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quinta-feira, 31 de outubro de 2019

SOBRE BOLSOSIMBA E MAIS SOBRE O DIVÓRCIO DE GUZZO E VEJA


Sobre Bolsosimba, o bolsolion das arábias, a usina de crises funciona a pleno vapor também no exterior. Se o presidente fosse eficiente assim na produção do que interessa, o Brasil seria um grande país.

O sapientíssimo ministro Marco Aurélio afirmou que o vídeo que compara o Jair Bolsonaro a um leão, e o STF, o PSL, a OAB e outras instituições, a hienas (e que foi apagado da conta do presidente no Twitter, diante da forte repercussão negativa) pode ser encarado como uma “cortina de fumaça” para desviar o foco das revelações dos áudios do ex-assessor Fabrício Queiroz, que é investigado pela prática de "rachadinha" do gabinete de Flávio Bolsonaro, a chamada "rachadinha". 

Não é lá muito convincente a justificativa de Bolsonaro de que houve um “erro” (na publicação do tal vídeo), porque o próprio capitão assume a “responsabilidade”, embora dê a entender que o filme foi veiculado sem seu aval. Ou está mentindo, ou está dizendo à nação que seu esquema de redes sociais é seara fora de controle. uma legítima casa da mãe joana, para usar de expressão vulgar ao alcance do entendimento do próprio. Assista ao clipe para mais detalhes sobre mais esse episódio surreal em nossa bizarra republiqueta da Bananas:



Enquanto essa polêmica absurda e fora de hora sobre a analogia infeliz feita pelo mito, assoma no horizonte mais um imbróglio com potencial para causar mais frisson (como dizia o saudoso Ricardo Boechat, morre-se de tudo no jornalismo, menos de tédio) e nos levar a amaldiçoar (mais uma vez) Lula e o PT por nos forçar a "escolher" esse toco para amarrar nosso bode. 

Deve-se essa nova crise às relações perigosas da família Bolsonaro com milicianos. Para evitar que uma dificuldade aparentemente pequena se torne crítica e passe a influenciar o rumo do governo, o presidente precisaria acender a luz de casa, aconselha Josias de Souza. Mas, numa transmissão ao vivo pelas redes sociais, o mito ficou fora de si. A irritação compromete seu discernimento e o impede de ver que o nome da crise não é imprensa, e sim família Bolsonaro. Mas vamos por partes.

Deu no Jornal Nacional da última terça-feira que o nome do presidente foi suscitado na (interminável) investigação da morte da vereadora psolista Marielle Franco. Segundo o noticioso da Globo, a polícia do Rio descobriu que o suspeito Élcio de Queiroz entrou no condomínio Vivendas da Barra, no dia em que a parlamentar foi assassinada, alegando que visitaria (o então deputado) Jair Bolsonaro, quando na verdade foi encontrar com, Ronnie Lessa, também suspeito de ter participado do crime.

Após a veiculação da reportagem, o capitão afirmou que tem presença registrada no painel de votações da Câmara dos Deputados não só no dia 14 de março, mas também nos dias anteriores e posteriores ao do caso citado pelo porteiro à polícia (de fato, registros da Câmara acusam sua presença em duas votações no plenário no dia do crime, uma às 14h e outra às 20h30). Também negou a versão do porteiro e reiterou que não conhece os acusados pela morte da vereadora. Disse que o depoimento foi forjado em uma tentativa de atingi-lo, que se trata de uma fraude, uma farsa para atacar a imagem e a reputação do presidente da República. Sua defesa levanta, inclusive, a hipótese de que a pessoa que afirmou ter ido procurar Jair Bolsonaro o tenha dito com intuito de incriminar o presidente da República.

MP-RJ consultou Dias Toffoli — o diplomata da injustiça — para saber se pode prosseguir com as investigações — vale lembrar que, segundo o § 4º do artigo 86 da Constituição, "o Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções"  (o grifo é meu).

Atualização: O ministro da Justiça pediu à PGR a abertura de inquérito para apurar “todas as circunstâncias” da citação do nome de Bolsonaro nas investigações do assassinato da vereadora psolista (ocorrido há exatos 597 dias). Na edição de ontem, o JN noticiou que Élcio Queiroz esteve na casa de Ronnie Lessa, embora tenha anunciado ao porteiro que iria à casa de Bolsonaro e de o funcionário ter dito que “seu Jair” autorizou sua entrada. Também na noite de ontem o capitão reafirmou numa live que os registros no painel de votação da Câmara comprovam sua presença em Brasília no dia em questão e especulou sobre os motivos que podem ter levado o porteiro a citar o seu nome em depoimento: "Ou o porteiro mentiu, ou foi induzido a cometer um falso testemunho, ou escreveram algo no inquérito que o porteiro não leu e assinou embaixo". O vice-presidente, general Hamilton Mourão, disse considerar o depoimento do porteiro "muito fraco", mas que seria leviano dizer que o objetivo é atingir a pessoa do presidente, embora seja essa a impressão que se tem. Ouça mais sobre mais esse furdunço em https://soundcloud.com/jose-neumanne-pinto/neumanne-301019-direto-ao-assunto 

Enfim, a novidade chega num instante em que Fabrício Queiroz, um policial militar que trabalhou com os Bolsonaro, envia pelo WhatsApp sinais de que se considera abandonado. O ex-assessor de Zero Um na Alerj ainda não forneceu ao MP-RJ uma explicação que fique em pé sobre suas movimentações financeiras. Amigo de Queiroz, o ex-capitão Adriano Magalhães da Nóbrega, da PM do Rio, teve a mãe e a mulher pendurados na folha salarial do gabinete de Flávio Bolsonaro. Apelidado de "Caveira", o oficial Adriano foi expulso da corporação. Comandava uma milícia em Rio das Pedras. Está foragido.

É contra esse pano de fundo que a polícia civil do Rio encosta na biografia de Bolsonaro um letreiro de neon com o nome de Marielle. A novidade mistura-se aos passivos que não saem das manchetes. Acusado de peculato e lavagem de dinheiro, Zero Um percorre os corredores do Senado como se nada tivesse sido descoberto sobre ele. Duplamente blindado pelo Supremo — por uma liminar de Dias Toffoli e outra de Gilmar Mendes —, o ora senador toma distância de Queiroz: "Não falo com ele há quase um ano". Bolsonaro ecoa o filho. 

Afora os crimes de peculato e lavagem de dinheiro atribuídos a Flávio Bolsonaro e a rachadinha administrada por Queiroz, o MP-RJ esquadrinha a folha do gabinete de Zero Dois na Câmara Municipal do Rio. Recolheram-se indícios de que funcionava ali outro ninho de ilegalidades funcionais. Num ambiente assim, presidente que se queixa da imprensa soa como capitão de navio que reclama da existência do mar. Só Bolsonaro sabe o tamanho real do buraco em que ele e sua família estão metidos. 

Toda crise tem um custo. Bolsonaro precisa decidir quanto deseja pagar. A fatura vai aumentando com o tempo. Em tese, ele ainda dispõe de três anos e dois meses de governo. Não há blindagem que dure tanto tempo. Melhor acender a luz, nem que seja num dos cômodos: o quarto das crianças.

Sobre o "divórcio" mencionado no título, segue a transcrição do texto autoexplicativo que J.R. Guzzo postou na casa nova:

Desde o último dia 15 não sou mais colaborador da revista “Veja”, na qual entrei em 1968, quando da sua fundação, e onde mantinha uma coluna quinzenal desde fevereiro de 2008. A primeira foi publicada na edição de 13/02/2008. A partir daí a coluna não deixou de sair em nenhuma das quinzenas para as quais estava programada.

Na última edição, com data de 16/10/19, a revista decidiu não publicar a coluna que eu havia escrito. O artigo era sobre o STF, e sustentava, como ponto central, que só o calendário poderia melhorar a qualidade do tribunal — já que, com a passagem do tempo, cada um dos 11 ministros completaria os 75 anos de idade e teria de ir para casa.

Supondo-se que será impossível nomear ministros piores que os destinados a sair nos próximos três ou quatro anos, a coluna chegava à conclusão que o STF tende a melhorar.

A liberdade de imprensa tem duas mãos. Em uma delas, qualquer cidadão é livre para escrever o que quiser. Na outra, nenhum veículo tem a obrigação de publicar o que não quer.

