem no Universo — algumas tão distantes que a luz de suas estrelas ainda não foram captadas por nossos mais poderosos telescópios.

Para além disso tudo, especula-se que haja outros universos, mas em dimensões diferentes — alguns tão minúsculos que seus sistemas estelares estariam dentro dos átomos que formam a matéria. Num deles, ou em alguns deles, ou em milhões, bilhões ou trilhões deles, talvez exista um "outro você" vivendo num mundo que pode ser igual a este, mas onde a história seguiu um curso diferente.

Detalhar tudo isso foge ao escopo desta postagem (para saber mais sobre multiverso clique aqui) e à esfera de conhecimentos deste humilde blogueiro, sem mencionar que fazê-lo tornaria esta introdução maior que a historinha de ficção que vou narrar a seguir — por "ficção" entenda-se "fantasia", algo que é fruto da criatividade e/ou imaginação do autor; assim, quaisquer semelhanças com fatos, eventos ou pessoas, vivas ou mortas, neste ou em outro país, serão meras coincidências.

Era uma vez um desses universos paralelos que supomos existir. Num de seus zilhões de galáxias, brilha uma estrela de quinta grandeza orbitada por uma porção de planetas, dentre os quais o Lodo, que abriga um paisinho sem-vergonha chamado Bostil.

Reza a lenda que o Criador foi magnânimo com Bostil ao distribuir benesses e desgraças entre os 7 continentes de Lodo. Assim, ao verem o país ser favorecido por um clima predominantemente subtropical, fauna e flora diversificadas e abundantes, mais de 8 mil quilômetros de costa e 5 mil quilômetros quadrados de florestas numa área chamada de Bananônia Legal — onde todo ano ocorrem queimadas, e todo ano ONGs e comunidades internacionais (pois é, isso existe também por lá) reagem como se a fumaça estivesse prestes sufocar toda a população do planeta —, a oposição chiou. Mas o Senhor das Esferas sentenciou: Esperem para ver o povinho de merda que eu vou colocar aí". Dito e feito.

Os primeiros habitantes de Bostil eram silvícolas preguiçosos, que não cultivavam nada, nem tampouco replantavam o que consumiam. Quando exauriam os recursos naturais da área ocupada por suas aldeias, simplesmente mudavam-nas para outro lugar. Quando suas mulheres pariam, refestelavam-se em suas redes; quando eram forçados pelos "colonizadores" a trabalhar, preferiam morrer (literalmente) a pegar no batente — qualquer semelhança com certo ex-presidente de origem popular, que séculos depois espoliaria o Erário de Bostil para se perpetuar no poder (pois é, coisas assim também acontecem por lá), pode ou não ser mera coincidência. Mas vamos por partes.

Bostil proclamou sua independência, trocou a monarquia pela república, foi presidido por uma sucessão de populistas e amargou por 21 anos uma ditadura militar que o atual presidente afirma jamais ter existido. O último ditador, que apreciava mais o cheiro dos cavalos que o do povo, pressionado por movimentos pró-diretas comandados por líderes políticos como Tronqueto Merdes e Ulyxo Cagalhões, deu início a um tortuoso processo de abertura. Mas não só deixou claro Bostil ainda teria saudades dele como se recusou a passar a faixa presidencial a José Sarnento, vice de Tronqueto — o primeiro presidente civil pós-ditadura eleito indiretamente (para evitar que o populacho fizesse merda), mas que esticou as canelas antes de tomar posse.

Durante a gestão do Sarnento-de-Bigode-e-Jaquetão, foi promulgada uma Constituição — a sétima da história de Bostil — que instituiu um formidável festival de bondades, mas se esqueceu de apontar quem bancaria a farra. E foi então que o sonho começou a virar pesadelo.

Sucedeu-lhe no cargo o primeiro presidente efetivamente eleito pelo valoroso voto popular na "nova república". Dois anos depois, denunciado por corrupção e ciente de que seria inexoravelmente penabundado, o escroque renunciou para evitar a perda de seus direitos políticos — mas então já era tarde demais: diante da forte pressão popular, o Congresso cassou-o mesmo assim... e, acredite se quiser, anos depois esse sacripanta foi eleito senador da república. Quem não está acostumado estranha, mas vai por mim: absolutamente tudo pode acontecer em Bostil.

Seguiu-se um governo de transição comandado pelo prosaico Lindomar Frango, e os bons resultados no combate à hiperinflação que campeava solta havia décadas levaram os bostileiros a eleger presidente seu ministro do fazenda, o grão-duque do partido "Rei na Barriga".

Devido à inenarrável soberba da legenda (curiosamente emblemada por um tucano), sucederam a seu governo 13 anos e fumaça da mais inacreditável roubalheira, então sob o comando do "Partido dos Camarões" (assim chamado porque seus integrantes e apoiadores não só são "vermelhos" e têm os intestinos na cabeça). Como não há bem que sempre dure nem mal que nunca termine — mesmo nesse rincões da galáxia —, a sucessora do primeiro presidente Camarão, indicada para manter quente a poltrona presidencial enquanto seu padrinho político e mentor cumpria o intervalo constitucional de 4 anos após o qual poderia voltar a se candidatar ao posto, foi picada pela mosca azul (lá também tem mosca azul), fez um pacto com o diabo para se reeleger, mas acabou penabundada antes de concluir seu segundo mandato (ainda pior do que o primeiro).

Como consequência, durante dois anos e fumaça os bostileiros foram assombrados por um vampiro (vampiros existem nesse mundo paralelo, e não só em Bostil, mas em todo o planeta Lodo). Hoje, até onde se sabe, o país é comandado por Javir Bostonardo, um inconsequente saudosista da ditadura militar (por incrível que pareça, coisas assim acontecem por lá), mas isso já é assunto para o próximo capítulo, que pretendo publicar depois de amanhã. Até lá.

sexta-feira, 27 de setembro de 2019

A CORRUPÇÃO INSTITUCIONALIZADA E A APROVAÇÃO DE AUGUSTO ARAS




ATUALIZAÇÃO: Não tive como acompanhar integralmente o lamentável espetáculo circense protagonizado pelo pleno do STF na tarde de ontem, mas vi o suficiente para me dar conta de que não perdi grande coisa. No final, o supremo conciliador adiou a sessão, dada a importância do voto de todos os ministros (não sei se anjinho barroco primo de Collor não participou da função ou teve de sair mais cedo, como, aliás, já fez em outros julgamentos importantes).

Dos trechos reprisados pelos telejornais, ficou claro que o alinhamento entre os ministros Fachin, Fux Barroso não bastou para neutralizar a ação perversa do trio calafrio, ora reforçado por Cármen Lucia e Alexandre de Moraes (o ex-advogado do PCC que até lustrou a calva para proferir um voto ainda mais brilhante). E um aparte da única membra egressa da magistratura me levou a lucubrar se não teria sido inspirado nessa senhora o dito popular segundo o qual "em barriga de criança e cabeça de juiz não se pode confiar".

Observação: Saliento que não se trata de enxovalhar magistrados que julgam em desacordo com minhas convicções e enaltecer quem decide a favor, mas sim de repudiar enfaticamente o nítido propósito da banda podre de libertar Lula, o sórdido, e voltar o tempo até a era pré-lava-jato, quando poderosos roubavam livre, impune e descaradamente.

Nos jornais da noite, analistas, juristas e palpiteiros de plantão emitiram pareceres tão contraditórios que eu achei prudente esperar a poeira baixar para avaliar as dimensões do estrago e especular o que nos reserva a sessão da próxima quarta-feira. Não obstante, pareceu-me claro que a banda garantista dos togados supremos (ou banda podre, se preferirem) continua pavimentando a estrada dos tijolos vermelhos. Também ficou claro que os magníficos do Circo Marambaia preferem usurpar as funções dos congressistas e legislar, em vez de, como lhes caberia fazer, simplesmente interpretar a Constituição.

Dias atrás, sonhei que fortes lufadas de vento sopraram as chamas das queimadas na Amazônia legal até o DF, carbonizando o Congresso, a Praça dos Três Poderes, o STF, o Palácio do Planalto e adjacências — e numa quarta-feira, ainda por cima, quando o circo supremo está armado e os parlamentares se dignam de aparecer na Câmara e no Senado. Quando acordei, achei que fosse um pesadelo. Agora, porém, acho que foi mais um sonho que não se realizou. Enfim, bola pra frente.   