Ao recusar a publicação da coluna mencionada acima, “Veja” exerceu o seu direito de não levar a público algo que não quer ver impresso em suas páginas. A partir daí, em todo caso, o prosseguimento da colaboração ficou inviável.

Ouvimos, desde crianças, que não há bem que sempre dure, nem mal que nunca se acabe.

Espero que esta coluna tenha sido um bem que não durou, e não um mal que enfim acabou. Muito obrigado.

segunda-feira, 21 de outubro de 2019

O SUPREMO SUSPENSE E O TEXTO DE J.R. GUZZO QUE A REVISTA VEJA NÃO QUIS PUBLICAR



A FILA ANDA… — O TEXTO DE J.R. GUZZO QUE A REVISTA VEJA NÃO QUIS PUBLICAR

Conforme eu compartilhei em minha página no Facebook, o jornalista J.R. Guzzo — integrante do conselho de administração do grupo Abril e colunista das revistas Exame e Veja —, por quem eu tenho a maior admiração, deixou Veja depois que a revista rejeitou a matéria que ele escreveu para publicar em sua coluna desta semana.

Guzzo e Roberto Pompeu de Toledo se revezavam na página final da Veja, e sua coluna, assim como a de Dora Kramer, é para mim o último bastião e a única razão de continuar lendo a revista, que assino há mais de uma década. Ou assinava, já que resolvi não renovar a assinatura quando sua equipe editorial se aliou à Folha, à BandNews et caterva para divulgar de maneira sensacionalista o material que o site panfletário The Intercept Brasil obteve de criminosos e vem vazando a conta-gotas, a pretexto uma pseudo cruzada moralizadora contra o ex-juiz Sérgio Moro e a Lava-Jato.

Veja sempre foi implacável com os crimes cometidos por Lula e pelo PT, como comprovam dúzias de reportagens de capa publicadas ao longo das últimas décadas, sem mencionar a famosa entrevista com Pedro Collor, em 1992, que foi determinante para o impeachment do ex-caçador de marajás de araque. Agora, a exemplo de certo togado supremo em relação à prisão em segunda instância e de certo presidente desta Banânia em relação a suas promessas de campanha de acabar com a reeleição e de dar carta branca ao ministro da Justiça e Segurança Pública no combate à corrupção, a revista virou a casaca.

Deixo claro que minha decisão nada tem a ver com revanchismo barato nem a descabida pretensão de alinhar o viés editorial do que leio às minhas convicções político-partidárias. Apenas me recuso a continuar prestigiando quem resolveu compactuar com o desserviço que Verdevaldo das Couves vem prestando ao país ao atacar de maneira leviana a maior operação anticrime e anticorrupção da história e denegrir a imagem do ex-juiz e dos procuradores que a simbolizam.

Se é esse o "novo projeto jornalístico de Veja", eu passo. E prevejo um debandar geral de assinantes. Esquerdistas de carteirinha e quem mais bebe as palavras emanadas do site oficial do PT e do igualmente abjeto Brasil 247 de Leonardo Attuch, e da revista Carta Capital de Mino Carta, para ficar nos exemplos mais emblemáticos. Esses certamente não comprarão Veja, pois não tem por que consumi requentada, em segunda-mão, nos pratos sujos do pseudo "jornalismo isento e independente" da moribunda Veja, toda essa merda sectária e fanática e sectária. Aliás, rima com "moribunda" o que se poderia limpar com as páginas daquela que um dia foi melhor revista semanal do Brasil, não fosse o fato se o papel em que ela é impressa não ser absorvente.

Dito isso, transcrevo o texto de Guzzo que Veja se recusou a publicar e, na sequência, a posto a matéria que havia programado para hoje.
   
Um dos grandes amigos do Brasil e dos brasileiros de hoje é o calendário. Só ele, e mais nenhum outro instrumento à disposição da República, pode resolver um problema que jamais deveria ter se transformado em problema, pois sua função é justamente resolver problemas — o Supremo Tribunal Federal. O STF deu um cavalo de pau nos seus deveres e, com isso, conseguiu promover a si próprio à condição de calamidade pública, como essas que são trazidas por enchentes, vendavais ou terremotos de primeira linha.

Aberrações malignas da natureza, como todo mundo sabe, podem ser resolvidas pela ação do Corpo de Bombeiros e demais serviços de salvamento. Mas o STF é outro bicho. Ali a chuva não para de cair, o vento não para de soprar e a terra não para de tremer – não enquanto os indivíduos que fabricam essas desgraças continuarem em ação.

Eles são os onze ministros que formam a nossa “corte suprema”, e não podem ser demitidos nunca de seus cargos, nem que matem, fritem e comam a própria mãe no plenário. Só há uma maneira da população se livrar legalmente deles: esperar que completem 75 anos de idade. Aí, em compensação, não podem ser salvos nem por seus próprios decretos. Têm de ir embora, no ato, e não podem voltar nunca mais. Glória a Deus.

Demora? Demora, sem dúvida, e muita coisa realmente ruim pode acontecer enquanto o tempo não passa, mas há duas considerações básicas a se fazer antes de abandonar a alma ao desespero a cada vez que se reúne a apavorante “Segunda Turma” do STF — o símbolo, hoje, da maioria de ministros que transformou o Supremo, possivelmente, no pior tribunal superior em funcionamento em todo o mundo civilizado e em toda a nossa história.

A primeira consideração é que não se pode eliminar o STF sem um golpe de Estado, e isso não é uma opção válida dos pontos de vista político, moral ou prático. A segunda é que o calendário não para. Anda na base das 24 horas a cada dia e dos 365 dias a cada ano, é verdade, mas não há força neste mundo capaz de impedir que ele continue a andar. Levará embora para sempre, um dia, Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski. Antes deles, já em novembro do ano que vem e em julho de 2021, irão para casa Celso de Mello e Marco Aurélio — será a maior contribuição que terão dado ao país desde sua entrada no serviço público, como acontecerá no caso dos colegas citados acima. E assim, um por um, todos irão embora — os bons, os ruins e os horríveis.

Faz diferença, é claro. Só os dois que irão para a rua a curto prazo já ajudam a mudar o equilíbrio aritmético entre o pouco de bom e o muitíssimo de ruim que existe hoje no tribunal. Como é praticamente impossível que sejam nomeados dois ministros piores do que eles, o resultado é uma soma no polo positivo e uma subtração no polo negativo — o que vai acabar influindo na formação da maioria nas votações em plenário e nas “turmas”.

Com mais algum tempo, em maio de 2023, o Brasil se livra de Lewandowski. A menos que o presidente da época seja Lula, ou coisa parecida, o ministro a ser nomeado para seu lugar tende a ser o seu exato contrário — e o STF, enfim, estará com uma cara bem diferente da que tem hoje.

O fato, em suma, é que o calendário não perdoa. O ministro Gilmar Mendes pode, por exemplo, proibir que o filho do presidente da República seja investigado criminalmente, ou que provas ilegais, obtidas através da prática de crime, sejam válidas numa corte de justiça. Mas não pode obrigar ninguém a fazer aniversário por ele. Gilmar e os seus colegas podem rasgar a Constituição todos os dias, mas não podem fugir da velhice.

O Brasil que vem aí à frente, por esse único fato, será um país melhor. Se você tem menos de 25 ou 30 anos de idade, pode ter certeza de que vai viver numa sociedade com outro conceito do que é justiça. Não estará sujeito, como acontece hoje, à ditadura de um STF que inventa leis, censura órgãos de imprensa e assina despachos em favor de seus próprios membros.

Se tiver mais do que isso, ainda pode pegar um bom período longe do pesadelo de insegurança, desordem e injustiça que existe hoje. Só não há jeito, mesmo, para quem já está na sala de espera da vida, aguardando a chamada para o último voo.

Para estes, paciência. (Poderiam contar, no papel, com o Senado — o único instrumento capaz de encurtar a espera, já que só ele tem o poder de decretar o impeachment de ministros do STF, mas isso não vai acontecer nunca; o Senado brasileiro é algo geneticamente programado para fazer o mal).
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Retomando a conversa do ponto onde paremos na postagem anterior, em fevereiro de 2016 o plenário do Supremo igualou o Brasil aos países desenvolvidos e decidiu pelo início do cumprimento da pena criminal após a decisão condenatória de tribunal em segunda instância (HC 126.292, relator ministro Teori Zavascki). Entendeu a maioria que o início da execução da pena não fere o princípio da presunção de inocência, pois no julgamento da apelação faz-se o completo reexame dos fatos e provas, garantindo o direito ao duplo grau de jurisdição previsto na Convenção Americana de Direitos Humanos.

Às instâncias superiores (STJ e STF) cabe apenas apreciar questões de Direito, sem análise das provas. À primeira poderão ser arguidas eventuais ofensas à legislação e à segunda, matérias constitucionais cuja relevância transcenda os interesses particulares da causa. Assim, a condenação em segunda instância esgota a presunção de inocência, e como o recurso sobre matéria de Direito não tem efeito suspensivo, é razoável o início do cumprimento da pena criminal pelo condenado.

Excepcionalmente, em casos de flagrante afronta à jurisprudência do STJ e do STF ou de manifestos erros e constrangimentos ilegais — que poderão ensejar a anulação do processo ou a absolvição do réu — será cabível medida cautelar para suspender a execução da pena ou, ainda, a impetração de habeas corpus, que tem trâmite mais célere. Trata-se, todavia, de exceções, conforme pesquisas de coordenadorias de gestão do STJ e do STF, divulgadas pelo ministro Roberto Barroso (O Globo, 2/2/2018 e 5/4/2018). No STJ, entre setembro de 2015 e agosto de 2017, a Corte reverteu apenas 0,62% das condenações em segunda instância. No STF, no período de janeiro de 2009 a abril de 2016, as absolvições corresponderam a menos de 0,1% dos recursos.

Em 2016, como referido, o STF reverteu posição firmada em 2009, quando a maioria conferiu caráter absoluto ao princípio da presunção de inocência e admitiu o início do cumprimento da pena criminal somente após o julgamento de recursos pendentes no STJ e no STF (HC 84.078). Essa posição era atípica no plano internacional, não tinha coerência com o sistema normativo e a organização da Justiça estabelecidos pela Constituição, tinha impacto estatisticamente irrelevante no resguardo da liberdade de réus inocentes e ignorava que penas decorrentes de condenações com ilegalidade manifesta podem sempre ser remediadas por meios excepcionais. Mas o mais importante é que permitia que os processos perdurassem por longo tempo nas instâncias superiores e motivassem a interposição de sucessivos recursos internos, favorecendo a ocorrência significativa da prescrição de ações penais.

Nas mencionadas pesquisas, no período de setembro de 2015 a agosto de 2017, verificou-se que 830 ações penais prescreveram no STJ e 116 no STF. A referida posição favorecia a não punição expressiva de condenados, em prejuízo da efetividade do dever de punir do Estado. A proteção da liberdade individual não pode ser realizada a ponto de comprometer a finalidade e a efetividade da ordem jurídica na prevenção e repressão de condutas danosas à convivência humana. A prisão somente após trânsito em julgado favorece até mesmo a não punição de crimes contra a ordem econômica e a administração pública, o que, consequentemente, acaba por incentivar a perpetuação dos delitos de corrupção. Isso contribui para a perda de confiança da população no próprio Direito e no Poder Judiciário, desestimulando o respeito à lei e às instituições públicas, que passam a ser vistas como seletivas e complacentes com privilégios oligárquicos.

A dignidade humana só é verdadeiramente respeitada num Estado Democrático de Direito quando a lei é seguida e cumprida de forma isonômica e proporcional, de modo a contribuir para a responsabilização de quem descumpre seus deveres e abusa de sua liberdade, assegurando-se o bem comum e a legitimidade da ordem jurídica. E, mais grave, a posição propicia fator impeditivo do desenvolvimento do País: a corrupção endêmica (cf. Índice de percepção da corrupção em 2018, Transparência Internacional). O principal incentivo ao boom de colaborações premiadas no âmbito da Operação Lava-Jato foi exatamente a posição do STF a favor do cumprimento da pena criminal após a condenação em segunda instância. Agora a matéria volta a ser analisada pelo plenário do STF, onde se discute a constitucionalidade do artigo 283 do Código de Processo Penal, cuja redação foi alterada em 2011 e se limitou a reproduzir a então posição que o STF adotou em 2009.

Esse dispositivo é inconstitucional, pelos motivos já expostos: o princípio da presunção de inocência não tem caráter absoluto e não pode tornar inviável a efetivação razoável do dever de punir do Estado, a ponto de enfraquecer a legitimidade da ordem jurídica. O exemplo da corrupção, dentre os graves crimes que não podem ficar sem pena, é bastante significativo: o Brasil jamais será um país desenvolvido se não diminuir seus intoleráveis índices de corrupção, cuja não punição incentiva pactos oligárquicos contrários à maioria da população, impondo-lhe condições de vida indignas e perda de confiança nas leis e nas instituições. Portanto, espera-se que o STF cumpra o seu papel de defender a Constituição e confirme o seu entendimento de prisão após condenação em segunda instância. Trata-se de interpretação imprescindível para a permanência do nosso contrato social democrático, fundado nas leis sempre voltadas para o bem comum, o que é incompatível com a impunidade dos criminosos.

Com Modesto Carvalhosa.

domingo, 20 de outubro de 2019

O SUPREMO SUSPENSE E O SEGREDO DE POLICHINELO — SEGUNDA PARTE



Erga omnes ou não, e a despeito do sentido em que o vento soprar, a decisão que o STF deve tomar nesta semana pode ter vida curta, a depender de quem virá a ocupar a vaga do decano da Corte, que se aposenta no ano que vem, e de Marco Aurélio, o relator das nefastas ADCs do PEN, da OAB e do PCdoB que motivaram a rediscussão da prisão após condenação em segunda instância pela quinta vez desde 2016, que pegará o boné em 2021 (já vai tarde; que Deus o leve, guarde e esqueça onde).

Para quem não se lembra, esse primo de Collor — e cuja filha foi nomeada desembargadora por Dilma, por indicação do ex-governador fluminense Sérgio Cabral — moveu mundos e fundos para pressionar Cármen Lúcia a pautar o julgamento das tais ADCs (a ministra resistiu, alegando que rediscutir o tema novamente seria apequenar o tribunal). Cármen deixou a presidência do STF em setembro do ano passado, mas Toffoli, que a sucedeu no posto, vinha empurrando a coisa com a barriga desde que assumiu o posto.

Em dezembro passado, no apagar das luzes do ano legislativo, Marco Aurélio concedeu uma liminar que abria as portas das celas de Lula e de outros 170 mil condenados em segunda instância que aguardam presos o julgamento de seus recursos as instâncias superiores. Toffoli suspendeu o desvario do colega, que, rancoroso, desde então perde a chance de alfinetá-lo. Na sessão da semana passada, disse o ministro dos tempos estranhos: “É inconcebível visão totalitária e autoritária no Supremo. Os integrantes ombreiam, apenas têm acima o colegiado. O presidente é coordenador e não superior hierárquico dos pares. Coordena, simplesmente coordena, os trabalhos do colegiado. Fora isso é desconhecer a ordem jurídica, a Constituição Federal, as leis e o regimento interno, enfraquecendo a instituição, afastando a legitimidade das decisões que profira. Tempos estranhos em que verificada até mesmo a autofagia".

Já que falamos em Collor, custa-me acreditar que um sujeito que se elegeu presidente empunhando a bandeira de "caçador de marajás" e que renunciou às vésperas do julgamento do impeachment (por suspeitas de corrupção) continua na vida pública como senador. Como se isso não bastasse, o autodeclarado "homem macho de colhão roxo" é alvo de 7 inquéritos no STF,  réu em pelo menos uma ação criminal e alvo da Operação Arremate da PF, que mira um esquema de lavagem de dinheiro em Maceió e Curitiba.

A única explicação que me ocorre para tamanho descalabro é a péssima qualidade do eleitorado tupiniquim, que parece se aprimorar a cada eleição. Basta lembrar que, na última, essa formidável confraria de desaculturados convocou para o embate final justamente os dois extremistas mais extremados do espectro político-partidário, obrigando a parcela da população minimamente capaz de raciocinar a apoiar o Capitão Caverna para impedir a volta do PT.