Num país que arrecada anualmente quase 3 trilhões em impostos, faltar dinheiro até para o giz das escolas públicas e a gaze das unidades do SUS seria um mistério digno das histórias de Sherlock Holmes, não o fato de ser público e notório que a rapinagem do Erário, institucionalizada para perpetuar o lulopetralhismo no poder, seja de causar inveja aos 40 ladrões da história de Ali Babá.

Mas a roubalheira nem sempre é sub-reptícia: deputados federais e senadores trabalham 3 dias por semana e ganham mais de R$ 100 mil por mês (somando os gordos salários às malandragens disfarçadas de “auxílios” ou “verbas adicionais”). Enquanto isso, na outra ponta da corda, boa parte da população que ainda tem emprego e recebe salário mínimo (R$ 998) não conseguiria juntar R$ 100 mil numa única vida, mesmo que trabalhasse 7 dias por semana em dois empregos.

Graças ao ritmo indolente dos parlamentares e às picuinhas de certo senador amapaense que acontece de ser o presidente do Senado, a reforma da Previdência vai consumir um ano legislativo inteiro até ser aprovada, de onde se conclui que a semana de três dias, no Congresso, não é uma questão trabalhista, mas um caso de polícia — e como tal deve ser tratado.

Dito isso, voltemos o foco para a aprovação de Augusto Aras, começando por dizer que o resultado da sabatina foi surpreendente, na medida em que apenas 10 dos 78 senadores que se dignaram de votar não sucumbiram ao canto da sereia, ou melhor, do bagre ensaboado travestido de procurador, que, segundo o próprio, agirá com total independência (e poderia fazê-lo se quisesse, pois tem emprego garantido pelos próximos dois anos). Porém, colocando a coisa em perspectiva, nota-se que a maioria dos senadores que o aprovou Aras fê-lo para destilar potes de fel contra o Ministério Público, a Lava-Jato, o Judiciário em geral e o STF em especial.

Não se conhece o teor das conversas reservadas que o então candidato a PGR manteve com 74 senadores durante o périplo de beija-mão, nem tampouco o que ele prometeu a Bolsonaro nos vários encontros que tiveram a portas fechadas, antes de depois da indicação. Mas ficou claro, durante a sabatina, que Aras parecia pisar em ovos, tamanho o cuidado de dizer exatamente o que suas excelências queriam ouvir. Suas ponderações, contra ou a favor fosse do que fosse, sempre continham um "mas", um "porém", um "entretanto" ou outra conjunção adversativa, depois da qual vinha inevitavelmente o contraponto. Segundo Josias de Souza, o sabatinado foi tão escorregadio que deu a impressão de ser a favor de tudo ou absolutamente contra qualquer outra coisa, desde que o Senado avalizasse sua indicação.

JFK dizia que a fórmula do fracasso é tentar agradar a todos ao mesmo tempo. Mas o presidente americano não conhecia nosso novo procurador-geral — que José Nêumanne alcunhou de "ensaboador-geral", num trocadilho inspirado no ex-procurador Geraldo Brindeiro, que ganhou o apelido nada enaltecedor de "engavetador-geral" (cuja obviedade dispensa explicações).

Aras compareceu à CCJ do Senado imbuído da certeza de que jogava um jogo jogado e, para não estragar o placar, adotou um timbre ensaiado. Observou-se durante a sabatina uma cena inusitada: Renan Calheiros fez rasgados elogios à indicação feita por Jair Bolsonaro. Como também é público e notório, o abigeatário senador alagoano é freguês de caderneta da Lava-Jato e convive no Senado com Flávio Bolsonaro, investigado pelo MP/RJ por suspeita de peculato e lavagem de dinheiro, e interessa a ambos aplicar um sedativo no aparato investigatório do Estado.

Resta torcer para que Aras perceba que, uma vez aprovado, não deve satisfações a ninguém, exceto à Constituição e à sociedade brasileira. Isso, porém, só sua atuação à frente da PGR poderá responder.

segunda-feira, 16 de setembro de 2019

CRISE? QUE CRISE?



Enquanto falta dinheiro para comprar giz para as escolas e gaze para os hospitais — e Bolsonaro sugere espaçar as idas ao banheiro para economizar papel higiênico —, nossos colossos togados confundem recursos protelatórios e chicanas com o pleno direito de defesa que assiste aos réus. Como se não bastasse, os doutos decisores decidem em flagrante desacordo com os interessas da sociedade e, entre uma sessão e outra, banqueteiam-se, a expensas do Erário, com lagosta na manteiga queimada, bacalhau à Gomes de Sá, frigideira de siri, moqueca, arroz de pato, carré de cordeiro, medalhões e “tournedos de filé”. Tudo regado a uísques e vinhos importados e premiados, naturalmente.

Escusado repetir (mais uma vez) por que considero a atual composição do STF a pior de toda a história. A quem interessar possa, esta postagem e a subsequente dão uma boa ideia da suprema agonia, e mais dois textos — igualmente ilustrativos — as complementam (tome uma dose cavalar de Plasil e clique aqui e aqui degustá-los). Mas não posso me furtar a relembrar que, graças ao folclórico "nós contra eles" de Lula e seu bando, a cizânia dividiu a sociedade e se espalhou como metástase pela alta cúpula do Judiciário, transformando o Brasil na única democracia do mundo formada por 13 poderes: o Executivo, o Legislativo e os 11 ministros supremos, que agem como se cada qual fosse dono da verdade e de seu próprio tribunal.

A divisão em alas "garantista" e "punitivista" azedou o relacionamento entre os togados supremos. Como se não bastassem os embates verbais (para não dizer bate-bocas) entre Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso, dignos de cortiço de quinta categoria — num deles, Barroso acusou Mendes (e não se razão, mas isso já é outra conversa) de ser “uma pessoa horrível, uma mistura do mal com atraso e pitadas de psicopatia” —, agora o presidente e o vice-presidente da corte quase não se falam.

Toffoli integra a ala "garantista", que defende a impunidade a pretexto de resguardar o direito dos réus; Fux, a dos "punitivistas", favorável ao cumprimento antecipado da pena em nome do combate à impunidade. Segundo matéria publicada na revista Época, os membros desse grupo são chamados pejorativamente pelos do outro time de "iluministas". O relacionamento entre os dois está a tal ponto estremecido que não houve, durante o último recesso, a tradicional divisão do plantão: o presidente dos togados preferiu ficar ele próprio responsável por todas as decisões urgentes do período, inclusive aquela em que, a pretexto de proteger Flávio Bolsonaro, sobrestou todos os demais processos baseados em dados compartilhados pelos órgãos de fiscalização e controle sem autorização judicial.

Não se espera que um juiz — qualquer juiz — decida visando agradar a gregos e troianos, mas que julgue em conformidade com a legislação vigente. Por outro lado, a intenção do legislador nem sempre está expressa de forma clara e na letra fria da lei, daí os magistrados se valerem da "hermenêutica" termo que o jargão jurídico emprestou do religioso para definir a interpretação dos textos legais à luz do "espírito" da lei, ou seja, visando inferir o alcance das intenções do legislador.

Interpretar a lei não significa legislar, como deveriam saber os togados supremos — e muitos de seus pupilos nas instâncias inferiores — que parecem achar que, se limites existem, é para que sejam ultrapassados. Agem como se dirigissem em alta velocidade, imbuídos da certeza de que nenhum policial rodoviário se atreveria a multá-los; afinal, eles são supremos, inatingíveis, incontestáveis, irretorquíveis e incriticáveis.

Quiseram os constituintes de 1988 que coubesse ao supremo o direito de errar por último, e à plebe ignara, que paga os altos salários e banca suas escandalosas mordomias dos decisores, o papel de ovelha de presépio.

Como quase tudo mais neste mundo, a política funciona como uma via de mão dupla. Em junho, um pacto institucional celebrado entre os chefes dos Poderes impediu a queda do castelo de cartas tupiniquim. Bolsonaro correu risco real de ser apeado da Presidência, do que se pode inferir que nem todas as conspirações palacianas são fruto da paranoia e da imaginação fértil do capitão e seus pimpolhos.

Observação: Em entrevista a VEJA, o ministro Dias Toffoli confirmou que o Brasil esteve à beira de uma crise institucional entre os meses de abril e maio, e disse que sua atuação foi fundamental para pôr panos quentes numa insatisfação que se avolumava. A combinação explosiva envolvia setores político e empresarial e militares próximos a Bolsonaro. No Congresso, a reforma da Previdência não avançava, e o Executivo acusava os deputados de querer trocar votos por cargos e verbas públicas. O impasse aumentou quando um grupo de parlamentares resolveu desengavetar um projeto que previa a implantação do parlamentarismo — se aprovado, Bolsonaro se tornaria uma figura decorativa, um presidente sem poder (ou um "banana", nas palavras do próprio presidente).