Observação: Pensando bem, de um povo que votou no rinoceronte Cacareco (em São Paulo, nas eleições para vereador de 1959) e no Macaco Tião (no Rio, para prefeito em 1988) e ainda vê no criminoso Lula a solução para os problemas do Brasil (que esse molusco asqueroso só se tornará quando nos fizer a gentileza de vestir o pijama de madeira e ir comer capim na chácara do vigário ou na ponte que o partiu), não se poderia mesmo esperar porra nenhuma!

Ainda que na lista de postulantes à presidência (falo da eleição passada) houvesse mais aberrações  cabo Daciolo, Vera Lúcia, Guilherme Boulos, Marina Silva, Eymael e outros fugitivos da feira de horrores (aí incluída a vice na chapa do bonifrate do presidiário de Curitiba) ― do que possíveis soluções, não custava nada experimentar algo novo, como João Amoedo, Henrique Meireles ou Álvaro Dias. Queira Deus que em 2022 tenhamos candidatos "menos ruins", que não nos deixem novamente entre a cruz (leia-se Bolsonaro) e a caldeirinha (leia-se o fantoche que Lula escalará para disputar o pleito). Embora faltem 3 anos, o "mito" dos ignorantes, que, dentre outras promessas de campanha ficaram na campanha, prometeu acabar com a reeleição, já é candidatíssimo a mais quatro anos de reinado. Faz-me lembrar de Dilma, que, de olho em 2014, deixou de governar o país (se é que algum dia governou alguma coisa) para, numa segunda gestão, terminar de destruir a economia tupiniquim.

Voltando ao ministro Marco Aurélio, sua trajetória é um exemplo lapidar de como o patrimonialismo não só atravessou incólume todas as tentativas de superá-lo, mas acentuou suas imperfeições e demoliu a reputação de seus agentes. Seu pai, Plínio Affonso de Farias Mello, é até hoje reverenciado no ambiente do sindicalismo patronal como uma espécie de benemérito — seu prestígio era tamanho que o general Figueiredo, último presidente do regime militar, manteve aberta uma vaga no TRT-RJ para que o filho Marco a assumisse quando completasse 35 anos. Foi também graças ao prestígio paterno que ele foi guindado ao TST, em Brasília, onde o primo Fernando Affonso Collor de Mello o encontraria mais adiante e cobriria com a suprema toga.

Desde junho deste ano, quando Verdevaldo despejou o primeiro caminhão de merda sobre Moro e a Lava-Jato, esse luminar do saber jurídico vem destilando seu veneno contra o atual ministro da Justiça — talvez por ciúmes ou despeito, já que jamais conseguiu em seus quase 30 anos no supremo uma mísera fração do protagonismo e aprovação popular que o ex-juiz federal conquistou à frente da 13ª Vara Federal do Paraná. Na verdade, Mello sempre teve predileção por ser voto vencido, e foi a encarnação do “espírito de porco” até Dilma nomear desembargadora sua filha Letícia, em mais uma demonstração de como o nepotismo se perpetua. A partir daí, o campeão das causas perdidas abraçou cruzadas que atendem aos interesses dos petistas e dos nababos da advocacia de Brasília — que, de olho no filão milionário que os corruptos representam, defendem incondicionalmente a mudança da jurisprudência que autoriza a prisão de condenados em segunda instância. O resto é conversa mole para boi dormir.

Observação: Para não repetir o que eu já disse sobre a atual composição do Supremo ser a pior de todos os tempos, sugiro a quem interessar possa reler este post e o seguinte. Mas volto a dizer que a solução não é fechar o tribunal, como defendem alguns extremistas (recomendo assistir ao clipe que eu inseri no final desta postagem).

É nas mãos de decisores desse quilate, comandados pela eminência parda que Augusto Nunes chama de Maritaca de Diamantino e presididos por ninguém menos que Dias Toffoli, cujo currículo é abrilhantado por duas reprovações em concursos para juiz de primeira instância e pelos bons serviços prestados a Lula e ao PT (como advogado do Sindicato dos Metalúrgicos de SBC, do partido e das campanhas do molusco, bem como consultor jurídico da CUT, ajudante de ordens do criminoso condenado José Dirceu e Advogado Geral da União), o eminente ministro não despiu o uniforme de militante quando vestiu a suprema toga em 2009, mais uma vez graças a Lula e com suas bençãos — mais uma demonstração cabal da falta de noção do criminoso de Garanhuns sobre a dimensão do cargo de ministro.

Sem currículo, sem conhecimento, sem luz própria e sem os laços com a rede protetora do partido o recém empossado ministro Antonio Dias Toffoli sem foi buscar apoio em Gilmar Mendes Ferreira, que é quem melhor encarna a figura do velho coronel político. Já consolidado no habitat, o ex-advogado de Lula passou a emular os piores hábitos do novo padrinho a arrogância incontida, a grosseria, a falta de limites, o uso da autoridade da forma mais arbitrária possível. O próprio Lula, certa feita, pegou-o pelo braço em um evento em Brasília e quis saber sobre a relação íntima entre ele e Gilmar — uma amizade outrora impensável. 

Medes, espertamente, viu em Toffoli um possível aliado e, aos poucos, foi ganhando sua simpatia — ao mesmo tempo em que lhe apresentava as gostosuras do poder, ajudava-o a ampliar sua rede de contatos e lhe mostrava como fazer para valorizar a caneta que lhe foi conferida pelo demiurgo de Garanhuns. Recentemente, depois que as mulheres de ambos entraram na mira de um grupo especial da Receita Federal que investigava possíveis fraudes tributárias em suas atividades profissionais, a amizade virou uma aliança estratégica e se somou aos interesses dos amigos dos dois ministros, um oriundo das hostes petistas e outro alinhado aos tucanos e emedebistas. E assim se abriu uma janela de oportunidade para transformar a agenda do Supremo em instrumento para enfraquecer a Lava-Jato.

Amanhã eu conto o resto.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2019

SOBRE O IMBRÓGLIO ENVOLVENDO FLÁVIO BOLSONARO E FABRÍCIO QUEIROZ


A corrupção desembarcou em terras tupiniquins antes mesmo que nossa caricatura de país ganhasse o nome que tem hoje, como comprova a carta de Pero Vaz de Caminha ao rei Dom Manuel. Na missiva, o escriba oficial da esquadra de Cabral — falo de Pedro Álvares, o suposto descobridor destas paragens, e não do ex-governador do Rio, condenado a 100 anos prisão — acrescentou às boas novas um pedido de clemência para seu genro degredado.

A exemplo do nepotismo, o pedágio também é uma forma de corrupção, mas tem presença garantida em boa parte dos gabinetes de parlamentares tupiniquins. Só na Assembleia Legislativa fluminense, ao menos 28 servidores tiveram movimentações atípicas em suas contas bancárias com o mesmo padrão das supostamente realizadas por Fabrício Queiroz entre 2016 e 2017.

Observaçãopedágio é uma prática mediante a qual os políticos engordam os próprios salários garfando parte da remuneração dos assessores. Ainda que o catecismo político o tenha na conta dos pecados veniais, isso não faz dele menos lícito nem moralmente aceitável.

Não há relatos de pedágio na esquadra de Cabral, mas não faltam suspeitas dessa ilicitude no gabinete do então deputado estadual Flávio Bolsonaro. O imbróglio veio à tona em dezembro, depois que o Estado revelou que um relatório do Coaf havia identificado diversas movimentações atípicas de R$ 1,2 milhão, entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017, na conta do ex-assessor, motorista e policial aposentado Fabrício Queiroz, que é amigo de velha data do clã Bolsonaro (e que foi exonerado no dia 15 de outubro do ano passado). Entre as “movimentações suspeitas”, havia também um depósito de R$ 24 mil em favor Michelle Bolsonaro.

Bolsonaro pai disse tratar-se do pagamento de parte de um empréstimo de R$ 40 mil que ele havia feito a Queiroz, e que, "se algo estiver errado, seja comigo, com meu filho, com o Queiroz, que paguemos a conta desse erro". Bolsonaro filho afirmou que caberia ao ex-assessor prestar os esclarecimentos, e que já tinha ouvido dele “uma explicação plausível”, que poderia ter encerrado o assunto se tivesse sido apresentada logo de início. Mas não foi. E quando há justificativa, os fatos falam; quando não há, as versões sussurram e as suspeitas prosperam. 