Mas não existe almoço grátis: o pacto conteve a insurreição, mas tornou nosso indômito presidente refém da nova agenda política, cujo objetivo é travar a Lava-Jato e seus desdobramentos. Mutatis mutandis, o mesmo se deu quando Temer comprou o apoio das marafonas do Câmara para se escudar das "flechadas" do ex-PGR Rodrigo Janot. Por uma via, o vampiro do Jaburu se segurou no palácio; por outra, tornou-se um presidente "pato-manco" — ou "lame duck", que é como os americanos se referem a políticos terminam o mandato tão desgastados que os garçons palacianos demonstram seu desprezo servindo-lhes o café frio. E foi parar na cadeia poucos meses depois de descer a rampa do Planalto.

É, a vida tem dessas coisas.

domingo, 1 de setembro de 2019

ACHARAM O QUEIROZ — MAS E DAÍ?


Depois de semanas a fio publicando "notícias de interesse público" — como a diarreia da vaza-jato e fofocas sobre a avó traficante e a mãe falsária da primeira-dama —, a revista VEJA pôs seus jornalistas investigativos no encalço de Fabrício Queiroz... e não é que achou o sujeito?

Queiroz, como se sabe, tem laços de amizade com a família Bolsonaro desde os anos 1980, quando conheceu o hoje presidente no serviço militar da Brigada de Infantaria Paraquedista, no Rio, e, além de ser policial militar aposentado, trabalhou como assessor parlamentar e motorista do então deputado estadual e hoje senador Flávio Bolsonaro. Mas o que mais lhe abrilhanta o currículo é sua extraordinária capacidade de desaparecer sem deixar rastros (de dar inveja a Harry Houdini, David Copperfield, Chris Angel e outros mestres no métier).

A reportagem publicada na edição impressa de VEJA desta semana dá conta de que o abantesma mora atualmente no bairro do Morumbi (zona sul da capital paulista), próximo do Hospital Israelita Albert Einstein (um dos mais conceituados e caros nosocômios tupiniquins), onde ficou internado por uma semana, no final de 2018, para remover um tumor maligno do intestino. As despesas com honorários médicos e hotelaria hospitalar custaram R$ 133600, que Queiroz pagou em dinheiro vivo, nota em cima de nota.

A internação se deu semanas depois que a imprensa noticiou que o Coaf identificara movimentações suspeitas de R$ 1,2 milhão de na conta bancária do avejão, supostamente provenientes de "rachadinha" — prática mediante a qual os políticos engordam os próprios salários garfando parte da remuneração dos funcionários de seus gabinetes, e ainda que essa maracutaia seja considerada pelo catecismo político como um simples pecado venial, isso não a torna menos lícita nem moralmente aceitável (para mais detalhes sobre o imbróglio Flávio-Queiroz, releia esta postagem). O mesmo relatório do COAF que colocou invisível sob as luzes da ribalta lista “transações atípicas” de 75 assessores de 20 deputados de partidos como PT, PSC e PSOL, que somam R$ 207 milhões.

Observação: Quando administrava o gabinete de zero um na Alerj, o fantasminha camarada emplacou duas filhas e a mulher em cargos comissionados, com salários entre R$ 9,8 mil e R$ 12 mil. Uma das filhas conciliava a profissão de personal trainer com as atividades de gabinete. Como estas preveem jornada semanal de 40 horas, não é difícil concluir que o pedágio envolveria salários de funcionários-fantasma, que sequer apareciam para trabalhar, mas cujos proventos engordavam o caixa administrado por Queiroz.

No final da tarde do último dia 26, a equipe de VEJA flagrou o Gasparzinho, de quem não se tinha notícia desde janeiro, tomando café na lanchonete do hospital. Segundo a reportagem, ele luta contra o mesmo câncer no intestino que o levou para a mesa de cirurgia pouco antes de as notícias sobre as apurações do Coaf serem publicadas pela imprensa.

Vale lembrar que tanto o Ghost quanto a mulher e as filhas não atenderam diversas convocações do MP/RJ para prestar esclarecimentos, a exemplo do hoje senador Flávio Bolsonaro. De lá para cá, tanto o ex-assessor quanto o hoje senador deram entrevistas a emissoras "simpatizantes", mas suas desculpas esfarrapadas não convenceram.  

Queiroz atribuiu o dinheiro a lucros provenientes da venda de carros usados, depois admitiu que recolhia parte dos salários dos funcionários do gabinete de zero um "para contratar mais gente para a equipe do chefe, mas sem conhecimento do próprio". Zero um, por sua vez, primeiro afirmou que não era elo o investigado e que cabia a Queiroz se explicar ao MP-RJ, mas, ad cautelam, seus advogados alegaram em juízo que as investigações atraíam a competência do Supremo.

Observação: Para explicar 48 depósitos no valor de R$ 2 mil cada um, Flávio Bolsonaro disse que o dinheiro era parte do sinal que recebeu pela venda de um apartamento — aliás, sobre outra movimentação considerada suspeita pelo Coaf, no valor de R$ 1.016.839 e referente a um título bancário da Caixa Econômica, ele alegou tratar-se do pagamento de um empréstimo tomado para a compra, na planta, do tal apartamento —, e que usou o caixa de autoatendimento da Alerj para escapar de filas e evitar que o dinheiro fosse contado na frente de várias pessoas. Uma sábia decisão; afinal, a segurança pública no Rio de Janeiro é aquela que sabemos. Acontece, porém, que o Banco Central exige informações quando o valor de um depósito em espécie ultrapassa R$ 50 mil, e no banco onde o senador eleito tem conta o preenchimento do formulário é exigido em depósitos a partir de R$ 10 mil. As conclusões ficam por conta de cada um.

O ministro Marco Aurélio negou o pedido, mas Dias Toffoli, que de uns tempos a esta parte é unha e carne com Jair Bolsonaro, valeu-se do plantão e da hermenêutica para suspender liminarmente todos os processos em que houve compartilhamento de informações fiscais e bancárias pelo Coaf sem prévia autorização judicial, livrando a cara de zero um, de Queiroz, do próprio Toffoli, de Gilmar Mendes e de suas respectivas caras-metades, que também estavam no radar da Receita Federal.

A decisão do togado supremo que preside os demais supremos togados gerou uma teoria conspiratória (bastante plausível, por sinal) que logo ganhou a Praça dos Três Poderes: se no Rio haveria um conluio para fulminar a primeira-família da República, em Brasília haveria um acordo, envolvendo até o Supremo, para blindá-la. Toffoli, obviamente, nega a acusação, e promete levar sua decisão ao plenário do STF até novembro.


O caso Queiroz se tornou prioridade para o presidente Bolsonaro antes mesmo de ele tomar posse. Se seguisse adiante, a investigação pairaria como a espada de Dâmocles sobre sua cabeça, pondo em xeque o discurso de combate à corrupção e atrapalhando a tramitação de projetos considerados prioritários. Daí porque, no campo jurídico, era preciso impedir a condenação de zero um pela prática de rachadinha, e no político, evitar que as suspeitas fossem usadas para desgastar seu governo e obstar sua reeleição.

O presidente e seu clã se referem à cúpula dos poderes no Rio como “organização criminosa” e “quadrilha”. Desde que o caso eclodiu, aliados estão em campo para reunir informações desabonadoras sobre promotores e juízes envolvidos na investigação. Flávio jura inocência — até aí, Lula também — e diz que não sabia da movimentação financeira milionária de Queiroz (só se fosse cego, surdo ou muito burro, e ele não é nada disso), que ignorava que o então assessor retinha parte dos salários dos colegas e que não tinha ciência nem mesmo dos nomes de alguns dos funcionários de seu gabinete. Convenhamos: isso não convenceria nem mesmo a finada Velhinha de Taubaté.