Cerca de uma semana depois da primeira reportagem sobre o caso, o MPRJ abriu 22 procedimentos de investigação criminal com base no relatório do Coaf, com Queiroz entre os investigados, e com isso, foram marcados os primeiros depoimentos. Em vez compartilhar com o MPRJ a tal explicação plausível, Queiroz, primeiro, afirmou nada saber sobre o assunto; depois, alegou motivos de saúde e falta de tempo para analisar as acusações, e faltou aos depoimentos marcados para 19 e 21 de dezembro. Entre uma coisa e outra, em entrevista ao SBT, explicou que estava tratando um câncer no intestino, que nunca foi laranja e que a movimentação em sua conta foi produto da compra e venda de carros. No final de dezembro, foi internado para a retirada do tumor. Três dias depois, um vídeo no qual ele aparece dançando no hospital viralizou nas redes sociais, e ele se mostrou revoltado com a circulação do vídeo. Foi operado e recebeu alta no último dia 8. No dia seguinte, disse que pagou a conta com recursos próprios, mas não revelou o valor. Disse também que esclareceria em breve as movimentações atípicas, mas não especificou quando isso ocorreria. E não compareceu ao depoimento marcado para o dia 10 de janeiro. 

Flávio Bolsonaro também faltou ao depoimento. Em nota, disse que não é investigado e que não teve acesso aos autos do procedimento aberto pelo MPRJ, mas prometeu marcar uma nova data para depor. Mais adiante, alegando que o MPRJ pediu informações ao Coaf que não têm relação com Queiroz — o que configuraria uma apuração sobre sua conduta —, o senador questionou a competência do MP e reivindicou foro privilegiado no STF. Em entrevista à Record, disse que não poderia ser investigado sem autorização do Supremo em razão da prerrogativa de foro a que tem direito como senador diplomado, que é o maior interessado em esclarecer tudo e que não quer privilégio nenhum, apenas ser “tratado dentro da lei e da Constituição”.

Na visão de diversos analistas — e até de alguns ministros do Supremo —, a Reclamação de Flávio foi “um tiro no pé”, pois poderá resultar na ampliação do escopo da investigação e envolver o próprio Presidente, o que não aconteceria se o imbróglio ficasse restrito à primeira instância. Na avaliação da ala militar do governo, o caso ganhou uma dimensão maior e mais preocupante depois que o Jornal Nacional revelou o relatório sobre os depósitos em dinheiro realizados na conta bancária do filho do Presidente. Antes, quem devia explicações era Queiroz; agora, seu ex-chefe também está em palpos de aranha. No Planalto, a estratégia é afastar Bolsonaro pai do caso e fritar Bolsonaro filho, lembrando que o pai não é investigado e que explicou satisfatoriamente os depósitos feitos na conta da primeira-dama.

Observação: Segundo o CoafFlávio Bolsonaro recebeu em sua conta bancária 48 depósitos em dinheiro considerados suspeitos. No total, foram R$ 96 mil, depositados em cinco dias. Em 9 de junho de 2017 foram 10 depósitos no intervalo de 5 minutos, entre 11h02 e 11h07. No dia 15 de junho, mais 5 depósitos, feitos em 2 minutos, das 16h58 às 17h. Em 27 de junho outros 10 depósitos, em 3 minutos, das 12h21 às 12h24. No seguinte mais 8 depósitos, em 4 minutos, entre 10h52 e 10h56. E no dia 13 de julho 15 depósitos, em 6 minutos.

O ministro Luiz Fux, responsável pelo plantão durante o recesso do Supremo, determinou em caráter liminar a suspensão do procedimento investigatório criminal até que o ministro Marco Aurélio, relator da Reclamação, decida em qual instância ela deverá tramitar. Mello já sinalizou que seguirá aplicando o entendimento de que o foro privilegiado para senadores e deputados vale apenas para fatos ocorridos durante o mandato e em decorrência dele: “Já na sexta-feira, pela manhã, assinarei a decisão — sexta, dia primeiro de fevereiro […]. O Supremo não pode variar, dando um no cravo outro na ferradura. Processo não tem capa, tem conteúdo. Tenho negado seguimento a reclamações assim, remetendo ao lixo.”

MPRJ nega ter havido quebra do sigilo, afirma que as investigações decorrentes de movimentações financeiras atípicas de agentes políticos e servidores podem se desdobrar em procedimentos cíveis pra apurar a prática de atos de improbidade administrativa e procedimentos criminais e reitera que Flávio Bolsonaro não é investigado. Mas acatou a decisão de Fux e suspendeu o procedimento, provocando uma avalanche de críticas nas redes sociais, tanto de detratores de Bolsonaro, como o PT, quanto de apoiadores, como o MBL.

Gleisi Hoffmann, presidente nacional da ORCRIM, afirmou que a suspensão é grave e que mostra “pesos e medidas” diferentes: “Para Lula, basta convicção, para os Bolsonaros, nem documento público é considerado”, postou a lunática no Twitter. Fernando Holiday, vereador em São Paulo pelo DEM e coordenador do MBL, afirmou que “quem não deve, não teme, ainda mais uma simples investigação”. O coordenador da Lava-Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol, também criticou a decisão de Fux:  "Com todo o respeito ao ministro, não há como concordar com a decisão, que contraria o precedente do próprio STF. Tratando-se de fato prévio ao mandato, não há foro privilegiado perante o Supremo. É de se esperar que o ministro Marco Aurélio reverta a liminar", postou Deltan em seu perfil no Twitter.

Resumo da ópera:

Esse imbróglio deveria ter sido esclarecido assim que o relatório do Coaf veio a público, mas para isso seria preciso que Queiroz tivesse realmente uma explicação plausível — ou que seu chefe assumisse o pedágio, desse a cara a tapa e arcasse com as consequências. Há entendimento generalizado — que poderia ou não ser confirmado nessa investigação — de que parlamentares, seja em que nível for, com raras e honrosas exceções, financiam suas campanhas e suas vidas pessoais garfando uma parte do salário de seus funcionários ou nomeando funcionários-fantasmas. Dizer que fez o que todo mundo faz não é desculpa, mas tratar fratura exposta com band-aid é ainda pior. O Presidente Jair Bolsonaro se elegeu com o bordão do combate à corrupção, e essa merdeira é tudo que a oposição precisava para cair de pau.

É louvável que até os bolsomínions critiquem a postura de Bolsonaro filho e a decisão do ministro Fux. Isso demonstra que apoiam as apurações porque querem saber a verdade. Fosse o PT, o discurso de vitimização já estaria a todo vapor. Aliás, os militontos já estão postando nas redes que, se o investigado fosse um político de esquerda, ele e seus assessores já teriam sido presos preventivamente o levados coercitivamente para depor. Particularmente, acho ridículo essa caterva usar Queiroz como “prova de corrupção” do atual governo e "não enxergar" provas contra Lula e os demais petralhas presos, classificar de golpe o impeachment que depôs Dilma, e por aí afora. O que me causa espécie, no entanto, é Flávio Bolsonaro insistir que é apenas testemunha no caso e mesmo assim pedir a suspensão da investigação contra si.

Além de afrontar a coerência, o pedido de Flávio desmente a alegação de que seria ele o maior interessado em esclarecer o episódio, desenha um alvo em sua própria testa e abre um flanco na atuação do clã — tanto é que nem o pai presidente, nem os irmãos políticos saíram em sua defesa. E tem mais: ao levar o caso para o STF, sua defesa propicia a inclusão do Planalto na investigação, ainda que a soma depositada na conta da primeira-dama tenha uma explicação plausível. E mesmo que assim não fosse, os fatos aconteceram antes de Jair Bolsonaro ser eleito e, portanto, não pode resultar em processo enquanto ele for Presidente. Mas investigações podem ser feitas.

Para encerrar, a cereja do bolo: De repente, toda a imprensa achou de tratar o pedágio no gabinete de um parlamentar como se fosse o maior escândalo desde Cabral (com o petrolão, sempre relativizado pela mídia, fresquinho na memória). E viva o povo brasileiro!

ATUALIZAÇÃO: 

Ontem à noite, em entrevista à TV Record, Flávio atribuiu o pagamento no valor de pouco mais de R$ 1 milhão à quitação, feita pela Caixa, de um apartamento que ele havia comprado na planta. A posterior venda do imóvel explicaria outras movimentações consideradas “suspeitas” pelo Coaf, mas os depósitos fracionados continuam sendo questionados pela mídia. Disse ainda que tinha a documentação comprobatória e que a entregaria à instância da Justiça que fosse determinada pelo STF. Logo depois, em entrevista à Rede TV, afirmou que ele e o pai estão sendo vítimas de perseguição, que estão tentando criminalizar o dinheiro que ganhava como empresário (segundo ele, mais que seu salário de deputado), que não lhe deram oportunidade de se explicar e que quebraram seu sigilo de forma ilegal. Sobre o pedágio (que ele chamou de “rachadinha”) em seu gabinete na Alerj, afirmou que, se tivesse conhecimento dessa prática, teria sido o primeiro a denunciar. 

quarta-feira, 26 de dezembro de 2018

AINDA SOBRE OS INIMIGOS DO POVO


José Antonio Dias Toffoli foi advogado do Sindicato dos Metalúrgicos de SBC, consultor jurídico da CUT, assessor jurídico do PT e do ex-ministro petralha José Dirceu. Atuou como advogado nas campanhas de Lula à presidência em 1998, 2002 e 2006 e como subchefe para assuntos jurídicos da Casa Civil da presidência da República. Em 2007, foi promovido pelo cumpanhêro Lula ao cargo de Advogado Geral da União, que exerceu até 2009, quando, mais uma vez graças a Lula, foi guindado ao Supremo na vaga aberta com a morte do ministro Menezes Direito. Abrilhantam seu invejável currículo duas reprovações em concursos para juiz de primeiro grau em São Paulo, sempre na primeira fase que testa conhecimentos gerais e noções básicas de Direito dos candidatos —, o que demonstra a cabal falta de noção de Lula sobre a dimensão do cargo de ministro do STF.

Sem currículo, sem conhecimento, sem luz própria, a carreira de Toffoli se limitava a serviços prestados ao PT. Uma vez no Supremo, sem os laços com a rede protetora do partido ou com os referenciais do padrinho, o ministro novato seguiu o caminho usual dos fracos: no melhor estilo República Velha, foi buscar apoio em Gilmar Mendes — que é quem melhor encarna a figura do velho coronel político —, e uma vez consolidado no habitat, passou a emular os piores hábitos do novo padrinho. Quando o Mensalão estourou, em 2005, Toffoli trabalhava na Casa Civil e respondia diretamente a José Dirceu, apontado como chefe do esquema, mas nem assim se deu por impedido de participar do julgamento do mensalão e votar pela absolvição de Dirceu, alegando que não havia provas suficientes contra o guerrilheiro de araque.

Concluído este breve resumo, passemos ao que interessa: Toffoli assumiu a presidência do Supremo com duas missões: reduzir os conflitos internos, que tanto desgastaram a imagem pública do tribunal, e tirar a Corte do centro do debate político, deixando para o Executivo e o Legislativo os papéis de protagonistas. Até agora, conseguiu avançar na primeira tarefa, mas fracassou na segunda por não conseguir convencer seus pares a privilegiar a segurança jurídica deixando que prevaleça a posição da maioria da Corte, ainda que esta contrarie o desejo individual de cada magistrado.

A atitude do ministro Marco Aurélio ilustra bem essa situação. Além de conceder uma estapafúrdia liminar que, não fosse pela pronta ação de Toffoli, poderia ter resultado na soltura de quase 170 mil presos, aí incluído o famigerado criminoso de Garanhuns, esse magistrado — promovido a ministro supremo pelo ex-presidente impichado Fernando Collor de Mello, de quem é primo — jogou outra batata quente nas mãos de Toffoli ao determinar que eleição para a presidência do Senado seja feita mediante voto aberto, embora o regimento interno preveja “escrutínio secreto". Eunício Oliveira, embora não tenha conseguido se reeleger e, portanto, perderá sua boquinha de senador na próxima legislatura, subiu nas tamancas, e agora caberá a Toffoli descascar mais esse abacaxi.

Observação: No mesmo dia em que mandou suspender a execução de pena de quem ainda não tem o processo com trânsito em julgado, Marco Aurélio concedeu habeas corpus ao empresário Renato Archilla, condenado por tentar matar a própria filha em 2001 (e isso a despeito de a decisão condenatória já ter transitado em julgado). Em março, quando o plenário do Supremo debatia o pedido de habeas corpus preventivo de Lula, ele foi o primeiro a comunicar que teria de se ausentar, chegando mesmo a exibir um cartão de embarque para o Rio de Janeiro (pelo visto, sua palavra não seria suficiente), onde discursaria no 15.º Colóquio da Academia Brasileira do Trabalho. Um compromisso inadiável, disse o magistrado. Questionado pela imprensa, sua insolência reclamou de estar sendo crucificado por ser um “cumpridor de compromissos”.

É lamentável que ministros se valham do início do recesso para tomar decisões individuais em assuntos controvertidos, que deveriam ser levados ao escrutínio do plenário da Corte. Essa maracutaia jurídica — sem entrar no mérito dos interesses que se escondem por trás de cada liminar solitária concedida — visa tornar fato consumado veredictos no mínimo polêmicos, salvo em recursos impetrados no plantão da Corte, que podem ser decididos pelo seu presidente. Marco Aurélio, talvez se espelhando nos 15 minutos de fama obtidos pelo obscuro desembargador cumpanhêro Rogério Favreto, do TRF-4, resolveu reencenar o espetáculo circense de 8 de julho, planejando cada passo de maneira que a merda batesse no ventilador somente depois do início do recesso. Depois de deixar seu despacho pronto para a publicação e de instruir seus assessores a propósito, o ministro participou da sessão que encerrou o ano judiciário e do almoço de confraternização dos magistrados, sem dar um pio sobre o pesadelo kafkiano que estava articulando. Caso prosperasse, sua perrice seria um duro golpe não só na Lava-Jato, mas também na esperança que a sociedade passou a ter de ver o Brasil se tornar uma República de fato, em que a lei vale mesmo para todos.

Embora tenha todo o direito de se alinhar com a ala garantista da Corte e de discordar da decisão da ex-presidente Cármen Lúcia — que se recusou a rediscutir a prisão em segunda instância a pretexto de não apequenar o Supremo —, o senhor birrento agiu muito mal, sobretudo porque tinha pleno conhecimento de que Toffoli já havia pautado o julgamento da ADC do PCdoB para abril do ano que vem. Tudo visto e examinado, fareja-se a léguas o cheiro pútrido da má-fé e do revanchismo que balizou a atitude de Marco Aurélio nesse episódio (perguntado por que escolheu aquele momento para assinar a nefanda liminar, o ministro respondeu ao jornalista: “isso lá é pergunta que se faça?”).

Passando agora ao cumprimento antecipado da pena (após decisão condenatória proferida ou confirmada por um juízo colegiado), temos que o assunto é controverso e suscita discussões apaixonadas, sobretudo num país onde a dicotomia maniqueísta campeia solta. Há bons argumentos de parte a parte, mas contra fatos não há argumentos. Aliás, essa discussão somente ganhou vulto porque afeta diretamente o bandido de Garanhuns, mas isso é outra conversa. O fato é que aqueles que defendem o “princípio constitucional da presunção de inocência até o trânsito em julgado da sentença condenatória” não se lembram (ou fingem malandramente se esquecer) de que a prisão de condenados em segunda instância foi regra de 1941 até 1973, quando então a ditadura militar fez o Congresso aprovar uma lei — para beneficiar o delegado e notório torturador Sérgio Paranhos Fleury — que garantia a réus primários e com bons antecedentes o direito de recorrer em liberdade, mas perdeu a eficácia depois que a Constituição de 1988 restabeleceu o correto princípio de 1941.

Para não encompridar muito este texto (afinal, esta semana segue em marcha-lenta), o resto fica para as próximas postagens. Inté.

domingo, 1 de julho de 2018

MARCO AURÉLIO — MISTO DE HIDRA DE LERNA COM O DEUS JANO



Não faz muito tempo, o ministro Luís Roberto Barroso, num memorável bate-boca com Gilmar Mendes, definiu o colega como mistura do mal com o atraso e pitadas de psicopatia. Antes disso, numa conceituação igualmente lapidar, o jornalista J.R. Guzzo rotulara o laxante togado de fotografia ambulante do subdesenvolvimento brasileiro, mais um na multidão de altas autoridades que constroem todos os dias o fracasso do país.