Haveria muito mais a dizer, mas eu vou ficando por aqui. Este país virou um circo, e os palhaços, como sempre, somos nós, que votamos nessa caterva e pagamos impostos escorchantes para bancar salários aviltantes e mordomias nababescas de magistrados que, se esta banânia fosse mesmo um país sério, sequer poderiam atuar como juiz em pelada de várzea.

sexta-feira, 23 de agosto de 2019

AS BOLSONARICES SEGUNDO O EVANGELHO DE S. MOURÃO E OUTRAS CONSIDERAÇÕES



Fazer oposição sem oferecer contraproposta viável não é política, é mero e irresponsável exercício do espírito de porco. Mas não há como aplaudir um presidente que age como se ainda estivesse campanha, posta vídeos escatológicos nas redes sociais, deixa-se fotografar vestindo camiseta do Palmeiras e calçando chinelos de dedo e faz oposição, a si próprio e a seu governo, tecendo comentários ácidos, jocosos, impróprios, desnecessários e improdutivos.

Um presidente que, a pretexto de não compactuar com o nefasto "toma-lá-dá-cá", deixa de construir uma base aliada capaz de neutralizar os previsíveis ataques de parlamentares do PT e de seus satélites, que não sai em defesa de seu ministro e dos procuradores da Lava-Jato diante do vazamento feito por um site proselitista a partir de material obtido através de crime cibernético, com teor sujeito a distorções, manipulações e descontextualizações.

Um presidente que obstaculiza a tramitação do projeto anticrime e anticorrupção do ex-juiz Sérgio Moro — uma das bandeiras de sua campanha — para não se indispor com a banda podre do Congresso e não aumentar o risco de ver rejeitada a nomeação do filho Eduardo para embaixada do Brasil nos EUA; que intervém na política de preços da Petrobras e nos quadros da Polícia Federal, da Receita Federal e do Coaf para proteger o filho Zero Um e, no limite, para proteger a si mesmo; que atribui a organizações não governamentais a responsabilidade pelo desmatamento da Amazônia e... agora a cereja do bolo: Que, ao ser criticado por tudo isso e muito mais, defende-se dizendo que “se é para ser um banana, um poste dentro da Presidência, estou fora”.

Ficar impassível diante dessas e outras estultices bolsonarianas seria o mesmo que fazer como Nero, que cantava enquanto Roma ardia em chamas (há quem diga que ele tocava harpa, mas isso não vem ao caso). Como na fábula d'O Velho, o Menino e o Burro, o Capitão Caverna é criticado toda vez que diz, faz ou deixa de dizer ou fazer seja lá o que for, mas sua infindável fieira de asnices vem minando lhe minando a popularidade, não entre os bolsomínions, naturalmente — que, como devotos de Lula com sinal trocado, aplaudem tudo que vêm de seu amado líder —, mas entre os milhões de brasileiros que o elegeram para evitar à volta do PT ao poder.

Claro que todos têm direito a suas opiniões, e o cidadão Jair Messias Bolsonaro não é exceção. Mas ao presidente Jair Messias Bolsonaro cabe observar a liturgia do cargo. Não é admissível que ele faça na vida pública o que faz na privada (o duplo sentido foi intencional).

Ao dizer que não se aterá à listra tríplice do Ministério Público para escolher o novo PGR, Bolsonaro armou mais uma arapuca para si mesmo, e agora não sabe o que fazer com penca de candidatos e o lobby em torno deles. Nada o obriga a escolher um nome da lista, naturalmente, mas certamente haverá protestos do MPF se, para ter um procurador-geral subserviente ao Executivo, indicar alguém que não conte com o respeito da corporação.  

Ao vestir a faixa presidencial — disse Josias de Souza —, o capitão teve o vislumbre das dádivas que o mundo proporciona a alguém que passa do baixo clero parlamentar para o Planalto, e agora age como quem enfiou o dedo num favo de mel e, de repente, se visse ameaçado pela abelhas. A depender das boas intenções contidas em suas falas, o país estaria no paraíso, mas a realidade costuma estragar as coisas. Bolsonaro não foi eleito para reformar o Coaf nem intervir em órgãos de controle. Melhor faria se provasse que há um presidente da República por trás da faixa presidencial, e não será fazendo intervenções e órgãos administradores, a pretexto de não fazer papel de banana, que ele alcançará esse objetivo.

O comportamento de Bolsonaro mudou radicalmente quando as investigações apertaram o cerco em torno de Zero Um. Para defender o filho, ele fez um acordo espúrio com o STF, o Congresso e outros poderosos interessados em manter a impunidade como era antes da Lava-Jato.