Antes de prosseguir, vale abrir um parêntese: no apagar das luzes do primeiro semestre e logo antes do STF entrar em recesso, Gilmar Mendes rejeitou o pedido do PT e do PCdoB que visava suspender as prisões de condenados em segunda instância e apontava omissão da presidente da Corte, por não pautar para julgamento uma ação sobre o tema. O ministro, que passou a ser contrário à prisão após condenação em 2ª instância, afirmou em sua decisão que não houve omissão por parte de Cármen Lúcia. Segundo ele, por mais relevante que possa ser a questão debatida, a Presidência da Corte tem poder de organizar a ordem dos processos a serem julgados, que, no caso concreto, o tempo de pendência da ação anterior é exíguo, e que não se trata de questão ainda não discutida, a merecer uma solução primeira e urgente do tribunal.

Mendes lembrou que o plenário já discutiu várias vezes a possibilidade de prisão em segunda instância e reconheceu que o entendimento atual é no sentido de que não há violação à presunção de inocência (em outubro de 2016, por 6 votos a 5, o pleno negou os pedidos de medida cautelar para barrar a possibilidade de execução provisória de pena, como a prisão, após condenação em segunda instância).

Marco Aurélio já liberou para julgamento o mérito de outras ações sobre o tema, mas Cármen Lúcia — a quem cabe definir a pauta das sessões plenárias — resiste a levar o assunto novamente a julgamento, mas é bom lembrar que, em setembro, Toffoli assumirá a presidência da Corte e a atual presidente ocupará o lugar dele na 2ª turma. Fecho o parêntese e passo ao ministro Marco Aurélio.

Na não menos brilhante definição do jornalista, poeta e escritor José Nêumanne Pinto, o ministro Marco Aurélio Mello é um misto de Hidra de Lerna com corpo de dragão, hálito venenoso e nove cabeças de serpente capazes de se regenerar — com o deus romano Jano — retratado com duas faces, uma olhando para a frente e a outra, para trás. Em entrevista a uma emissora de rádio e televisão portuguesa, sua excelência — que foi indicada para o Supremo pelo primo e dublê de ex-presidente impichado, senador e réu Fernando Collor de Mello (que, como Lula, é ficha-suja, mas que, também como Lula, aspira disputar a presidência da Banânia) — afirmou que a prisão do ex-presidente petralha é ilegal, mas que ele é inelegível.

Aqui cabe abrir outro parêntese. Em meio a uma crise política, econômica e ética sem precedentes na nossa história, nosso povo continua mergulhado na ignorância, e os políticos, descolados da realidade. Não espanta, portanto, que 60% dos eleitores não sabem em quem votar — ou tencionam anular o voto, votar em branco ou simplesmente não comparecer às urnas, o que pode produzir um efeito contrário ao desejado por favorecer, ainda que indiretamente, o candidato mais bem colocado. Esse quadro nada alvissareiro, que não se restringe à eleição presidencial, mas também à escolha de governadores, senadores, deputados federais e estaduais, deriva em grande medida da dicotomia fomentada pelo PT sob o comando do demiurgo de Garanhuns — que posa de preso político quando na verdade não passa de um político preso. A se confiar nos institutos de pesquisa, o sevandija vermelho é líder em intenções de voto, o que se deve, também em grande medida, à desinformação da parcela menos favorecida e mais ignorante do eleitorado, que se lembra com saudades do primeiro governo Lula, mas se esquece do Mensalão, da eleição de Dilma, do Petrolão e de todas as mazelas que permearam a história recente deste pobre país.  

Segundo José Nêumanne, no mítico Raso da Catarina do sertão de místicos e cangaceiros, Marco Aurélio surge como um misto do beato Antônio Conselheiro e do cabra Corisco, com o cajado da Constituição numa das mãos e o martelo de juiz outra. Na semana encerrada com seu aparente golpe no cravo e outro na ferradura, seus aliados na 2ª Turma cuspiram nas inúmeras evidências e “coincidências” de depoimentos de delatores premiados para negar, por cinco a zero, punição ao casal Gleisi Hoffmann e Paulo Bernardo. As batatas da vitória foram devoradas no festim (com toda a razão) de seguidores do deus-pai da Petelândia, que atribuíram à notícia o condão mágico de abrir a cela que confina o profeta e anula a profecia.

A decisão de Fachin — mais do que evidente, inevitável — de transferir para o plenário o julgamento da tentativa da defesa de Lula de cancelar a condenação de seu cliente, decidida em primeira e segunda instâncias (por unanimidade), verteu fel no chope da vitória num jogo que nunca foi, nem tinha como ser, preliminar. O relator da Lava-Jato não poderia deixar de fazê-lo, dando sequência à decisão tomada pela vice-presidente do TRF-4. Da mesma forma, o presidente da 2ª TurmaRicardo Lewandowski, que ninguém em sã consciência acusaria de anti lulista — nada poderia fazer senão desmarcar a sessão na qual o pedido em questão seria votado.

Nessa guerra — em que campeiam adiamentos, recursos e chicanas infindáveis —, a defesa de Lula “estranhou” que a desembargadora do TRF-4 tenha tomado sua decisão às vésperas do julgamento já agendado no STF. Ou seja, à falta de fatos e, agora, até de argumentos, restou a Cristiano Zanin exigir do Judiciário que submeta o calendário à conveniência de seu cliente. Fecho o parêntese.

Foi no fragor dessa batalha que o ministro Marco Aurélio transportou para além-mar sua guerrilha particular, ao lado dos companheiros Lewandowski, Gilmar, Celso e Toffoli, que soltam presidiários de colarinho-branco aos magotes, contrariando a jurisprudência que autoriza a prisão de condenados em segunda instância. Ao fazê-lo, o douto membro da colenda Corte a desafia, sobrepondo com arrogância às decisões majoritárias do tribunal as próprias convicções ou seus interesses pessoais, sejam lá quais forem. Destarte, ele confirma o veredicto pouco lisonjeiro (sobre a mais alta instância judiciária) manifestado pelo especialista Joaquim Falcão, da FGV, de que não há um STF uno, mas um conjunto desarmonioso de 11 cabeças — daí a conjunção da Hidra de Lerna com o deus romano Jano.

Processo, para mim, não tem capa. Processo, para mim, tem unicamente conteúdo. Eu não concebo, tendo em conta minha formação jurídica, tendo em conta a minha experiência judicante, eu não concebo essa espécie de execução”, declarou Mello.

A frase dá definitivamente eco ao discurso dos arautos do profeta de Vila Euclides, segundo os quais este é vítima de uma perseguição contumaz de elites exploradoras que controlam a polícia, o Ministério Público e as duas instâncias iniciais do Judiciário. Ao fazê-lo, o ministro adere à campanha difamatória do PT, que não tem alternativa ao presidiário mais popular do País para disputar a eleição presidencial, no pressuposto de que toda a Justiça se resume ao plenário fracionado da corte real, entendida a palavra como de reis, e não da realidade.

E sem perder o hábito de confundir só para contrariar, Marco Aurélio repetiu o Conselheiro Acácio, ao reafirmar o óbvio ululante da inelegibilidade de Lula.

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quarta-feira, 25 de abril de 2018

MAIS UMA MARACUTAIA PARA TIRAR LULA DA CADEIA


PT, os sacerdotes dessa seita do inferno e um sem-número de militontos e apoiadores têm feito das tripas coração para tentar tirar o bandido da cadeia. Não bastassem a vigília no entorno da sede da PF em Curitiba e os parlamentares que insistem em visitar o condenado (a despeito de apenas seus familiares e advogado estarem autorizados a tanto), uma tal Comissão de Direitos Humanos do Senado não sossegou enquanto não vistoriou as instalações da carceragem. Participaram dessa tal “comissão”, dentre outros notórios seguidores de Lula, os senadores petralhas Gleisi Hoffmann, Lindbergh Farias, Humberto Costa e Paulo Paim, além da pecedebista Vanessa Grazziotin e dos peessedebistas João Capiberibe e Lídice da Mata. Deu para entender ou preciso desenhar?   

Observação: Se a preocupação do grupo era com o isolamento do deus-pai da Petelândia, bastaria remanejá-lo para o Complexo Médico-Penal de Pinhais. Lá ele teria a companhia de velhos comparsas, como André Vargas, Luiz Argolo, Gim Argello, João Vaccari, Eduardo Cunha e outros da mesma laia.

Mas não é só. Antes de ingressar com os recursos especial (ao STJ) e extraordinário (ao STF), protocolados no TRF-4 na última segunda-feira, a defesa alegou que a prisão de Lula ocorreu antes de o Regional julgar os tais “embargos dos embargos de declaração” ― chicana classificada pelo juiz Moro como “patologia protelatória”, pois visa claramente emperrar o andamento processual. A propósito, relembro que embargos de declaração destinam-se a esclarecer pontos omissos ou obscuros da decisão embargada, não tendo o condão de alterar a condenação ou a pena. Assim, está mais na cara do que nariz que o propósito dos advogados não era outro senão adiar a prisão do petralha por mais alguns dias (até porque é para isso que eles são muito bem pagos).

No último dia 19, a 8.ª Turma do TRF-4 rejeitou o pedido de Cristiano Zanin, que queria adiar o julgamento até que o desembargador-relator João Pedro Gebran Neto retornasse das férias e negou os tais “embargos dos embargos”. A questão é que no dia 7, quando Lula foi preso, esse recurso ainda não havia sido julgado, e é nisso que os advogados do mulsco estão se apegando, além de sustentarem que os recursos na esfera da segunda instância só terminam depois que o TRF-4 decidir sobre a admissibilidade dos recursos especial e extraordinário.    

Observação: A defesa de Lula alega que, ao decidir em 2016 que é possível executar a pena antecipada (antes de se esgotarem os recursos nas cortes superiores), o Supremo não definiu que a segunda instância termina com o julgamento dos primeiros embargos de declaração. Em sua óptica, ela se esgota, no caso de Lula, depois que o TRF4 encaminhar (ou não) os recursos especial e extraordinário ao STJ e STF, respectivamente. Ou seja, o segundo grau do Judiciário só acabaria quando fosse analisado um eventual agravo contra uma também eventual não admissão desses recursos pelo TRF-4.

O ministro Edson Fachin, relator dos processos da Lava-Jato no Supremo, enviou o caso ao plenário virtual da segunda turma, que é composta pelo próprio Fachin e por Gilmar Mendes, Toffoli, Lewandowski e Celso de Mello (com exceção do relator, todos os demais são “garantistas”, ou seja, contrários à prisão após a condenação em segunda instância). Apesar de os embargos já terem sido votados e rejeitados, nada impede que os ministros (especialmente esses ministros) entendam que houve uma arbitrariedade e anulem a ordem de prisão do TRF-4. Se isso acontecer, será um escândalo vergonhoso tão vergonhoso quanto a ADC do PCdoB, que foi impetrada exclusivamente para tentar devolver Lula às ruas, às caravanas, aos comícios, enfim, todo aquele circo que a gente conhece bem, onde os palhaços somos nós.

Mas a coisa não para por aí. Hoje à tarde, o plenário do STF deve julgar dois temas delicados para o futuro institucional do país. Talvez não haja tempo para debatê-los na mesma sessão, ou outra circunstância qualquer impossibilite o julgamento de um deles, mas é sempre bom ficar alerta, adverte o jornalista Merval Pereira em sua coluna no Globo.

A primeira questão é o fim do foro privilegiado, que já conta com oito votos favoráveis e foi liberado para a pauta depois de um pedido de vista do ministro Dias Toffoli. A segunda são as ADCs apresentadas pelo PEN e pelo PCdoB. O ministro-relator Marco Aurélio pretendia levar à mesa a ação do PEN, mas talvez não o faça porque o PCdoB deixou claro que seu propósito é tirar Lula da cadeia ― seja porque o partido é um satélite do PT, seja porque o patrono da ação, o advogado Celso Antonio Bandeira de Mello, há tempos se empenha em denunciar o que ele classifica de “arbitrariedades do juiz Sérgio Moro e dos procuradores de Curitiba”.

Mesmo que tema vá a votação, é possível que não se confirme a nova maioria ― que é apontada na ação como sua justificativa. Ainda que Gilmar Mendes mude seu voto (em 2016, ele foi um dos principais defensores do cumprimento da pena após decisão em segunda instância, mas agora acha que os condenados devem ser presos somente após a decisão do STJ), nada garante que os demais ministros apoiem a nova ação, seja porque ela se destina claramente a favorecer Lula, seja pela necessidade de se manter a jurisprudência atual por mais tempo, dando segurança jurídica às decisões do STF, como defende a ministra Rosa Weber.

Quanto ao fim do foro privilegiado, 8 ministros já haviam votado a favor da proposta do ministro Luis Roberto Barroso ― segundo a qual o benefício só deve se aplicar a casos ocorridos durante o mandato e em decorrência dele ― quando Dias Toffoli pediu vista do processo. No entanto, há um conflito de poderes envolvendo essa questão, já que uma PEC mais abrangente que a proposta de Barroso tramitava no Congresso, mas foi paralisada pela intervenção federal na segurança pública do Rio, que deve se estender até dezembro. Enfim, não se descarta a possibilidade de outro ministro peça vista do processo, dando ao Congresso a oportunidade de legislar sobre o tema no ano que vem. 

Seja lá como for, não podemos perder de vista que, se a aprovação do fim do foro privilegiado é um avanço institucional, combinada com uma reversão na jurisprudência sobre a prisão na segunda instância ela pode se tornar um retrocesso. Isso porque maioria dos políticos que está sendo processada no STF veria seus casos baixarem à primeira instância, e a partir daí teriam à disposição toda a vasta gama de recursos, apelos, embargos, agravos e outras chicanas. Bons criminalistas poderia empurrar a tramitação processual com a barriga durante décadas, até que as ações chegassem novamente ao STF, num círculo vicioso em que quase ninguém iria para a cadeia, talvez não pela reforma da sentença em uma das várias instâncias da Justiça, mas certamente pela prescrição das penas.

Para finalizar, ouçam até o final:



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domingo, 22 de abril de 2018

DE VOLTA ÀS ADCs



Depois que o PEN desistiu da ação declaratória de constitucionalidade ― para não dar a impressão de que o objetivo era tirar Lula da cadeia ―, o PCdoB veio com a sua, capitaneada pelo advogado Celso Bandeira de Mello, ligado a movimentos de juristas que condenam os métodos do juiz Sérgio Moro e dos procuradores da Lava-Jato.

Cabe à presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, pautar o julgamento, embora nada impeça o relator, ministro Marco Aurélio Mello, de levar pedido “em mesa”, ou seja, forçar sua discussão, independentemente da vontade da presidente. Mello não suscitou expressamente essa possibilidade, e Cármen Lúcia, para quem seria prematuro rever a posição da Corte neste momento, sobretudo porque essa jurisprudência foi firmada há menos de 2 anos, vem “empurrando a coisa com a barriga” (é difícil imaginar alguém como ela, que pesa pouco mais de 40 quilos, empurrando alguma coisa com a barriga, mas enfim...).   

Chegam a ser irritantes a insistência do ministro vira-casaca Gilmar Mendes em alardear que “mudou de ideia” ― em 2016, o ministro “vira-casaca” integrou a maioria que firmou a jurisprudência favorável à antecipação do cumprimento da pena ― e a obstinação de Marco Aurélio em forçar a rediscussão de um tema tão delicado num momento tão inoportuno. É óbvio que essa questão só voltou à tona devido à prisão de Lula e ao fato de uma ala do STF (a dos ministros “pseudo garantistas”) estar fazendo o possível e impossível para encontrar uma maneira de livrar esse criminoso da cadeia.

Rosa Weber, ao proferir seu voto no julgamento do HC de Lula, deu uma aula de como o Estado de Direito necessita de “estabilidade”, não podendo se sujeitar a “variações frívolas”. Se isto aqui fosse um país sério, a defesa da ministra ao princípio da colegialidade seria não só aplaudida, como também seguida por todos os ministros da Corte. Só que alguns têm egos gigantescos, outros, interesses ocultos e inconfessáveis...

Resumo da ópera: O veto à prisão em segunda instância é um desserviço, uma ameaça ao cidadão de bem. 

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