Lamentavelmente, nossas leis penais foram criadas para impedir a prisão de poderosos e outros criminosos com recursos financeiros para pagar honorários milionários criminalistas especializados em encontrar brechas legais para anular provas e investigações. Sempre foi assim, e é por isso que querem acabar com a força-tarefa — que, em 5 anos, instaurou cerca de 2.500 procedimentos que produzira (até agora) 244 condenações contra 159 réus, contabilizando 2.249 anos, 4 meses e 25 dias de pena e ressarciu os cofres públicos em mais de R$ 40 bilhões. Em contrapartida, o STF levou 3 anos, dois meses e 26 dias para condenar o deputado Nelson Meurer (PP-PR), integrante da lista de Janot. A condenação imposta é de 13 anos e nove meses de prisão em regime fechado, além de pagamento de multa de R$ 322 mil, mas a Corte concedeu ao condenado o direito e aguardar em liberdade o resultado do derradeiro recurso — que até hoje o plenário não se dignou de julgar.

Durante a campanha, Bolsonaro ganhou o apoio de um eleitorado liberal que buscava ao centro a solução para livrar-se do PT ao anunciar que seu ministro da Economia seria Paulo Guedes. Eleito, fez mais um lance magistral ao convidar Sérgio Moro, símbolo do combate à corrupção, para chefiar o ministério da Justiça e Segurança Pública. Os dois superministros continuam sustentando o governo — a despeito de as relações entre Moro e Bolsonaro andarem estremecidas, dizem as más-línguas que por ciúmes, já que o subordinado com bem mais apoio da população do que seu chefe.

Dizem ainda as más-línguas que o castelo de cartas tupiniquim esteve prestes a ruir em maio, mas o pacto institucional celebrado pelos presidentes dos Três Poderes conseguiu debelar uma suposta movimentação do núcleo militar do governo, empresários insatisfeitos com a economia e políticos oportunistas para apear Bolsonaro da Presidência. Curiosamente, essa ação coincidiu com as investigações da Receita e do Coaf sobre ministros do STF, Flavio Bolsonaro e respectivas famílias. Assim, aproveitando-se do pedido da defesa de Zero Um para que o Coaf não repassasse seus dados fiscais sem autorização judicial, o presidente dos togados supremos livrou a cara do clã Bolsonaro e das famílias de membros do STF, como ele próprio e o ministro Gilmar Mendes

Como toda escolha tem consequências, Bolsonaro se tornou refém da nova agenda política, cujo objetivo é travar a Lava-Jato e seus desdobramentos — prova disso é a Câmara ter aprovado dias atrás, a toque de caixa e em votação simbólica e secreta, a lei de abuso de autoridade egressa do Senado (leia-se Renan Calheiros), que coloca barreiras legais, ou reforça as já existentes, às investigações da Lava-Jato.

A exemplo do que vem ocorrendo com o presidente não-banana e seu ministro da Justiça, também devem azedar as relações palacianas com outras corporações — como a Receita Federal, que está em pé de guerra pela tentativa do Executivo de nomear um novo responsável pelo Porto de Itaguaí, base eleitoral dos Bolsonaro e conhecido ponto de atuação de milicianos e contrabandistas. Já o vice, acusado de tentar ofuscar o titular ao palpitar sobre os mais diversos assuntos da República, passou repentinamente de loquaz a silente. 

Em recente entrevista ao Estado, o general Hamilton Mourão quebrou o silêncio para dizer que Bolsonaro decidiu “assumir o protagonismo e tratar pessoalmente da comunicação". Sobre o boquirrotismo do chefe, disse que "reclamavam que ele não falava, que fugia da imprensa, e reclama também agora que ele está falando". Perguntado sobre o alto grau de toxicidade dos pronunciamentos do presidente, relativizou: "Ele é um cara simples e direto. Não adianta esperar que ele vá tecer comparações pensando em grandes mestres da filosofia. Não. Ele não vai fazer isso. Ele vai se expressar com a linguagem dele, usando sujeito, verbo e predicado. Podem não ser as melhores palavras, mas é o jeito dele".

Enfim, a deputada federal Bia Kicis anunciou que será apresentada outra lei sobre o abuso de autoridadesem os absurdos” da que aguarda sanção presidencial. Paralelamente, associações de policiais, juízes, integrantes do Ministério Público e da Receita Federal foram convocadas pelo líder do governo, Major Vitor Hugo, para discutir como pressionar Bolsonaro a vetar a tal aberração. A ver que bicho dá.